Tolerância zero para a corrupção, por Luiz Claudio Tonchis

Por Luiz Claudio Tonchis

No Brasil, a política funciona segundo os preceitos de uma ética pervertida, antirrepublicana e antidemocrática e que tende a valorizar a ações dos detentores ocasionais do poder, e não os interesses mais amplos da sociedade. É a contradição de sua natureza normativa: a justiça e o bem comum. Cinismo é a palavra certa para expressar o comportamento da maioria expressiva dos políticos brasileiros, que num sentido moral, é uma atitude que consiste no desprezo irônico, um deboche à ingenuidade dos cidadãos brasileiros.

A divulgação das conversas gravadas entre o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado com alguns integrantes do PMDB, os senadores Romero Jucá (RR), Renan Calheiros (AL) e José Sarney (AP), entre outros escândalos, abre a “caixa preta” da política nacional, exibe a sua face mais cruel, a corrupção generalizada. As conversas confirmam a redução frequente da classe política a uma estratégia de poder, estruturada na deterioração dos hábitos, uma perversão que onera e despreza o cidadão comum. As gravações indicam uma conspiração contra a República, revelam um trama macabro para o impeachment, sendo que os principais objetivos eram barrar a Operação Lava Jato e obstruir a Justiça. Para isso, contariam com o apoio de vários partidos envolvidos no esquema, e supostamente com o apoio Poder Judiciário.

Esses episódios potencializaram a crise na política e nas instituições. Atualmente, predomina a insegurança, o medo por um futuro incerto. Muitos achavam que o PT era “o corrupto”, e por temerem pela crise econômica, muita gente de bem foi às ruas e apoiou o impeachment, considerando que seria uma possibilidade para a saúde da democracia brasileira e solidez das instituições. Mas o que estamos vendo agora é o contrário, pois as instituições não estão funcionando bem e nenhuma delas está fora de suspeita. Além disso, a corrupção é um procedimento de muitas pessoas, que tendo em geral o poder político nas mãos, ou alguma outra forma de poder que poderia beneficiar a sociedade, decidem aproveitar-se dele em seu próprio favor.

Pois bem, aquele discurso de luta contra a corrupção para justificar o impeachment foi, de certa forma, um instrumento da própria corrupção. Os movimentos pró-impeachment que se diziam apartidários e sem ligações financeiras com siglas políticas, com os slogans: “a favor do Brasil”, “contra a corrupção”, “esse impeachment é meu”, protagonizados, principalmente pelo MBL (Movimento Brasil Livre), “Vem pra Rua” e os “Revoltados Online”, responsáveis pelos enormes ajuntamentos em manifestações contra o governo e pela disseminação do ódio através das redes sociais, são suspeitos de serem patrocinados, provavelmente com dinheiro sujo, por alguns partidos. Segundo a Folha de São Paulo, áudios confirmam que partidos financiaram o MBL em atos pró-impeachment.

A crise política é a carência da ética. Em um sentido primeiro, a crise designa a manifestação aguda de uma doença, um momento de desiquilíbrio sensível. Politicamente, é um conflito que afeta todos os cidadãos comum, a natureza das instituições e de nosso regime político. Por isso, é urgente que ocorram mudanças estruturais no espaço público.

Diante desse caos, é recorrente algumas perguntas fundamentais: Pode-se falar, legitimamente, de uma ética da política? Esses dois termos – ética e política – não estão hoje, profundamente separados e disjuntos? Quais os princípios éticos que poderão guiar a nossa frágil democracia? Questão à qual é difícil responder hoje, de maneira segura, ao sairmos da “tabula rasa” engendrada pelo desmoronamento de toda classe política.

O descrédito crescente que afeta a classe política leva hoje a uma interrogação sobre os fins e os meios da ação. Esta vontade de reunificar moral, ética e política se opera, aliás, sob o signo de um tradição bem antiga, posto que já em Aristóteles, a Política, ciência da cidade e da sociedade, é inseparável da Moral. O problema que se coloca hoje é que se seria possível a existência de uma moralidade coletiva, além da individual, capaz de auxiliar na orientação das possibilidades de controle e tratamento curativo e preventivo de atos de corrupção.

Pensar numa solução imediata parece não fazer muito sentido num modelo de sociedade em que a corrupção está culturalmente enraizada. Mas não podemos perder a esperança, é preciso fazer alguma coisa para sairmos desse “mar de lama”, que mancha a nossa dignidade. É urgente a definição de uma nova postura, sobretudo a uma nova forma de diálogo onde a ética esteja realmente em vista.

