Treze maneiras de se olhar para um pasto, por Michael Pollan

Foto Divulgação

Enviado por Felipe A. P. L. Costa

Treze maneiras de se olhar para um pasto

Por Michael Pollan [1]

Para algo de que muitos dizem gostar tanto, o capim (e as gramíneas em geral) é curiosamente difícil de se ver. Bem, num sentido geral é possível vê-lo bastante, mas o quanto nós vemos de fato quando olhamos para uma superfície coberta de capim? A cor verde, é claro, talvez a passageira percepção de uma aragem: uma abstração. Para nós, a grama é mais um chão do que uma imagem, um pano de fundo para elementos mais distintos de uma paisagem – árvores, animais, construções. É menos um assunto em si mesmo do que um contexto. Talvez essa impressão se deva à disparidade na escala entre nós e os inúmeros pequenos seres que compõem um pasto. Talvez sejamos simplesmente grandes demais para perceber de maneira detalhada o que está acontecendo ali.

Curiosamente, parecemos gostar de capim menos pelo que ele é do que pelo que não é – quer dizer, a floresta –, e ainda assim costumamos nos identificar muito mais com uma árvore do que com uma folha de capim. Em geral, quando poetas comparam pessoas a folhas de capim, isso é feito para nos diminuir, para minar nossa individualidade e fazer com que nos lembremos de nossa insignificância existencial. Composto por tantas partes pequeninas e aparentemente idênticas, um trecho de capim – que muitas vezes ao ser examinado mais de perto revela ser composto não de capim, mas de leguminosas e de muitos tipos de plantas de folhas grandes – acaba nos transmitindo a aparência de uma grande quantidade indiferenciada, de um campo de colorido tosco. Essa maneira de ver o capim – ou de não vê-lo – deve nos ser conveniente; de outro modo, por que nos daríamos tanto trabalho para manter a grama aparada? O ato de apará-la só faz aumentar sua natureza abstrata.

*

Nota

[1] Michael Pollan (nascido em 1955). Extraído do blogue Poesia contra a guerra, o excerto acima integra o livro O dilema do onívoro: Uma história natural de quatro refeições (Intrínseca, 2007 [2006]). A tradução é de Cláudio Figueiredo.

Redação

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