The Auschwitzer Echo: o jornalismo no campo de concentração nazista, por Carlos Russo Jr.

The Auschwitzer Echo, chegou a ser impresso e distribuído secretamente e, durante algum tempo, conseguiu-se que fosse enviado para os movimentos de resistência na Cracóvia

Auschwitz

do Espaço Literário Marcel Proust

The Auschwitzer Echo: o jornalismo no campo de concentração nazista

por Carlos Russo Jr.

Expressões heroicas de resistência e fugas, muitas vezes desesperadas, outras organizadas como a impressão e distribuição de um jornal clandestino, ocorreram no maior campo de trabalhos escravos e extermínio nazista da II Guerra Mundial.

“Não é estranho que a síntese da crueldade do homem para com o homem tenha também produzido a síntese da nobreza do homem?”(I. Charny). Sem dúvida e são muitas as histórias de coragem e resistência frente ao terror absoluto imposto, dado que pelo menos um milhar de prisioneiros conseguiram escapar de Auschwitz durante os quatro anos de funcionamento do campo.

A punição comum para os que tentavam a fuga e eram descobertos ou recapturados era a morte por inanição; as famílias daqueles que conseguiam realmente escapar eram presas e internadas, exibidas com destaque pelo campo para inibir outros de tentarem a busca da liberdade.

Sempre que alguém conseguia realmente escapar, a SS escolhia aleatoriamente dez prisioneiros do alojamento de onde havia ocorrido a fuga e os fazia passar fome até morrer.

A primeira fuga de Auschwitz foi individual e ocorreu logo em seus primórdios, em 1940, quando o comunista polonês Tadeusz Wiejowski fugiu com a ajuda de trabalhadores poloneses empregados nos trabalhos externos do campo.

Entretanto, a mais espetacular das fugas de Auschwitz-Birkenau ocorreu em 20 de junho de 1942, quando três poloneses e um ucraniano realizaram uma ação extremamente ousada. Os quatro, após dominarem alguns SS, escaparam com suas fardas, armados e num carro oficial, um Steyr 220, roubado do próprio comandante do campo, Rudolph Höss. Nenhum deles foi capturado pelos nazistas.

Além das fugas individuais ou em grupos temos, entretanto, que associar outras formas de resistência, onde milhares se envolveram, o que não deixa de ser extremamente significativo e honram todos os que foram brutamente exterminados, crianças, mulheres, velhos e adultos, impossibilitados de qualquer tipo de reação perante a bestialidade nazista.

Em 1943, grupos de resistência organizaram-se pelos campos que constituíam o Complexo de Auschwitz. Eles ajudaram na fuga de alguns prisioneiros, sendo que estes fugitivos levavam notícias dos extermínios em massa, como, por exemplo, as das centenas de milhares de judeus húngaros executados entre maio e julho de 1944. Ademais, esses grupos organizados escreviam notas, bilhetes e realizavam furtivamente fotos dos crematórios e das câmaras de gás e os “plantavam” nas áreas ao redor dos campos e subcampos, esperando que pessoas, um dia, os encontrassem. Muitas das fotos que chegaram até nós tiveram essa origem.

Um jornal, The Auschwitzer Echo, chegou a ser impresso e distribuído secretamente e, durante algum tempo, conseguiu-se que fosse enviado para os movimentos de resistência na Cracóvia.

Sonderkommando era a denominação nazista dada a grupos de pessoas, normalmente judeus, que atuavam em campos de concentração, sob o comando destes. Eram recrutados entre os recém- chegados e tinham que executar tarefas brutais, como enterrarem os corpos dos prisioneiros mortos, realizarem a limpeza das câmaras de gás, alguns eram encarregados de escolher dentre as crianças aquelas que iriam para as câmaras de gás ou para as “experiências científicas”. Realizavam ainda outros serviços que os servidores alemães não gostavam de executar como o acionamento dos crematórios, limpeza, moagem dos ossos que serviriam de fertilizante quando enviados à Alemanha. Após pouco tempo de serviço muitos enlouqueciam e passavam a integrar a lista de pessoas a serem exterminadas e substituídas por novos “internos”.

Em outubro de 1944, os sonderkommandos judeus do Kommando III de Birkenau organizaram uma rebelião e atacaram os SS de surpresa com o uso de armas improvisadas como pedras, machados, martelos, ferramentas de trabalho, bombas feitas de excrementos humanos e postas a fermentar em recipientes fechados, garrafas incendiárias e explosivos roubados de uma fábrica de armas por mulheres prisioneiras.

Na sequência, os revoltados explodiram o crematório IV e se juntaram a eles os prisioneiros do kommando I do crematório II, que, por sua vez, dominaram os guardas e fugiram do Complexo. Ao redor de trezentos judeus e outros “internos” morreram nestes combates. As tropas de elite das SS nazistas tiveram seis mortos e cerca de uma dúzia de feridos.

