Sobre as sementes torpes, insanas e vergonhosas plantadas “lá atrás”, por Eduardo Ramos

Sobre as sementes torpes, insanas e vergonhosas plantadas “lá atrás”, e os frutos colhidos por uma sociedade incivilizada…

por Eduardo Ramos

Quando vemos eventos catastróficos em uma nação, um tempo de horror, desses que marcam a História e nos fazem perguntar: “Como puderam chegar a esse ponto tão baixo e vulgar…?”, é comum perdermos a visão de que, em sociedades humanas, TUDO É SEMPRE UM PROCESSO, sempre! Nada é “por acaso”, “acidental”, ou mesmo “inesperado!”… – Numa metáfora pobre mas que ilustra um pouco essa verdade, lembro dos acidentes aéreos narrados nos documentários de TV que trazem uma máxima consagrada: “Acidentes aéreos normalmente ocorrem por UMA SÉRIE DE FATORES ESPARSOS que, somados, provocam a tragédia!” – O mesmo se pode dizer dos “grandes desastres sociais e políticos”, as guerras, a fome, a miséria, as ditaduras sangrentas, a opressão, a corrupção das instituições, o desespero que algumas nações vivenciam além do suportável, em tempos/espaços específicos de se viver… NUNCA É “POR ACASO”, NUNCA É “ACIDENTAL”.

Processos político-sociais perversos, desumanos, totalitários, causadores de desgraças e misérias físicas e psíquicas em parcelas imensas das sociedades humanas, são sempre trilhados em um longo e penoso caminho, e deles participamos tantas vezes, mais como espectadores espantados, catatônicos, sofridos, sem nem saber direito como lutar contra todo o mal que estamos vendo, pior, muitas vezes, fazemos parte da minoria lúcida que enxerga a boca do abismo, do pântano fétido em que estão atirando nosso país, sem que possamos fazer – salvo uma hipotética e suicida luta armada, a que não nos atrevemos… – praticamente nada para impedir a “onda de selvagerias e eventos loucos que parece engolfar toda a nação”…

Nesses processos, normalmente, primeiro vêm os vícios, as torpezas, as quebras dos direitos, as sementes do ódio! Um a um, o processo NÃO É VISTO NA SUA TOTALIDADE, no início, somos tomados de surpresa enquanto os erros mais crassos, mais hediondos vão sendo cometidos em graus de sordidez cada vez maior. Quando daí nasce o horror, os bestiais ovos da serpente fascista geram seus filhos, esses mesmos agentes sociais que provocaram todo o processo, não sabem como detê-lo! É exatamente o que ocorre no Brasil de hoje.

Lembremo-nos brevemente das sucessões de artimanhas, de sementes malignas plantadas, que nos trouxeram a Bolsonaro e ao fato vergonhoso de nos tornarmos, EM APENAS UMA DÉCADA, de nação mais celebrada do mundo, aos atuais párias internacionais, motivo de espanto e desprezo entre as nações civilizadas.

1 – 2003 a 2005 – A crise do mensalão, começa o show midiático da transformação do PT em “partido de exceção”, o “mal em si”, a “quadrilha de ladrões”, os “totalitaristas que vieram para aparelhar o Estado e se perpetuarem no poder”, e toda uma gama de IDEOLOGIAS VICIADAS, artificialmente exacerbadas, para aos poucos inocularem na sociedade esse DESPREZO, esse “NOJO DE LULA E DO PT” – lá na frente, transformados em ÓDIO.

2 – Nessa mesma época, começam não só as denúncias vazias, mas nasce o chamado “jornalismo do ódio”, protagonizado com “maestria”, primeiramente pela Vaja, onde Reinaldo Azevedo ataca de modo brutal e selvagem, sem quaisquer limites éticos ou civilizatórios, a todos os que se atrevam a ir contra a revista Veja ou qualquer uma de suas ideias ou “reportagens”. Começa aí o mais torpe período de nossa grande mídia.

