Suicídio é Desistir. Greve de Fome é Resistir, por Ruben Rosenthal

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Foto: Colagem com fotos Lambert/Getty Images e O Globo

Por  Ruben Rosenthal

Suicídio é Desistir. Greve de Fome é Resistir

Não a conhecia. O nome dela era Lígia Maria Panisset, professora estadual aposentada. Morava em São Fidélis, estado do Rio de Janeiro. Estava com câncer, e no começo de dezembro, em desespero, desistiu de resistir e ateou fogo ao próprio corpo. Estava com os proventos atrasados há vários meses, da mesma forma que boa parte dos funcionários públicos ativos e aposentados do estado. A notícia foi publicada apenas nos blogues da resistência ao golpe.

Vários outros suicídios de funcionários públicos e aposentados já teriam ocorrido nos últimos meses, passando despercebidos da população. Quantas outras mortes resultaram da falta de acesso a medicamentos e tratamento nos hospitais públicos, bem como da violência nas ruas, com o agravamento da crise econômica? Incluam-se ainda os despejos, corte de serviços básicos por falta de pagamento, endividamento, e inúmeras outras situações degradantes, que só quem está passando por elas é que pode descrever o pesadelo. Será necessário esperar por uma pesquisa em universidade estadual, se UERJ, UENF e UEZO não forem privatizadas antes, para se descobrir qual foi o saldo nefasto da política econômica do atual governo federal?

A ordem de comando vem de Brasília, enquanto nos governos estaduais estão os apoiadores, seja por fraqueza ou conivência. O ministro da fazenda manteve-se inflexível e insensível ao drama que os fluminenses atravessaram ao longo de 2017. Está sendo o Rio um laboratório para as experiências do ministro Meirelles, no intuito de determinar o limite da degradação econômica e social que o trabalhador brasileiro pode suportar antes de se rebelar? Os suicídios entram no relatório do experimento como danos colaterais?

Qual estado será a próxima bola da vez? A dívida dos estados com a União só faz crescer, apesar das dezenas de bilhões de reais que já foram pagos de amortização (J.C. Assis, GGN), como nos antigos contratos da Caixa Econômica, em que o mutuário, por mais que pagasse as prestações, continuava a dever mais que o preço do imóvel novo. Nós, cidadãos do Rio e do país, somos reféns das políticas de destruição da infraestrutura estatal de atendimento à saúde, educação, segurança e do patrimônio científico e cultural da nação. Tudo em prol de uma privatização que atende principalmente aos interesses do capital internacional. O empresário nacional se satisfaz com os ganhos a obter com as reformas econômicas encaminhadas por Meirelles. O papel que está sendo reservado ao país na economia global é o de ser celeiro agrícola do mundo e fornecedor de outras commodities, com o petróleo e minérios.

Alguém será responsabilizado criminalmente pelas decisões e omissões que resultaram em sofrimento e mortes no Rio de Janeiro? Bastariam as assinaturas do ministro e do Secretáriode Fazenda do Estado, Gustavo Barbosa, para garantir a entrada de recursos para pagamento de salários atrasados e aliviar os aspectos mais agudos da crise na saúde pública. Ao contrário, a opção foi de liberar verbas bilionárias para garantir a permanência de Temer na presidência  da república e a aprovação das reformas trabalhista e da previdência, em detrimento da massa de assalariados.

A justiça, cada vez mais cega, deveria ter impedido, no mínimo, o corte no fornecimento de luz e água devido às inadimplências, bem como não ter permitido que a crise no pagamento dos salários se arrastasse por tanto tempo. Caberia agora obrigar o Secretário Barbosa a pagar juros e correção monetária pelos atrasos. O sentimento atual dos servidores e aposentados é um misto de insatisfação, revolta e impotência pela situação de humilhação que está sendo imposta, e da incapacidade de se fazer reverter este quadro.

Os sindicatos estaduais não conseguiram se opor às condições impostas pelo ministro para que o Estado obtivesse empréstimo para pagar os salários atrasados. A atuação dos mesmos tem se pautado agora no apoio emergencial, oferecendo cestas básicas, empréstimos e apoio psicológico, sem dúvida muito necessários, mas a capacidade de combate está amortecida.

Pode ser que com a assinatura do empréstimo do Banco BNP Paribas, o pagamento dos salários atrasados seja plenamente efetivado, vindo a aliviar as tensões e, com isto, diminuir os protestos. Ou talvez não, pois mais surpresas desagradáveis podem vir em 2018. A questão da dívida pública continuará premente, pelo dreno infindável dos recursos financeiros que poderiam resolver a questão da crise na saúde.

Resta a esperança que nossos representantes eleitos façam mais que o uso da vibrante oratória, que contra uma maioria constituída principalmente por interesses escusos, pouco ou nenhum efeito surte. Estes representantes precisam liderar a resistência da população do Rio à política de desmanches ordenada por Brasília.

Em primeiro lugar, não podemos esquecer de Lígia Maria Panisset e daqueles que não conseguiram resistir às provações e privações. Para os que acreditam na imortalidade da alma, estendam suas preces neste final/início de ano para o repouso dos que viveram seus últimos momentos em tormento. Mas seria imperdoável que estas mortes fossem em vão; precisam abastecer o combustível da reação. Alguma forma eloquente de homenagem e denúncia deveria ser organizada pelos nossos parlamentares. E, a partir daí, eles precisariam adotar medidas mais efetivas de protesto para mobilizar a população anestesiada.

