Os 3 desafios do próximo presidente da República, por Neuriberg Dias

Foram aprovadas mais leis de iniciativa dos congressistas do que aquelas enviadas pelo Poder Executivo, houve mais vetos presidenciais derrubados

do Diap – Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar

Os 3 desafios do próximo presidente da República

Independentemente de quem seja eleito para o Palácio do Planalto a partir de 2023, sendo reeleito o atual presidente Jair Bolsonaro ou eleito novo presidente para o cargo, terá pela frente 3 imensos desafios para construir correlação de forças no Poder Legislativo, com objetivo de garantir apoio ao programa de governo apresentado durante a campanha eleitoral de 2022.

por Neuriberg Dias

primeiro desafio colocado será a adaptação do próximo chefe de governo ao novo desenho institucional do Poder Legislativo, que tem reduzido, ao logo do tempo, por meio de modificações no processo legislativo e interpretações constitucionais, as influências do Poder Executivo nas Casas Legislativas — Câmara dos Deputados e Senado Federal.

Em artigo “Mito do poder da Presidência da República do Brasil”1, do professor colaborador da UnB, Alexandre Ferraz, ele afirma que na Constituinte, para diminuir impasses e ingovernabilidade e referendar o processo de redemocratização, foram dados “superpoderes” ao Executivo, entre esses, o de iniciativa legal e exclusiva, no caso da proposta orçamentária, edição e reedição de medidas provisórias, poder de veto total e parcial, e de pedir urgência para matérias de interesse do Planalto.

Antevendo ou não a perda de poder nas eleições de 2002, o certo é que no fim do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, foi aprovada a Emenda à Constituição 32/01, que retirou do presidente da República a possibilidade de reeditar medidas provisórias.

Mas os dispositivos de trancamento de pauta (após 45 dias a MP teria que ser apreciada pelo plenário sem que outras proposições pudessem ser apreciadas) permaneceu, o que travou, em certa medida, as votações de proposições no plenário da Câmara e do Senado.

Quando Luiz Inácio Lula da Silva sentou-se na cadeira de presidente, essa já era menor que a de seu antecessor, despida de poderes “imperiais” garantidos pela possibilidade de reedição ilimitada das medidas provisórias, que logo depois, o então presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (MDB-SP), refez a interpretação sobre o trancamento de pauta das medidas provisórias, após 45 dias de tramitação como determina a Constituição.

O que trouxe mais liberdade para atuação e aprovação de outras propostas em tramitação no Congresso com algumas ressalvas, como por exemplo, que as proposições liberadas para votação não tratassem de temas que pudessem ser objeto de medidas provisórias, ficando automaticamente autorizadas as votações de PLP (projetos de lei complementar), PEC (propostas de emenda à Constituição) e PL (projetos de lei) que tratassem questões penais.

No governo Dilma houve a aprovação da EC (Emenda à Constituição) 76/13, do voto aberto para cassações de mandatos e vetos presidenciais, que dificultou o desempenho do Executivo na apreciação de vetos ou até mesmo de projetos de lei, ou de lei complementar, promovendo antecipadamente negociação antes de proceder com o veto. Isso, para evitar que os parlamentares anulassem a decisão do presidente.

Ainda no mandato de Dilma, o Supremo Tribunal Federal decidiu em 2015 sobre a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 5127, pela proibição de inclusão de matérias estranhas em medidas provisórias.

Também foi no segundo governo petista, a aprovação da EC 86, que tornou impositivas as emendas individuais dos parlamentares. O que dificultou o contingenciamento pelo Poder Executivo.

Houve ainda mudanças para obrigar a instalação das comissões mistas, regras de alternância e rodízio entre as Casas na definição de presidência e relatorias nas comissões mistas que apreciam as medidas provisórias, cronologia para apreciação de vetos presidenciais que antes praticamente ficavam na gaveta e execução de emendas impositivas e de relator no orçamento, o que acarretou dificuldade maior na condução de agenda negociada pelo Executivo.

No governo Bolsonaro, que tomou posse em 2019, não foi diferente em relação aos antecessores. Ao ser aprovada as emendas à Constituição 100 e 105, que criou, respectivamente, o orçamento impositivo para as emendas de bancadas e ainda permitiu o repasse direto de emendas individuais para estados e municípios, retirou do Executivo, o que era um ativo na articulação política com os parlamentares.

Todas essas mudanças retratam bem como foi a produção legislativa nos últimos anos. Foram aprovadas mais leis de iniciativa dos congressistas do que aquelas enviadas pelo Poder Executivo, houve mais vetos presidenciais derrubados e as medidas provisórias, ou perderam a validade, ou foram amplamente modificadas ou até mesmo rejeitadas pelo Legislativo, o que revela menor cooperação política com o Executivo.

segundo desafio situa-se em torno da disputa do Executivo com o Legislativo sobre o Orçamento. As emendas à Constituição 95 e 109, que criaram, respectivamente, o teto de gastos corrigido pelo IPCA e gatilhos para controlar as contas, sempre que as despesas obrigatórias e receita de a União atingirem o limite de 95%; combinado com o orçamento impositivo das emendas individuais, de bancadas e de relator, inovação recente no Legislativo, colocam qualquer presidente num impasse e dificuldade para ter cooperação política para garantir a implementação de programa de governo.

Os dados do Siga Brasil, do Senado Federal, revelam melhor esse volume em termos nominais das emendas parlamentares indicadas pelo Congresso Nacional para o orçamento, que pode chegar ao valor de R$ 48,8 bilhões em 2022. Esses recursos costumam ser indicados por deputados e senadores para obras e projetos nos próprios redutos eleitorais.

Ou seja, comparado aos anos anteriores foram: R$ 9,1 bilhões em 2016; R$ 15,2 bilhões em 2017; R$ 11,9 bilhões em 2018; R$ 13,7 bilhões em 2019; R$ 46 bilhões em 2020, as cifras atuais representam aumento histórico no valor utilizado no Orçamento federal que deixa de ser destinado para políticas públicas universais como a ampliação do Bolsa Família, dentre outros programas sociais.

terceiro desafio é a fragmentação partidária. Legendas que foram criadas para acomodações políticas e para dar sustentação a grupos que hora estavam no poder, se transformaram em empecilhos nas relações políticas, pois ganharam autonomia financeira e eleitoral, e passaram a ter protagonismo no cenário político e sobre a agenda decisória.

As reformas políticas e eleitorais aprovadas pelo Congresso para reduzir a quantidade de partidos, com o fim das coligações nas eleições proporcionais e criação da cláusula de desempenho, não terão efeito de imediato nestas eleições que exigirá do próximo presidente da República garantir a eleição de maioria no Parlamento, em especial, uma bancada para o partido pelo qual for candidato para construir maioria, a fim de garantir o andamento da agenda de governo em campanha.

Os desafios estão colocados.

O próximo chefe de Estado e líder do Poder Executivo terá que reunir vários predicados políticos para garantir apoio e confiança da sociedade para desenhar um programa de governo que possa contemplar os variados segmentos sociais e, com o apoio do Parlamento, colocá-lo em prática.

Neuriberg Dias Analista político, assessor técnico licenciado do Diap e sócio-diretor da Contatos Assessoria Política.

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NOTA

1 https://www.nexojornal.com.br/ensaio/2018/O-mito-do-poder-da-Presid%C3%AAncia-da-Rep%C3%BAblica-no-Brasil

Este texto não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

Redação

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