Por que a abordagem da Suécia contra coronavírus é mais flexível

Entenda a lógica por trás da estratégia de combate ao coronavírus adotada pelo país - e por que ela não poderia ser replicada em outros locais

Do site Scadinavian Way

Para combater o coronavírus, a Suécia agora proíbe reuniões com mais de 50 pessoas. A medida entrou em vigor neste domingo (29/3), e quem desrespeitá-la vai ter que encarar seis meses de prisão. Por um lado, a decisão endurece o enfrentamento da covid-19 no país; por outro, ela evidencia o contraste entre o que tem sido feito pelos suecos e as ações de boa parte do mundo ocidental, incluídos aí seus vizinhos nórdicos (até a mudança, a Suécia ainda permitia reuniões de até 500 pessoas). Na comunidade internacional, a abordagem sueca já ganhou notoriedade por ser bem menos restritiva que a média do que vem sendo feito em vários países pelo mundo. O que explica essa estratégia? E ela tem dado certo?

Até o momento, seguem funcionando academias, lojas de roupas, escolas para estudantes de menos de 16 anos e até algumas estações de esqui. Também é possível ir a bares e restaurantes; para empresas e seus funcionários, há a recomendação – mas não a ordem – de que seja adotado o trabalho remoto em atividades em que isso é possível.

Isso não significa que o governo da Suécia está subestimando o coronavírus ou chamando a covid-19 de “gripezinha”. O primeiro-ministro Stefan Löfven enfatizou a gravidade do quadro em um pronunciamento de TV feito no último dia 22/3. “Existem alguns momentos críticos na vida em que você deve fazer sacrifícios, não apenas por seu próprio bem, mas também por aqueles que o rodeiam, por seus semelhantes e por nosso país”, discursou o premiê. “Essa hora é agora.”

Confiança nas instituições – e um no outro
Em diversos momentos, o pronunciamento de Löfven apontou um dos aspectos que estão por trás da estratégia da Suécia de combate ao coronavírus: o trabalho em conjunto e a confiança mútua. Esse aspecto faz parte da cultura sueca. Há confiança de que cada um fará sua parte em um esforço conjunto para combater uma doença de escala global.

Esse fator até pode soar vago, subjetivo, mas ele pode ser atestado de forma concreta. Em Estocolmo, a capital do país, por exemplo, o número de passageiros no sistema de transporte público caiu 50% na última semana – e isso, frise-se, a partir de uma recomendação – mas não uma ordem – feita pelas autoridades suecas.

“Em grande medida, a Suécia optou por recomendar medidas voluntárias porque é assim que estamos acostumados a trabalhar”, disse à CNBC Anders Tegnell, epidemiologista-chefe da Agência de Saúde Pública. “A longa tradição que temos (com essa abordagem) nos diz que ela funciona muito bem.”

Agências independentes
No entanto, os índices de confiança não explicam toda a estratégia adotada pelo país. Afinal, os indicadores suecos nesse quesito podem ser altos, mas isso também é verdade para os demais países nórdicos, que não foram por esse caminho. Dinamarca e Noruega, por exemplo, adotaram quarentena obrigatória e proíbem reuniões com mais de dez pessoas.

Há, assim, uma diferença no modelo de funcionamento das instituições do país, segundo alguns analistas. Na Suécia, as agências públicas têm um histórico de atuação que independe das decisões políticas. Dito de outra forma, seja qual for o governo, ele segue as determinações técnicas da agência que atua em cada área.

No caso da pandemia da covid-19, a Agência de Saúde Pública é que encabeça as ações e orienta a forma de combate ao coronavírus. O governo define as linhas gerais da atuação das agências públicas – ao estabelecer suas metas e orçamentos, por exemplo -, mas elas têm garantia legal sobre o escopo de seu trabalho. É a chamada “regra ministerial”, segundo a qual as agências atuam com a garantia de que não haverá intromissão dos políticos em suas atividades cotidianas.

“Estamos vendo uma tradição em funcionamento”, disse à Foreign Policy Lars Trägårdh, historiador e que se dedica a pesquisas sobre o modelo nórdico de Estado de bem-estar. “A Agência de Saúde Pública foi designada como a autoridade encarregada da crise do coronavírus. O primeiro-ministro e seu governo ouvem e seguem suas orientações.” Cada ente faz o que a Constituição determina, e isso realimenta a confiança da população nas instituições.

Ouvidos à ciência
E há, é claro, informações científicas para embasar as decisões. Em artigo para o site de divulgação científica The Conversation, Paul W. Franks e Peter M. Nilsson, professores de epidemiologia da Universidade de Lund, mostram, por exemplo, que as simulações feitas pelas autoridades suecas preveem um número de internações para cada 100 mil habitantes bem menor que os de países como Noruega, Dinamarca e Reino Unido.

Até esta terça-feira (31/3), a Suécia tinha registrado 180 mortes causadas pelo novo coronavírus. O número é o mais alto entre os países nórdicos, mas, proporcionalmente, é similar ao registrado na Dinamarca, que tem pouco mais da metade da população sueca e registrou 90 mortes. Na região, a Noruega lidera em número de casos, com 4.599 (no país, 36 pessoas morreram por causa da doença). Suécia e Dinamarca somam 4.435 e 2.994 casos, respectivamente.