Uma velha forma de luta, que a História já comprovou ter um imenso potencial mobilizador, capaz de colocar o opressor na defensiva, é a greve de fome. Os parlamentares representantes do Rio, incluindo deputados estaduais, federais e senadores, precisariam deixar suas respectivas zonas de conforto e entrar em greve de fome, com uma pauta objetiva, que deveria minimamente incluir: regularização do pagamento dos funcionários públicos e aposentados, verbas emergenciais para a saúde, auditoria e renegociação da dívida pública do estado do Rio com a União. Como esta última reinvindicação é de interesse também dos outros estados, os governadores e parlamentares que não forem coniventes com a politica do governo Temer, terão interesse em apoiá-la. O movimento poderá, então, tornar-se nacional.

Trata-se de um movimento que deve ser necessariamente supra-partidário. O local para o protesto pode ser o gabinete do parlamentar ou, melhor ainda, um salão comunal, onde poderão ocorrer adesões, sejam de mais parlamentares, de personalidades com conhecido envolvimento nas causas populares, de servidores públicos ou mesmo do cidadão que queira protestar contra as péssimas condições da saúde no estado. Se o protesto se iniciasse com o cidadão comum haveria o risco de inanição antes da notícia da greve de fome conseguir furar o bloqueio da imprensa golpista. O fundamental para aqueles que quiserem aderir à greve de fome é dispor de boa saúde, devendo haver no local infraestrutura adequada e acompanhamento médico permanente.

Com a greve e a mobilização que ela tem o potencial de trazer, se for adequadamente encaminhada, a corda vai esticar até o limite de ruptura, dando um cheque-mate no governo. Fora desta opção de resistência e luta, a alternativa seria ficar esperando por 2018, na expectativaincerta de se conseguir eleger um presidente comprometido com as causas populares. Mas, até lá, danos irreversíveis ao Rio e ao país já terão ocorrido, além de mais mortes que poderiam ser evitadas. Estamos atravessando um momento difícil da História do país que requer decisões difíceis.

Alguns cidadãos resolveram não esperar pela iniciativa de parlamentares ou personalidades, e estão tentando organizar um movimento coletivo de greve de fome, com início provável a partir de 10 de janeiro de 2018, defronte ao TRF-4, em Porto Alegre. A primeira demanda que consta da pauta é a absolvição de Lula, com o reconhecimento de sua honradez pelos juízes. São incluídas mais sete demandas, que, se alcançadas, representariam a completa redenção social do Brasil. Talvez os parlamentares da oposição que não sejam do PT hesitem em aderir a um protesto em prol de Lula. Mas o que está em questão não é Lula, o Homem, e sim Lula, o Mito que ele representa para um povo que precisa resgatar a dignidade e que acredita nele, queiram ou não seus detratores e os que não simpatizem com ele ou com o PT.

Sobre o recurso à greve de fome, vale recordar alguns exemplos da História contemporânea.  Ghandi dobrou com sua força de vontade o poder imperial da Inglaterra, então potência ocupante do subcontinente indiano. As sufragistas desafiaram o poder constituído do Reino Unido há cerca de cem anos, na luta pelo direito de voto nas eleições para o parlamento. Derrotas também ocorreram. Embora o uso da greve de fome seja um recurso legítimo e extremo a que uma pessoa pode recorrer na denúncia de situações de injustiça a que esteja sendo submetida, esta forma de protesto assume um nível de grandeza que transcende o ego, as falhas e fraquezas humanas quando é realizada em prol de terceiros, beirando o mítico, como no caso de Ghandi. E quando realizada por um coletivo de indivíduos, cada qual fazendo uso de seu livre arbítrio, o poder transformador aumenta de forma exponencial.

Ruben Rosenthal, professor aposentado, Universidade Estadual do Norte Fluminense

 

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

5 Comentários

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  1. Greve de fome é resistir ?  E

    Greve de fome é resistir ?  E quem se importa com a morte da fome dele/a ? Que morra!

    Lembro de uma amiga contando pra mim a história de outra amiga:

    Dizia ela : ‘vou fazer greve de sexo com meu marido porque estou desconfiada dele.

    Minha amiga disse: Vc tem amante ? Resposta : Não.

    Então, a única que vai ficar sem sexo é vc..

    Greve de fome ,de sexo é de uma estupidez monumental.

    Em 2012/13 li que que morrerram mais de 1 700 pessoas na Russia com greve de fome.

    Putin foi reeleito e será novamente.

    Se liga,galera.

      1. Vc  monitora todos

        Vc  monitora todos comentários ?

        Poderia apontar uns trocentos mais imbecis ,inclusive seus.

        Não ofendi ninguém. Mas esse não é o ponto.

        O ponto é que vc se engraçou comigo.—pegue a senha.

          Lá pra julho .

           Quer me conhecer mesmo?

          Estarei na tv cultura em janeiro.—segundo me disseram depois de gravar 3 programas.

         O horário ? Me procure,meu.

        1. Rapaz, infelizmente para o
          Rapaz, infelizmente para o seu ego, eu nao tenho nenhum interesse em quem caga pela boca.
          Vai estar na TV cultural? Nossa que L E G A L.

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