Temer “abraçou o capeta” em 2017 e pode ampliar retrocessos em 2018, por Pablo Ortellado

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – Acuado por denúncias de corrupção e sem chance de ser apoiado pela sociedade com sua agenda liberal, Michel Temer pôs em andamento um acordo com o mercado, por sua própria sobrevivência no poder desde o impeachment de Dilma. Em troca, aproveitou a impopularidade recorde para implantar um programa que jamais seria referendado nas urnas.
 
Só não cumpriu ao mercado a promessa de aprovar a reforma da Previdência. E com as eleições já chegando, talvz nem consiga. Mas nada impede que “o avanço das investigações da Lava Jato” faça com que “o mercado apresente alguma nova fatura [em 2018] a ser paga pelo governo – às custas dos nossos direitos.” É o que avalia Pablo Ortellado, em artigo na Folha desta terça (26).
 
 
Por Pablo Ortellado
 
Na Folha
 
Sem apoio popular, Temer abraça o capeta
 
Na última entrevista do ano, o presidente Michel Temer fez um comentário gracioso sobre como sua popularidade finalmente tinha dobrado, passando de 3% para 6%.
 
Ele segue, porém, como mostrou levantamento do Eurasia Group, num distante último lugar no ranking mundial de aprovação de líderes, bem atrás do presidente da África do Sul, Jacob Zuma, enredado em graves escândalos de corrupção, e de Nicolás Maduro, cuja Venezuela vive uma crise política, econômica e humanitária sem precedentes.
 
Em uma situação normal, um presidente em fim de mandato e com aprovação tão baixa estaria buscando com todo empenho ampliar sua popularidade.
 
No entanto, recentemente, o presidente fez questão de retomar uma antiga observação do publicitário Nizan Guanaes de que deveria aproveitar sua impopularidade para fazer reformas impopulares.
 
A observação é uma variação do ditado popular, “se estiver no inferno, abrace o capeta”, uma máxima que não parece se aplicar à política, pelo menos não no seu sentido democrático. Nenhum político que dependa do voto pode ser extravagante ao ponto de se indispor cada vez mais com o eleitorado à medida que vai perdendo apoio.
 
Mas, obviamente, não estamos numa situação normal. O impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff abriu a possibilidade para Temer ascender com uma agenda nova, que não tinha sido e jamais seria referendada pelo voto.
 
Essa agenda, que surgiu de repente, na forma de um documento chamado “Uma Ponte para o Futuro”, parecia um acordo tácito com o mercado, no qual um governo duramente acuado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público trocava um apoio que garantisse a sua sobrevida pela rápida aprovação de uma ambiciosa e impopular agenda liberal.
 
Esse acordo permitia ao governo tentar salvar os políticos investigados com todo tipo de expediente. Primeiro, Temer fez cortes orçamentários que sufocaram financeiramente as investigações. Depois, apoiou a reforma eleitoral que facilitará a reeleição –e a manutenção do foro privilegiado– dos atuais parlamentares. E para fechar o ano, estendeu e ampliou o tradicional indulto de Natal para cobrir os condenados por corrupção.
 
Em contrapartida, para atender ao mercado, que era seu único ponto de apoio, Temer cumpriu o que prometeu. Nos últimos dias de 2016, o presidente já havia conseguido reduzir estruturalmente, por longos 20 anos, os gastos com saúde e educação por meio da PEC do teto.
 
Em seguida, no primeiro semestre de 2017, conseguiu fazer tramitar e aprovar a reforma trabalhista que criou obstáculos para se entrar com ações na Justiça do Trabalho, cortou o financiamento dos sindicatos e criou a modalidade do trabalho intermitente, tão condenada nos países onde foi implementada.
 
Seu plano era, logo em seguida, implementar uma reforma previdenciária que, entre outras medidas, demandaria inexequíveis 40 anos de contribuição para a aposentadoria integral e dificultaria a concessão do Benefício de Prestação Continuada, auxílio para os idosos pobres. Infelizmente para ele, a tramitação chegou perto demais do período eleitoral, a reforma teve que ser bastante reformulada e talvez mesmo assim não consiga ser aprovada.
 
No próximo ano, devemos seguir sofrendo os impactos deste acordo ignominioso. Se, por um lado, a proximidade das eleições nos protege de uma reforma previdenciária muito ruim, por outro lado, o avanço das investigações da Lava Jato pode fazer com que o mercado apresente alguma nova fatura a ser paga pelo governo –às custas dos nossos direitos.
 
E não podemos esquecer que a mistura perigosa de ojeriza aos políticos, guerras culturais e falta de alternativas pode nos empurrar em outubro um presidente ainda pior do que Michel Temer.
Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

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