O Armia Krajowa, o Exército de Livre Resistência Polonesa, foi uma das forças armadas clandestinas mais fortes e melhor organizadas na Europa sob o domínio nazista. No momento de sua capacidade máxima de combate (verão de 1943) as forças do Armia Krajowa eram compostas por aproximadamente 380 mil homens, incluindo 10 mil oficiais. Em janeiro de 1943 foi estabelecida uma nova unidade militar, a ’’Kedyw ’’, encarregada de ações de sabotagem e contra-espionagem.

Witold Pilecki, um dos fundadores do movimento armado de resistência polaca, foi a única pessoa a optar pela prisão voluntária no Campo de Concentração de Auschwitz-Birkenau. Ali chegando, organizou a resistência interna criando um movimento subterrâneo chamado União de Organização Militar (Związek Organizacji Wojskowej – ZOW). Desenvolveu também uma rede de informação que se comunicava por rádio com os aliados, graças a um transmissor de ondas-curtas, escondido no Bloco 11, e que enviava notícias diretamente para o governo polonês no exílio, em Londres. A ZOW chegou a planejar uma tentativa de levante geral em Auschwitz, coordenado com um ataque aéreo aliado e um cerco externo por terra a ser realizado pela Armia Krajowa.

Infelizmente, as tropas Aliadas não deram prioridade para o plano da resistência polaca e o ataque aéreo com desembarque de paraquedistas poloneses jamais aconteceu. Neste meio tempo, a Gestapo trabalhava para descobrir os integrantes do ZOW e conseguiu identificar e matar muitos deles.

Pilecki ainda conseguiu fugir do campo, na esperança de convencer pessoalmente os líderes da resistência de que um ataque a Auschwitz era possível. Escapou numa noite de abril de 1943. Seu plano, entretanto, foi considerado muito arriscado pelos ingleses e americanos, que, ademais, não quiseram acreditar em suas histórias sobre Auschwitz, que consideraram “muito exageradas, fabulosas, extremistas”.

Em 24 de junho de 1944, Mala Zimetbaum, prisioneira judia belga de 22 anos, escapou do Campo com seu namorado, o polonês Edek Galinski. Zimetbaum, que trabalhava em Auschwitz como tradutora num dos escritórios do campo principal, levou com ela cópias das listas de deportação de judeus a que tinha acesso. O casal passou pelos portões, ele vestido num uniforme roubado de soldado da SS e ela como sua namorada. Em 6 de julho, os dois foram presos perto da fronteira da Eslováquia e levados de volta à Auschwitz, onde, depois de uma estadia no Bloco do Terror, o Onze, foram sentenciados à morte. Galinski foi executado, mas Mala tentou o suicídio cortando os pulsos no alojamento antes do momento da execução e esbofeteou a guarda que tentou impedi-la. Gritando que a libertação estava próxima e que todos deviam se rebelar porque era melhor morrer lutando do que morrer como estavam sendo assassinados, foi atacada pelas guardas femininas e teve a boca esmagada, os dentes destruídos.

A supervisora-chefe do campo feminino, SS Maria Mandel, “A Besta de Auschwitz”, disse que tinha chegado uma ordem de Berlim para que Mala fosse cremada viva. Ela foi levada de maca até o crematório e testemunhas afirmam que um SS apiedado a matou com um tiro antes de seu corpo ser enfiado no forno pelos Sonderkommandos. De acordo com a sobrevivente Raya Kagan, em depoimento oficial em Israel durante o julgamento por crimes de guerra do nazista Adolph Eichmann em 1961, as últimas palavras de Mala Zimetbaum a seus carrascos alemães em Auschwitz foram: “Eu morrerei como uma heroína e vocês como cães!”.

Somente em agosto de 1944, aviões britânicos e norte-americanos bombardearam as fábricas de combustível líquido e borracha sintética da IG Farben nos arredores de Auschwitz III – Monowitz. Não por motivos humanitários, mas devido à sua importância no esforço de guerra nazista para a construção das Bombas V2.

“O genocídio é um tema do presente e do futuro, e não apenas do passado”. Conforme nos pontuou Israel Charny, pois, “logo que um ser humano é classificado, rotulado, como inferior, ele se torna boa presa para os que o reduzem ao nível de subsistência. O poder e a lei formam ao lado do opressor e ambos têm origem na autoridade que os sanciona. A consequência da desvalorização da raça humana é sempre a violência, o explorado e a vítima”. (Barran, Modern Trends in Violence)

Redação

1 Comentário

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  1. 57 milhões de brasileiros (39%) saíram de casa e votaram num ignorante, mentiroso e valentão, sabendo que ele sempre defendeu a tortura, a discriminação e o assassinato de seres humanos. Valores equivalentes aos dos nazistas.
    Os nazistas foram derrotados por uma ampla aliança. No caso do Brasil, essa aliança seria formada pelos 61% que não se identificam com o infame militar. Por que ainda toleramos os neonazistas ?

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