3 – Há um breve período de “sossego”, quando no segundo mandato a popularidade de Lula, literalmente EXPLODE em todo o planeta. Nossas oligarquias “marcam alguns pontos”, como no evento do “grampo sem áudio”, em que Gilmar Mendes e Demóstenes Torres encenam a farsa de que Lula teria grampeado os telefones dos ministros do STF. Cai Paulo Lacerda, talvez o mais gabaritado e digno diretor-geral da Polícia Federal de todos os tempos, mas apesar desse e de outros achaques, Lula se torna tão celebrado internacionalmente, e tão popular internamente, que de modo inteligente, oligarquias e grande mídia recuam em seus ataques, chegam mesmo a “parecer imparciais” em algumas oportunidades. Certamente, se o Brasil conheceu um auge em todos os sentidos, foi no período de 2007 a 2010.

4 – Dilma já nasce “marcada”, “batizada”, “o poste do Lula!”. Todo o seu trabalho magnífico à frente do Gabinete Civil nos governos Lula é simplesmente ignorado. Começa a perseguição implacável, o deboche sistemático, um massacre diário de denúncias vazias de corrupções na maioria das vezes infundadas, todas as sementes de DESPREZO E NOJO AO PT, finalmente, são regadas e colocadas ao sol, todos os dias, a sociedade se alimentando do veneno do ódio aos poucos.

5 – 2012 e 2013, dois eventos que, de certo modo, MARCAM O INÍCIO DO FIM DO PT e de sua possibilidade de governar o país em um ambiente político social normal, saudável, democrático! O julgamento do mensalão no STF, a Globo colocando literalmente “a faca no pescoço dos ministros do STF”, e Joaquim Barbosa em sua fúria punitivista e perversa, orgulhoso de uma celebridade que jamais sonhara em vida, é alçado pela mesma Globo a herói nacional. O PT é massacrado, e ganha definitivamente no imaginário pupular a pecha de “partido-quadrilha”. O trabalho, nesse aspecto, está praticamente concluído.

Junto a esse julgamento farsesco-midiático, temos as passeatas e manifestações de 2013, onde a grande mídia utilizou de modo magistral descontentamentos seculares de nossa sociedade para criar o fato de que “as manifestações eram eminentemente contra o governo Dilma e o PT”…. É quando a versão é criada, e logo depois “vira realidade”, a sociedade “compra aquela ideia” e a toma para si.

6 – O ano de 2014 entrará para a História do Brasil como “O ANO EM QUE O ÓDIO FLORESCEU, RACHANDO A SOCIEDADE BRASILEIRA EM DUAS: OS QUE ODIAVAM LULA E O PT E OS QUE ENXERGAVAM TODA A MANIPULAÇÃO PERVERSA POR TRÁS DESSE ÓDIO!”

Jamais houve um ambiente social tão doentio, paroxístico, tenso, um dualismo tosco, raso, grosseiro, uma eleição entre “SATANÁS”, ou “O MAL ABSOLUTO” (Dilma e o PT…) contra “O BEM, O JUSTO, O CORRETO”… – representados na ocasião, por ninguém menos do que Aécio Neves (sic!…). É também o ano em que surge a figura, talvez, mais nefasta, psicótica, fria e calculista de nossa História recente: Sérgio Moro!

