Cesar Locatelli
César Locatelli, economista, doutorando em Economia Política Mundial pela UFABC. Jornalista independente desde 2015.
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Por que o resultado do PIB de 2018 é horrível, por César Locatelli

Estamos colhendo o resultado das políticas econômicas de “austeridade” pós-golpe

Por que o resultado do PIB de 2018 é horrível

por César Locatelli

A divulgação do Produto Interno Bruto do ano de 2018, pelo IBGE nesta quinta, 28/02, não nos inspira a relaxar e curtir, despreocupadamente, os feriados de Carnaval. Para os adversários políticos do Partido dos Trabalhadores e de Dilma Rousseff ainda estamos sob efeito dos “erros” cometidos em seu mandato. É preciso lembrar, entretanto, que Henrique Meirelles assumiu o Ministério da Fazenda em maio de 2016 e que todas as medidas tomadas, nesses quase três anos, foram contracionistas com cortes de gastos e investimentos e cortes de direitos que levam desânimo a todos os agentes econômicos sejam consumidores, sejam investidores, sejam disseminadores de expectativas, como os jornais. Vamos ver as manchetes pouco otimistas produzidas pela mídia empresarial do país após a divulgação do PIB de 2018.

Até a mídia que defende cortes de gastos públicos e “austeridade” está desanimada

A Folha de S. Paulo traz em sua manchete principal: “Crescimento de 1,1% no PIB amplia desafio de Bolsonaro”. No subtítulo temos que “Recuperação desacelera no fim de 2018, e expectativa para este ano não é animadora”.

“PIB de 1,1% revela país estagnado”, mostra a capa do jornal O Globo. “Em 2018, pelo segundo ano consecutivo, a economia brasileira cresceu apenas 1,1% e está no mesmo patamar de seis anos atrás”, complementa.

“O índice é o mesmo de 2017 e frustrou as projeções do início do ano passado que apontavam para 2,8%”, informa O Estado de S. Paulo após a manchete “PIB cresce apenas 1,1% e analistas reveem projeções”.

A capa do jornal Valor Econômico estampa “Retomada é a mais lenta da história”. Segundo o jornal, o Brasil cresceu 4,82% ao ano na média do quinquênio 2004-2008, cresceu 3,26% ao ano na média dos anos 2009-2013 e decresceu o,83% ao ano em média entre 2014-2018. “No atual quinquênio, o Brasil já teve meia década perdida”, afirma a matéria de capa do Valor.

O produto por habitante

O Produto Interno Bruto – PIB – refere-se ao valor agregado, medido a preços de mercado, de todos os bens e serviços finais produzidos dentro do território econômico de um país, independentemente da nacionalidade das unidades produtoras, nos ensina o professor Paulo Sandroni em seu Dicionário de Economia do século XXI.

Pois bem, agregando-se todos os bens e serviços, produzidos no Brasil em 2018, o IBGE chegou ao valor de R$ 6,8 trilhões. Parece um valor enorme, porém percebemos que o número não tão grande assim quando dividimos esse valor pelo número de habitantes do país e chegamos a R$ 32.747, que os economistas chamam de PIB per capita. Valor inferior ao de 2010 que ficou em R$ 33.504.

Essa relação entre o total da produção e a população nos dá uma ideia do nível de desenvolvimento em que o país se encontra, pois revela o bem-estar (ou mal-estar) médio das pessoas, com todos os cuidados que temos que ter com as médias.

A recuperação, pós-recessão, mais lenta de nossa história

O professor e ex-ministro da Fazenda, Nélson Barbosa, publicou, em sua conta no Twitter, a comparação da recuperação do PIB per capita em quatro episódios de recessão no Brasil. Diz ele: “Sobre PIB, atualizei os dados per capita. Vivemos a mais lenta recuperação após uma grande recessão (queda do PIB per capita por 3 anos seguidos). Após a ‘Grande Depressão’ (anos 1930), a ‘Crise da Dívida’ (anos 1980) e a ‘Crise Inflacionária’ (anos 1990), a recuperação foi mais rápida”.

