Para Catarina, minha primeira sobrinha, por Mariana Nassif

Para Catarina, minha primeira sobrinha, por Mariana Nassif

Oi, Nina. 

Escrevo porque é um dos exercícios que mais me atraem. Colocar emoções em palavras deixa o registro daquilo que pulsa no momento e, então, temos a chance de reviver – sim, também essa experimentação pode ser feita num fechar de olhos prolongados para nos recordamos do sabor do afeto, como quando te encontrei pela primeira vez.

Antes mesmo de você chegar, já sabia que você viria. Não sabia que seria Catarina, não havia ilusão alguma sobre ser um menino ou uma menina: esperávamos pelo amor em forma de bebê e, então, você apareceu do jeito que tem que ser. Querida demais, desejada, amada e, não sei se é assim que sua mãe vai te contar, anunciada num jogo de baralho cigano, que nisso sua tia é bem boa e falou com esse jeito ácido de comunicar pra que sua mãe te aguardasse para muito em breve, mesmo que ela estivesse ansiosa e não quisesse falar de datas. Foi neste mesmo dia, diga-se, que ela me ligou insistentemente pedindo que voltasse pra casa da sua avó e eu, preocupada que sou, corri de volta. Chegoua Azira, esse cão-irmã que você tem, com umpar de sapatinhos na boca e eu demorei alguns segundos para entender – achei que sua mãe havia comprado sapatos de chuva para o cachorro e, então, quando me dei conta, suspirei e viajei para um lugar extremamente bom – o lugar de tia. 

Sou mãe há muito tempo, Nina, dessa moça maravilhosa que é sua prima, e me realizo de muitas maneiras nesta seara – a Clara, além de ser uma pessoa deliciosa de conviver, é dessas almas inquietas, que desafiam a gente a ser melhor. Não há como ter sido mais mágico nosso encontro e, então, me sinto também feliz em compartilhar com você essa troca. Daquela noite em diante, senti o gosto de um tipo de afeto diferente, ainda responsável, sim, mas com uma leveza tão grande e uma satisfação madura, entende? Entende, eu acho, e senti isso no instante em que te dei um banho de pia e praticamente tomei junto, por perceber que você se acalmava em contato com meu corpo e, então, não há dúvida ou molhadeira que supere este momento – me senti firme e te vi segura, e aquele é um dos momentos para o qual viajo mentalmente quando a saudade aperta.

Saudade, Nina, é uma constante por aqui. Há quase dois anos, escolhi mudar pra uma cidade linda chamada Ubatuba. Vim encontrar uma força invisível que, se tudo der certo, apresentarei pra você com o mesmo brilho nos olhos que mostrei pra sua prima. Este é um universo sagrado e desejo muito compartilhar com vocês essa magia. Bom, mas tem as saudades. Morar longe é aalgo bastante complicado especialmente nos momentos especiais, e desde que você chegou nossa família se reorganizou para construir mais histórias assim. Acompanho pelo telefone os encontros e, sabe, Nina, meu peito só não aperta mais porque a gente sempre dá um jeito de participar, seja mandando uma foto ou fazendo uma chamada de vídeo, mas é que de repente o afago das mãos faz mais falta do que isso e, embora o impulso seja o de subir no primeiro ônibus, ainda não posso me dar esse luxo. Trabalho é uma coisa de adulto e eu estou me comprometendo com muita força nesse sentido – um dia você vai vir até em casa e vou te mostrar que delícia pode ser executar tarefas com as quais a gente se compromete e ganha dinheiro, mesmo quando precisa abrir mão de algumas delícias da vida – como estar com todos vocês aos domingos, por exemplo. 

É que sabe, Nina, se eu ainda estivesse em São Paulo, muito provavelmente eu não seria eu e, imagina, talvez não conseguisse sequer sentir tua presença desta forma amável, doce e feliz – sim, é possível, porque quando a gente não está feliz com a gente, nem mesmo o mais forte amor consegue alterar este estado que não sejam nossos próprios movimentos. Daí chega o Natal e talvez eu não vá e, então, é algo que dói também mas Nina, ah, não tem nada mais gostoso do que ser a gente mesmo e então respiro e sigo. 

Sua mãe foi meu primeiro amor, Ninoca, e então um dia a gente vai sentar e eu vou te contar sobre estes ninhos que a gente cria nas nuvens que é pra distância nunca nos afetar. Construí alguns desses com a Clara e, acho eu, vem funcionando bem. 

Então, meu bem, te peço que comece a se familiarizar com duas coisas: a primeira e mais importante é que você tem uma titia que mora na encosta de frente pro mar, numa floresta incrível na montanha, e que aqui será também seu refúgio – é só pedir pra Clara que, tenho certeza, ela te traz a hora que for. A segunda e não menos importante é a que vez ou outra o telefone vai tocar e do outro lado da linha vou estar eu, talvez com a voz embargada, só pra dizer que te amo – e ter certeza de que você sente isso, mesmo com tanto céu separando a gente. 

Um beijo, meu docinho, e um afago desses de criar laço, vínculo e amor. 

Titia Nana. 

Mariana A. Nassif

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