7 – A República de Curitiba, a operação Lava Jato, o Golpe contra Dilma, o julgamento e a prisão de Lula (2015 a 2018) – A presença desses quatro eventos num período de tempo tão curto, no mesmo país, é tragicamente revelador da ausência de caráter, perspectiva histórica, seriedade e dignidade de muitos dos homens e mulheres que ocupam altos cargos públicos e lideranças civis (indústria, comércio, mídia…) no Brasil. O que assistimos de 2015 a 2018 provavelmente é inédito na História mundial na intensidade e grau de absurdo, de “coisas nonsense em série” produzidas pelas instituições que, em última análise, são as forças políticas atuantes em uma sociedade oligárquica como a nossa. Ninguém escapou do pântano fétido que virou o Brasil nesse período: Mídia, FIESP, MPF, Ministérios Públicos estaduais, Sérgio Moro, Rodrigo Janot, procuradores da Lava Jato, desembargadores da Quarta Vara Federal, ministros do TSE, Polícia federal, juízes federais e estaduais, e os procuradores-celebridades da Lava Jato: todos, igualmente, se uniram numa campanha doentia de perseguição, massacre e destruição de Lula e sua família, da presidente Dilma e do PT enquanto força política viável, todos se permitiram os maiores descalabros, as mais imorais covardias e omissões, as quebras mais óbvias de Leis e da Constituição Federal, onde “os amigos” eram protegidos, e os inimigos passados na máquina de moer carne do Estado. Daí derivaram os governos Temer e por fim, numa eleição REPLETA DE CRIMES COMETIDOS POR BOLSONARO E SEUS CÚMPLICES, a eleição mais vergonhosa de todos os tempos. Nossas classes médias e elites sociais foram e são cúmplices e agentes sociais diretos desse horror, dessas incivilidades, e a eles, igualmente, devemos a já citada condição de párias internacionais, repito, em uma década, de país festejado como “a grande novidade mundial”, pelas inovações simples e eficazes trazidas principalmente por Lula, mas também por Dilma, ao país que jogou no lixo sua democracia, sua justiça, sua soberania, e os programas sociais que tiraram dezenas de milhões da fome, da miséria, do desemprego, da falta de oportunidades, hoje, praticamente tudo destruído pelas mãos de Temer, Bolsonaro e a corja que os acompanharam e acompanham até hoje.

Toda essa longa explanação, que sei óbvia, mas necessária ao entendimento da premissa desse artigo, para que reflitamos de modo aprofundado, detalhado, nessa verdade histórica universal, expressa no início do artigo: EM SOCIEDADE, TUDO É PROCESSO, E TANTO AS CONQUISTAS CELEBRADAS POR TODO O MUNDO (GOVERNOS LULA, POR EXEMPLO) COMO AS DESTRUIÇÕES QUE CAUSAM DESPREZO E ESPANTO (GOVERNOS TEMER E BOLSONARO…) são FRUTOS DIRETOS das falas, discursos, ideologias, incivilidades, violências, perversões do Direito, ignorância, da sociedade brasileira e dos homens à frente de suas instituições.

Termino citando a criminosa e inacreditável participação e CHANCELA dos militares em todo esse processo, fazendo parte do coro que exaltava Sérgio Moro, endossando os massacres a Lula e, logo depois, pelas mãos dos mais radicais, velhacos e patéticos de seus generais, assumindo a campanha e o apoio ABSOLUTOS ao ser bestial, tido pelo próprio Exército como “um demente”, inadequado para continuar no exército, e hoje, “seu líder e presidente”, Jair Messias Bolsonaro. Trata-se, sem dúvida, de uma das mais vexaminosas páginas escritas, pela ação de alguns e a omissão de tantos, no apoio que deram a todo esse processo perverso da destruição de nossa democracia e nossa civilidade, nesse Brasil que nos tornamos, fragmentado, banhado em ódios diversos, um Brasil que tenta decidir as coisas no grito, na força, na violência…

Não foi um acaso,

Não foi “acidente”,

Não foi “culpa do PT”,

Não foi inevitável ou mesmo “Inesperado”…

O horror que vivemos hoje, as mortes desnecessárias pela COVID 19, a destruição da Amazônia, da Educação, da Ciência, das instituições, a desmoralização de tudo, o sofrimento moral que sentimos, os lúcidos que enxergam a imundície do pântano social que viramos, as incivilidades, os ódios, as perdas de tantos sonhos lindos, de um futuro que era para ser glorioso, todas essas coisas, UM SÓ PROCESSO, onde um abismo puxou o outro, uma omissão puxou uma ação mais perversa, e hoje, os agentes coais que nos trouxeram até aqui simplesmente não sabem o que fazer com “O BODE ESTABANADO, LOUCO E MAL CHEIROSO” que tomou conta da casa.

Depois de resolvida, de um jeito ou outro a “questão Bolsonaro”, se esses agentes sociais – (sociedade junto, diga-se!) não aprenderem as lições tão cristalinas, daqui a vinte, trinta anos, outras gerações passarão, mais uma vez, pelo mesmo horror….

Basta!!!

(eduardo ramos)

Redação

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