Reservas para investimento implicam mudança radical no BC, por J. Carlos de Assis

Reservas para investimento implicam mudança radical no BC

por J. Carlos de Assis

É extremamente importante para a retomada da economia brasileira a mobilização de parte das reservas internacionais em investimentos, recentemente admitida pela Presidenta Dilma. Entretanto, não se trata de uma medida simples. Se as reservas forem usadas no exterior para algum tipo de despesa corrente ou de investimento não haveria efeito monetário interno, e o efeito sobre a retomada interna da economia seria quase irrelevante.  Mas se as reservas forem convertidas em reais para cobrir investimentos internos será necessário compatibilizar esse impacto com a política monetária do Banco Central.

De fato, se vender as reservas em dólares para fazer investimentos internos em reais, o primeiro efeito monetário interno será expansivo: haverá mais reais na economia vinculados aos investimentos relacionados com a venda dos dólares. Se o Banco Central se acomodar a essa expansão monetária teremos um estímulo monetário ao crescimento. Contudo, um efeito paralelo da expansão monetária será a tendência à queda da taxa de juros. O Banco Central poderá decidir contrair internamente a moeda para segurar a taxa de juros no patamar que ele entende, de uma forma equívoca, como antiinflacionária.

A consequência dessa política do Banco Central seria uma maior oferta monetária para o investimento financiado em dólar e uma contração das disponibilidades financeiras para o resto da economia. O tiro da utilização das reservas para favorecer o crescimento sairia pela culatra. Expandiríamos a economia de um lado e a contrairíamos do outro, em sentido oposto ao que o FED fez e continua fazendo nos EUA. Isso não quer dizer que não devemos usar as reservas. Devemos sim. Mas a premissa é exigir do Banco Central, uma vez tendo sido decidida a mobilização das reservas para o crescimento, uma política globalmente expansiva e que implicasse a redução da taxa de juros no over.  

Não seria fácil. Estamos ainda sob o jugo do fetiche do Banco Central independente amarrado num modelo de metas de combate à inflação que é uma fraude. Enquanto o FED norte-americano e outros bacos centrais, como o japonês, tem três metas definidas – controle da inflação, financiamento da economia em nível suficiente ao crescimento e promoção do máximo emprego -, ao Banco Central brasileiro se conferiu, no Governo FHC, o objetivo único de combater a inflação. Em nome desse objetivo, ele cometem as maiores barbaridades contra o emprego. E com resultados absurdamente pífios, como estamos vendo.

Outra iniciativa hoje controversa para se promover a retomada da economia, esta do presidente Lula, é o estímulo ao crédito. O ex-Presidente evoca algo que aconteceu em circunstâncias absolutamente diferentes em seu Governo, e que deu certo. Atualmente, a expansão do crédito não resolve porque as famílias estão ultra-endividadas. Mas Lula, aparentemente, compreendeu um dos cânones da  economia keynesiana segundo o qual, numa recessão, e diante de um alto endividamento, não há alternativa para a recuperação senão o aumento do déficit e da dívida pública.

Se tiver entendido isso, Lula estará provando que não se converteu ao “liberalismo” ou neoliberalismo, conforme disse na entrevista com os blogueiros. Na verdade, a única coisa que um líder político oriundo do sindicalismo não pode ser é “liberal” econômico. O primeiro ponto na pauta liberal é a destruição dos sindicatos sob o argumento da defesa da plena liberdade do trabalho. Baseada nisso Margareth Thatcher destruiu os sindicados do carvão na Inglaterra e Reagan destruiu o sindicato dos controladores de voo nos Estados Unidos. Mais do que isso, um liberal econômico – não falo do político – não aceitaria muito bem o Bolsa Família.

J. Carlos de Assis – Economista, doutor pela Coppe/UFRJ, autor de “Os sete mandamentos do jornalismo investigativo”, Ed.  Textonovo, SP, 2015

Redação

8 Comentários

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  1. Eu só queria entender…

    Eles aumentam o juro para reduzir o volume de dinheiro no mercado, capturando quase a metade do orçamento para os rentistas, restringindo o crédito disponível, em nome do combate à inflação. Segundo o manual, mais dinheiro disponível=mais inflação. Então aumentam o juro e diminuem o dinheiro no mercado.

    Aí eles propõe usar o FGTS para aumentar o crédito, diminuir o compulsório e acionar os bancos públicos com o mesmo objetivo e agora usar as reservas cambiais para fazer investimentos, já que o governo não tem mais como investir, dado que está com quase a metade do orçamento comprometido com juros e rolagem da dívida. E, se querem aumentar o dinheiro disponível (crédito), não estão jogando contra o combate à inflação?