Na abordagem sueca, nenhuma decisão é definitiva. O país também já discute, por exemplo, o endurecimento das restrições sociais em Estocolmo, mas não em todo o país. Além disso, o governo anunciou nesta terça-feira a determinação de desenvolver uma estratégia nacional para aumentar o número de testes para covid-19. A informação foi dada pela vice-primeira-ministra, Isabella Lovin.

Muito palpite, pouca evidência
Alguns especialistas (e também não-especialistas) têm criticado a abordagem “branda” adotada pela Suécia. Paul Franks e Peter Nilsson também mencionam essa controvérsia em seu artigo – e como, na crise atual, estão sobrando palpiteiros.

“As pessoas estão escolhendo lados. Algumas argumentam que críticas públicas às autoridades servem apenas para minar a confiança do público em um momento em que isso é tão necessário. Outras, por sua vez, estão convencidas de que a Suécia está criando um desastre de proporções bíblicas e de que a direção precisa mudar”, escrevem eles. “A verdade é que nenhuma dessas opiniões é baseada em evidências concretas, colhidas diretamente de uma pandemia global. Ninguém sabe ao certo o que está por vir.”

 

Redação

10 Comentários

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    1. E isto não é o pior desta matéria estúpida, datada de 31/03/2020, quinze dias atrás e digna de um idiota como Osmar Terra ou de um genocida como Bolsonaro. Hoje, o DESASTRE desta abordagem sueca, pode ser mostrada assim [1]:

      — SUÉCIA ——– 2894 casos por 1 milhão da população — 361 mortes por 1 milhão da população
      — NORUEGA —— 1515 casos por 1 milhão da população — 43 mortes por 1 milhão da população
      — DINAMARCA — 1864 casos por 1 milhão da população — 93 mortes por 1 milhão da população
      – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – –
      [1] Vide https://www.worldometers.info/coronavirus/

  1. Esses dados estão totalmente desatualizados ! Atualmente a Suécia é o oitavo país com maior taxa de mortos em relação à população ! Conseguem ser piores do que a gente ! Estão dando um vexame total !

  2. Respeitosamente, artigo ruim e com dados defasados em 45 dias. O que no meio de uma pandemia é uma eternidade.
    Em 23/04, anotei os dados e compartilhei com amigos: Mortes/1 milhão de habitantes Suécia/200, Dinamarca/68, Noruega/35 e Finlândia/31 => já era um desastre para a Suécia.
    Dados de hj: Suécia/361, Dinamarca/93, Noruega/43 e Finlândia/53.
    Nos 4 países aumentaram as mortes por milhão de habitantes.
    Mas, a proporção piorou. Em 23/04 morriam 2,94 mais pessoas na Suécia que na Dinamarca (que tinha o pior resultado). Agora morrem 3,88 mais pessoas. Se comparar com a Noruega o número de mortes na Suécia é 8,4 vezes maior.
    A Suécia é um desastre. Se o Governo Sueco agisse como seus vizinhos teria evitado no mínimo 2.500 mortes. A Suécia é maior prova que o isolamento social salva vidas.

    1. Gostaria de saber quem propôs esta besteira de artigo, que já outros comentaristas mostraram que nos dias de hoje é uma mentira.
      A Suécia fez o que sempre fez nos últimos 100 anos, perseguir os mais fracos, foi um dos primeiros países do mundo a implantar a perseguição e esterilização em massa das minorias (63.000 pessoas em 30 anos para uma população média de 6.000.000 de habitantes).
      Retiraram terras de seus “índios” os Lapões que utilizavam para criar renas e no lugar introduziram mineração.
      Agora foi a vez dos velhos, praticamente os velhos mais pobres, os que viviam nos abrigos 1/3 morreram, mas o fascista diretor do sistema de saúde disse simplesmente que foi um descuido. Se já em 1920 os políticos “social” democratas propunham esterilizações de pessoas que eles julgavam não ser de sangue puro, matar velhos para não perder dinheiro não me espanta em nada.

  3. Conforme os dados de hoje do site Worldometer, que trabalha com dados oficiais, a Suécia tem 2894 casos por milhão de habitantes e 361 mortos por milhão de habitantes.

    Transpondo estes números para os 209 milhões de habitantes do Brasil, teríamos 604 mil casos e 75 mil mortos, arredondando para menos.

    Oficialmente ainda não chegamos neste ponto mas há quem ambicione que, pelo menos nisso, igualemos índices suecos. Ou quem sabe, talvez, que os ultrapassemos.

    Worldometer – https://www.worldometers.info/coronavirus/#countries

  4. A mortalidade (mortes/hab) é um índice que só faz sentido efetivo no FIM da pandemia ou epidemia.
    Por isso não faz muito sentido fazer comparações deste índice durante a pan/epidemia.

  5. Até esta terça-feira (31/3), a Suécia tinha registrado 180 mortes causadas pelo novo coronavírus….
    Mas estamos em maio, já se passaram 45 dias. Como evoluiu desde então?

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