O discurso de ódio que permeia as relações, principalmente nas redes sociais, esvazia o diálogo. O diálogo não tem qualidade e é em si mesmo antiético. Nos últimos tempos, presenciamos uma onda de ataques de uns aos outros, cada um ao seu modo querendo ser o dono do saber e da verdade. Se a pessoa não compactua com sua visão de mundo ou ideologia, merece ser atacado, hostilizado, ridicularizado, xingado. É um discurso irracional e vulgar. Além disso, são inventadas mentiras, são criadas falsas notícias, boatos, slogans, clichês, que se espalham com muita velocidade nas redes sociais.

Para Hannah Arendt (1906-1975), o mal se associa à ausência de pensamento, à ausência de diálogo consigo mesmo e com o outro, permitindo que o indivíduo não questione seu comportamento, não problematize seus atos, mas poder-se-ia esperar que as regras da sociedade contivessem os indivíduos. No caso Eichmann e na adesão ao nazismo em geral, Arendt aponta justamente para o caminho oposto, o quadro de ausência de pensamento, que se constitui pela transferência da responsabilidade de julgar e decidir para uma instância superior, ou seja, o povo permitiu a barbárie e, talvez hoje, não mais permitiria.

A ausência de pensamento aproxima-se de uma forma compulsiva de comportamento, em que os indivíduos seguem as regras estabelecidas. No Brasil, o fanatismo político prevalece. As pessoas obedecem às ordens ocultas que são dadas numa adesão mecânica e imediata, ou seja, não refletida. O culpado é sempre o outro e as pessoas tem muita dificuldade para entender essa premissa. Trata-se de um comportamento automatizado, em que a responsabilidade sobre os próprios atos foi transferida para outros, para as regras, para a ideia de que todos fazem assim, para a ideia de “normalidade” ou para alguma autoridade.

A questão ética que se impõe é a de que as pessoas comecem a se comunicar de uma outra forma. A racionalidade, a verdade e o respeito é o único caminho para um consenso. Toda denúncia de corrupção, fundamentada em provas, deve ser abominada por todos. A corrupção não deve ser tolerada, simplesmente porque o acusado pertence ao partido com o qual simpatizo. O problema ético se desloca da questão partidária para a questão de justiça, é urgente a construção de uma rede contra a corrupção e outras mazelas que nos afetam. As redes sociais representam um veículo importante para essa nova forma de fazer política. A crítica é fundamental, mas tem que ser racional, verdadeira e consciente.

Não é através destas pessoas, desses políticos que estão aí que mudaremos o Brasil, mas podemos mudar sim, por meio do diálogo responsável, coerente e ético. A crítica é uma atitude do espírito, que não admite nenhuma afirmação sem reconhecer a legitimidade racional. Difere de um vulgar “espírito crítico”, ou seja, da atitude de espírito negativa que procura simplesmente denegrir sistematicamente as opiniões ou as ações das outras pessoas. Somente assim, ou seja, através do debate e da construção de uma crítica consciente e ética, poderemos renovar a nossa classe política. O Brasil está sofrendo, sim, mas está aprendendo a pensar, a ser cidadão. E agora precisamos reaprender a fazer política. Chegaremos lá.

 

Referências:

Segala, Pedro L.V., “Áudios Mostram que Partidos Financiaram MBL em Atos Pró-Impeachment”, jornal Folha de São Paulo. http://www1.folha.uol.com.br/poder/2016/05/1775543-audios-mostram-que-partidos-financiaram-mbl-em-atos-pro-impeachment.shtml?cmpid=facefolha (acesso em 28/05/2016).

Pontes, Amanda L., “Modernidade Como Crise: a Ação em Hannah Arendt e Max Weber”. http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/intersecoes/article/viewFile/5770/4190 (acesso em 29/05/2016)

 

Luiz Claudio Tonchis é Professor e Gestor Escolar, trabalha na Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, é bacharel e licenciado em Filosofia, com pós-graduação em Ética pela UNESP e em Gestão Escolar pela UNIARARAS e pela Universidade Federal Fluminense (MBA). Escreve regularmente para blogs, jornais e revistas, contribuindo com artigos em que discute questões ligadas à Política, Educação e Filosofia.