    Se querem dinheiro para investimento, não seria melhor baixar a Selic, o que daria uma folga ao caixa do governo, disponibilizando grana para os tais investimentos ao invés de utilizar reservas cambiais?

    Como dizia o macaco daquele antigo programa televisivo: naõ precisa explicar. Eu só queria entender.

     

     

    1. O PT perdeu para os rentistas…

      Também não entendo esta política do “formar gelo fora da geladeira”.

      O calcanhar de aquiles da economia brasileira é a taxa Selic. E ofertar crédito a juros elevados, não obrigado.

      As famílias estão endividadas, mas estão pagando os financimentos, os juros para o crédito era pra vir reduzindo…para atrair novos clientes…

      1. Deve ser pra subir ainda mais os juros

        Vão ofertar crédito a juros elevados. Se não houver demanda, tudo bem, os bancos já estão garantidos pelos juros da Selic nas operações de tesouraria. Se houver demanda, eles vão querer subir os juros ainda mais para o crédito. Sabe como é, demanda aquecida, mais procura do que oferta, então sobe o preço (a taxa). É um jogo de ganha-ganha pra eles. Só quem perde é o povo, que vê o dinheiro dos impostos ir para o bolso da elite ao invés de financiar o bem estar da sociedade.

        1. O PT perdeu para os rentistas…

          Por isto esta frase.

          O Governo Federal possui os dois maiores bancos do país (BB e CAixa), se o objetivo fosse abaixar os juros… 

  2. caro professor,
    uma pena que

    caro professor,

    uma pena que a sua última coluna tenha sido retirada do blog (por que?), foi essencial para entender a crise atual.

  3. Uma duvida básica
     
    Se

    Uma duvida básica

     

    Se aumentarmos o volume em real na economia interna, esta fato, por si so, é inflacionário????

     

  4. As crises de liquidez no mercado internacional são cíclicas

    Logo não se deve utilizar as Reservas Cambiais para outros fins, com investimento público por exemplo, além disso investimento tem  prazo definido, e as crises de liquidez não, podem ocorrer a qualquer momento, e sempre quando menos se espera.

    Em novembro de 2015 as operações compromissadas realizadas pelo Banco Central estavam em R$ 924,6 bilhões,  em dezembro de 2011 estavam em R$ 341 bilhões, e dezembro de 2013 estavam em R$ 528 bilhões, o que demonstra que estamos diante de um gigantesco empoçamento da liquidez  em reais no Brasil.

    Com a venda de parte dos dólares das Reservas Cambiais haveria também uma diminuição da liquidez em real no sistema financeiro, diminuindo a necessidade das operações compromissadas realizadas pelo Banco Central e que são remuneradas pela taxa Selic, eventualmente o Banco Central teria que realizar operações de redesconto para manter a liquidez em reais no sistema financeiro.

    Além disso, se necessário basta reduzir o nível dos depósitos compulsório.

    Há espaço para o aumento gradual do  crédito, via redução dos juros e alongamento dos prazos de pagamento, de modo com uma prestação menor do que é hoje seria possível comprar mais bens e serviços.

    Um aumento gradual do consumo, principalmente de bens duráveis e semi-duráveis, algo como 3% a 5% nos próximos trimestres, o que já provocaria um aumento nas horas trabalhadas, ninguém está pensando em aumento espetacular das vendas no momento,

    Hoje o fundamental é estabilizar a taxa de câmbio, o de reduziria significativamente a inflação os próximos meses.

    As Reservas tem que ser utilizadas para manter uma relativa estabilidade cambial, mesmo em situação de crise de liquidez internacional, comprando na baixa para impedir uma queda acentuada do dólar, e vendendo na alta para evitar altas exageradas da taxa de câmbio, é um movimento de idas e vindas.

    Com uma estabilidade relativa da taxa de câmbio, haverá uma redução gradual no nível da inflação, até que o preços internos se ajustem ao atual patamar da taxa de câmbio.

    Diante do aumento do juros americanos, será necessário vender parte das Reservas Cambiais, acompanhada de uma redução das operações compromissadas realizadas pelo BC, e da redução gradual do compulsório bancário,  para evitar uma falta de liquidez em reais no mercado financeiro.

    O melhor seria o Copom antecipar este processo, e iniciar rapidamente um processo de redução de juros da Selic, reduzindo a taxa de retorno do investimentos, o que pode acelerar o processo de substituição das importações pela produção nacional, já que com a redução dos juros da Selic os investimentos na produção de bens e serviços podem se tornar maior do que o retorno dos investimentos em aplicações de renda fixa.

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