Ele fixou o PIB per capita em 100 para o primeiro ano antes de começar a recessão, ou seja, usou o valor do PIB por habitante equivalente a 100 para os anos de 1928, 1980, 1989 e 2013, que foram os anos que antecederam as quatro recessões a serem comparadas. Aplicou, em seguida as taxas de crescimento ou queda do PIB pelos cinco anos seguintes. O resultado é o gráfico abaixo, em que percebemos a forte recuperação após a recessão do período 1928-1933 (linha azul), as recuperações um pouco mais lentas nas recessões de 1989-1994 (linha amarela) e 1980-1985 (linha verde) e, por fim, a mais lenta de todas do período 2013-2018.

Mais um fracasso neoliberal

Crítico da política de cortes adotada por Temer e Bolsonaro, professor Márcio Pochmann publicou em sua conta no Twitter:

“De acordo com o IBGE, a equipe econômica ‘dos sonhos do mercado financeiro’ de Temer entregou o país, em 2018, com o PIB menor que recebeu, em 2016. Mais um fracasso neoliberal que o governo Bolsonaro pretende aprofundar no Brasil.

Quando a realidade divulgada pelo IBGE é desprezada na propaganda governamental frente ao receituário neoliberal que segue promovendo a contração fiscal, impedindo a economia nacional de voltar a crescer e sustentando a massificação do desemprego, pobreza e desigualdade.

Se aprovada, a meta da reforma da previdência social do governo Bolsonaro é a retirada de R$ 1 trilhão para os próximos 10 anos, cujo efeito contracionista na economia se apresenta imediato, desestimulando a produção e a geração de emprego.”

A taxa de investimento revela o equívoco da política de Temer e Meirelles

Recorremos novamente ao professor Sandroni que nos explica que “em sentido estrito, em economia, investimento significa a aplicação de capital em meios que levam ao crescimento da capacidade produtiva (instalações, máquinas, meios de transporte), ou seja, em bens de capital”. Vejamos como tem se comportado, segundo o IBGE, a taxa de investimento que, de certa forma, reflete o ânimo ou o desânimo dos empresários e as decisões do governo por impulsionar ou frear o ritmo da economia.

A linha amarela representa a taxa de investimento, ano a ano, como porcentagem do PIB. Notamos que as taxas mais baixas do século ocorreram nesses últimos três anos em que a tônica da política econômica foi de cortes de gastos e investimentos públicos.

Observemos que a média das taxas de investimento do primeiro governo de Dilma Rousseff (2011-2014) foi de 20,52% do PIB e dos três anos de gestão de Temer (2016-2018) foi de 15,43%. Uma queda de 25% na comparação das médias de um governo (PT) que tinha como política incentivar o crescimento e o emprego contra outro (PMDB/PSDB) que tinha por foco promover um ajuste fiscal que não ocorreu e levou o país à estagnação e desemprego que estamos a sofrer.

Cesar Locatelli

César Locatelli, economista, doutorando em Economia Política Mundial pela UFABC. Jornalista independente desde 2015.

1 Comentário

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  1. O quadro é pior ainda do que os números sugerem. Se considerarmos o carry over de 0,4%, o real “dinamismo” de 2018 reduz-se a 0,7% (ver detalhes no meu comentário em https://jornalggn.com.br/analise/pib-dois-pontos-sobre-a-qualidade-da-recuperacao/).

    Desde o Levy, o Brasil só adotou medidas recessivas baseado em quimeras neoliberais. O esboço de recuperação em 2017 decorreu de dois fatores: setor externo e mecanismos endógenos de recuperação que acompanham os ciclos (p. ex. reposição de parte da depreciação acumulada na recessão). Tudo indica que caminhamos para a estagnação (embora neste ano ainda haverá um carry over positivo, que tende a mascarar a real situação).

    O que realmente surpreende é que só agora comece a cair a ficha. Mais: este governo consegue o inimaginável, ser pior do que o do Temer. Durante pouco tempo, alguns de nós pensamos que o Guedes teria alguma competência, mesmo nos moldes neoliberais. Não parece ser o caso. E o grupo familiar/evangélico/olavista é composto de aloprados com enorme capacidade de causar dano à já combalida economia.

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