Contato: [email protected]

Redação

6 Comentários

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  1. Publiquei alguns

    Publiquei alguns entendimentos meus sobre as palestras da Fattorelli no UOL, gostaria de compartilhar aqui:

     

    O que devemos nos preocupar é com nosso Banco Central que está vendendo nosso país para bancos estrangeiros e nacionais através de títulos da dívida pública. Os títulos da dívida pública são emitidos pelo presidente do Banco Central eleito pelos bancos que elegeram os presidentes, para emitirem títulos da dívida pública atualmente com 16% de juros. Estes títulos emitidos vão gerando juros sobre juros que pagamos com nossos impostos, hoje responsável por um rombo em 50% de nosso PIB. Enquanto gastamos 3,5% com educação… Gastamos 50% de nosso PIB com juros dos títulos da dívida público ou do tesouro emitido por estes bancos através de nosso Banco Central privatizado, para que estes bancos lucrem com nossos impostos. Porque acha que com crise os bancos lucram tanto. acionais e estrangeiros que depois revendem para acionistas minoritários. Pesquise no youtube: Seminário Dívida Pública, Desenvolvimento e Soberania – Maria Lucia Fattorelli. É interessante, mas não é no gasto com funcionarismo público que devemos no preocupar. Pesquise no google imagens: Gráfico pizza fattorelli. No gráfico estão todos os gastos.. com a educação o governo não gasta nem 4%, a mesma coisa com a saúde. O nosso gasto, se conferir neste gráfico ou no vídeo no youtube: Seminário Dívida Pública, Desenvolvimento e Soberania – Maria Lucia Fattorelli. Perceberá que 50% de nosso orçamento está indo para os espertinhos dos bancos brasileiros e internacionais que depois revendem uma fração dos títulos do tesouro para pessoas como você e eu pagar mas ficam com o grosso da dívida. Ainda achamos que fazemos um grande negócio comprando estes títulos, sendo que 50% de nossos impostos estão indo para estes espertalhões que enganam nossos políticos que de espertalhões não têm nada e dão a presidência do Banco Central para estes bancários emitrem títulos de nosso país e lucrarem com o juros. Levy, Armínio e este novo. Na verdade desde que o presidente do Banco Cetral na era FHC Arminio Fraga em conjunto com bancos nacionais e internacionais começou a emitir títulos da dívida pública brasileira para os bancos comprarem com juros a 14%, o orçamento do Brasil se reduziu a 50% do PIB. Sim, devemos para bancos estrangeiros nacionais e internacionais 50% de nossos impostos. O Banco Central emite títulos com juros de 16% atualmente, entre os três maiores do mundo para que possamos ficar escravos de bancos estrangeiros e nacionais que depois revendem estes títulos da dívida pública brasileira ou os famosos títulos do tesouro para pequenas acionistas como eu e você comprarem. Mas eles ficam com o grosso da dívida. Um brasileiro compra um título do tesouro e acha que está lucrando, mas 50% de nossos impostos estão indo para estes bancos que em conjunto com o Banco Central comandado por eles mesmos desde a era FHC com Arminio Fraga roubam nosso dinheiro. Ao invés do Brasil renegociar estes títulos com os bancos como Rafael Correa fez no Equador com a ajuda da Fattorelli, eliminando até o analfabetismo no Equador que era grande, com grandes investimentos. Os nosso políticos ignorante do fato que estamos sendo roubados pelos bancos e seus presidentes do banco central, permitem que já quase 50% de nosso PIB vá para os bancos, fazendo a alegria dos banqueiros nacionais e estrangeiros. Enquanto ficarem acreditando neste papo de bolivarianos de Serra, ele está vendendo nossa Petrobrás nos EUA e conspirando com o novo presidente do BC para aumentar mais ainda este juros. Quando os juros somarem a maior parte do PIB, da onde irão cortar? Dos 50% dos bancos? Claro que não! Irão cortar nos 4% do orçamento da educação. Nos 20% dos aposentados. Pois é, Rafael Corrêa soube desta farra junto a Fattorelli e recomprou os títulos a 30% do valor e tirou o Equador do buraco e aqui estamos cortando da miséria. Isso (gastos com funcionarismo público) não faz cócega em nem 1% do orçamento do governo, o que realmente compromete o orçamento são os juros dos títulos da dívida pública que já somam 50% do orçamento do governo. Estes títulos pagamos com nossos impostos para bancos nacionais e estrangeiros que depois revendem para acionistas minoritários. Pesquise no youtube: Seminário Dívida Pública, Desenvolvimento e Soberania – Maria Lucia Fattorelli. Pesquisse no google imagens: Gráfico pizza fattorelli. No gráfico estão todos os gastos.. com a educação o governo não gasta nem 4%, a mesma coisa com a saúde… O Brazil como a Fattorelli ouviu o Armínio Fraga (ex-presidente do banco central na era FHC) dizer, é uma colônia financeira dos bancos internacionais. Pois é… Os impostos que pagamos é para pagar juros encima de juros dos títulos da dívida brasileira emitido pelo Banco Central em conjunto com bancos nacionais e internacionais. O Rafael COrrea do Equador venceu bancos com ajuda dela

  2. A corrupção é a commodity do judiciário.

    Eu penso que uma análise mais atenta identificará que quem produz e cultiva a corrupção no país e a faz disseminada na sociedade, e não só na política (talvez muito menos aí) é a classe dominante corrupta que condiciona a atuação do judiciário. Que, por sua vez, é formado também, por agentes corruptos, ou coniventes, ou omissos diante da corrupção.

    Basta ver dois exemplos mais emblemáticos para entender isso. Gilmar Mendes é Ministro do STF (????!!!!).

    E o Moro cultiva um doleiro bandido há mais de vinte anos.

    A “corrupção” é a palavra mais banalizada da lingua portuguesa porque perdeu completamente seu significado, desmoralizada pelos malabarismos e interpretações enviezadas das leis da parte dos agentes encarregados de cumprir e fazer com que seja cumprida a LEI.

    Os milhares de casos de corrupção são estocados para serem selecionados e adequadamente manipulados em ocasiões oportunas, ao sabor dos interesses dos grupos dominantes. A maior desmoralização dessa palavra, além da GLOBO, é a campanha eleitoral do MPF, em curso, que tem até home page e inserções no rádio pregando a “tolerancia zero” com a “corrupção”. Ora, para ter moral para falar em corrupção, o MP teria primeiro que ter a decencia de fazer a faxina nos seus prórprios quadros e explicar as seleções e os abafamentos, das “pastas erradas”, das acusações com “provas tenues” e outros tantos descalabros. A impunidade é a mãe de todas as corrupções e os órgãos do judiciário são o PAI da impunidade., escancaradamente.

     

     

  3. Retórica vazia. No popular,
    Retórica vazia. No popular, falou e falou e não disse nada. Pinçando elementos da realidade óbvios como a desintegração do sistema político no Brasil e misturando a isso mitos como o da corrupção institucional brasileira, como se houvesse algum povo santo nesse mundo, tira a conclusão absurda de que devemos fazer uma reforma moral e ética. Quem se propõe a uma “reforma ética e moral”, deveria ir fundar uma igreja. O que precisamos não é disso não. Não precisamos de retórica que nos faça dar as mãos e dialogar não, não nesse momento, não com esse governo temeroso na esfera federal. Depois fui ver que o cidadão que escreveu o texto é funcionário do tucanistão… agora tudo se encaixou hehehehe

  4. Os mentores de tudo

    Os pais de toda corrupção que ainda presenciamos nos tempos atuais no Brasil são os demotucanos (ex-PDS, ex-PFL, DEM e aliados). São os mentores de todo tipo de falcatrua existente. Fizeram grandes fortunas às custas da miséria do povo. Demotucanos são uma verdadeira máfia.

  5. Se todos sabam que a maior

    Se todos sabam que a maior parte dos indicados por Temer para compor seu governo estava envolvida em maracutaias, também ele sabia. 

    Acho que Temer deu com os burros n’água por pensar que estava imune às pressões, e que teria de parte da justiça e da mídia o apoio que o Pt jamais teve para seguir confortavelmente. 

    A mídia ainda não esconde estar do lado do malandro, mas precisa ficar na corda-bamba quando lhe falta alternativa para divulgar as denúncias. Quem tem nos surpreendido é Janot. Este tem mandado brasa contra os Temistas d eplantão. Parece que não sobra ninguém, e a situação do homi fica casa vez mais complicada até mesmo para os coxinhas, que já dizem assim: “Sabe de uma coisa, não sobra ninguém. Eu já disse que não voto mais em político nenhum. é tudo uma corja de malandros, etc. “. Ouvi isso de uma pessoa que admiro, mas que com ela não consigo falar em política.

    Até a Mulher da Cobra, Bicudo e Realli Júnior devem estar se sentido péssimos por terem protagonizado esse impeachment, afinal, o que eles queriam era tirar o PT do mapa por ser o partido mais corrupto e veem que a coisa não é bem assim. 

    O mais grave para Temer, a meu juízo, é que esse sujeito não poderá participar de eventos nem aqui e nem no Exterior. Fora Temer é como uma palvra de ordem. 

  6. tolerância….

    Nunca tivemos politica. Nem por grupos que se diziam de esquerda, socialistas ou democráticos. O poder político e público sempre esteve longe da sociedade, longe das escolas, longe do aprendizado. Sem aprendê-lo, sem conhecê-lo, como exercê-lo?(Busch estava lendo para um grupo de creche infantil nos ataques às Torres Gêmeas. Quando você viu um Presidente, um governador ou um vereador “lecionando” numa escola?). Transparência (ainda mais em tempos de internet) e instrumentos de fiscalização, mesmno simples, przo de obras, prazo para poda de uma árvre, para conserto de iluminação pública. A democracia para funcionar deve começar primeiramente no dia a dia, na porta das nossas casas.    

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