A energia microbiológica e outras formas de bionergia na Legislação nacional

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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A bioenergia consiste no uso da biomassa – que pode ser definida, de maneira geral, como, “recurso renovável oriundo de matéria orgânica de origem animal ou vegetal” – como fonte de energia.Seu uso pelo homem teve início na História com a queima da madeira, que até hoje figura como um dos principais componentes da matriz energética mundial. Exemplos de biomassa são os mais diversos; além da madeira, pode-se citar: resíduos orgânicos de lixo doméstico, metano obtido de aterros sanitários e resíduos de colheitas, tais como cana-de-açúcar, trigo, milho e soja.

De acordo com o Balanço Energético Nacional (BEN) de 2013, a cana-de-açúcar representou 15,4% da matriz energética brasileira no ano de 2012. A moagem de uma tonelada de cana-de-açúcar gera, em média, 270 quilos de bagaço de cana, biomassa que pode ser utilizada para a geração de bioenergia. Muitas usinas implementaram a utilização do bagaço como biomassa, obtendo assim a autossuficiência em energia para seus moinhos, e, em muitos casos, geração de energia excedente – a qual pode ser comercializada.

Tomando como exemplo a matriz energética brasileira, observam-se as inúmeras vantagens do uso da biomassa, que além de ser renovável, é abundante, versátil e reduz a quantidade de resíduos descartados. No entanto, também há pontos negativos, como a baixa eficiência e alto custo de produção. Para isso, deve-se contar nos países com algum tipo de legislação que, se não suficiente em termos de auxílio financeiro para pesquisa e inovação no âmbito das life sciences, ao menos estimule e permita às empresas interessadas o estudo e desenvolvimento de tecnologias para fontes alternativas de produção de energia.

Muito embora a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) – instituída pela Medida Provisória nº 579/2012 (convertida na Lei nº 12.783/2013) com o escopo de desenvolver a matriz energética dos Estados – tenha sido concebida a fim de promover a competitividade da energia produzida por fontes alternativas, há que se destacar que (i) a nenhuma das fontes poderá haver a destinação anual de recursos que ultrapassem 30% do recolhimento anual da CDE; (ii) há a necessidade de disponibilidade de recursos por parte da Eletrobras, além da destinação ser condicionada a um enquadramento do projeto em questão. A CDE, apesar de importante, certamente não conseguirá, por si só,trazer a preconizada diversificação da matriz energética nacional.

Tendo em vista esse enorme potencial, nos últimos anos, diversos estudos vêm sendo desenvolvidos, ao redor do mundo,por empresas privadas de tecnologia com o objetivo de se obter novas formas de bioenergia. Nesse sentido, a biotecnologia vem se apresentando como uma promissora convergência de ciências, com potencial de se tornar uma das principais locomotivas de inovação e produção econômica do século XXI.Uma das muitas definições de biotecnologia pode ser retirada da Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU: “Biotecnologia define-se pelo uso de conhecimentos sobre os processos biológicos e sobre as propriedades dos seres vivos, com o fim de resolver problemas e criar produtos de utilidade”.

Recentes estudos já incorporam a definição de “Nova Biotecnologia”, que agrega os conhecimentos atuais de genética e biologia molecular à produção de bens e produtos que devem trazer benefício à Humanidade. O interessante é ver como a biotecnologia tem, cada vez mais, estado integrada à infraestrutura.

Nesse contexto, pode-se citar o uso de micro-organismos na geração de energia. Embora essa possibilidade já seja explorada desde a década de 1970, apenas recentemente foram desenvolvidas possíveis aplicações práticas que viabilizem uma eventual produção em larga escala. Alguns estudos apresentados nacional e internacionalmente demonstraram a possibilidade de se trabalhar com as bactérias como usinas elétricas unicelulares, utilizando seu metabolismo energético (que envolve transferência de elétrons durante suas reações bioquímicas na utilização de glicose) para a construção de um “reator” capaz de armazenar esta energia, utilizando o mesmo princípio de uma pilha simples – com cátodos e ânodos.

Esse tipo de geração de energia já é denominado como energia microbiológica e constitui uma das principais apostas de especialistas em energia para o futuro na geração de energia para pequenas comunidades, juntamente com a energia azul, a energia maremotriz e a energia geotérmica. Entretanto, como se pode observar de uma leitura simples da mencionada lei que reformulou o setor energético no Brasil, não houve um cuidado especial com a disciplina normativa dessas fontes alternativas – nem sequer é possível localizar no texto legal referências a elas. As próprias modificações da Medida Provisória que diminuíram a atratividade do Ambiente de Contratação Livre – ACL perante o Ambiente de Contratação Regulado – ACR demonstram como as energias renováveis são olhadas de forma subsidiária, e não complementares, no planejamento energético brasileiro.

A aplicação da energia microbiológica possui vantagens sobre as atuais tecnologias de geração de bioenergia, sobretudo com relação à sua alta eficiência. No entanto, para a definitiva implementação deste método, tendo em vista sua viabilidade econômica, muitas melhorias tecnológicas ainda serão necessárias. A boa notícia é que, à medida que estudos baseados na produção de energia com tecnologia eletroquímica avançam, os eletrodos estão se tornando mais baratos, o que coloca esta tecnologia como um dos maiores potenciais futuros de conversão de carboidratos em eletricidade.

Em tempos de constantes acusações a São Pedro pelo risco de falta de abastecimento energético no País, talvez o contexto atual de ansiedade pudesse servir como lição para que as próximas reformulações normativas vislumbrem melhor essas e outras possibilidades de diversificação da matriz energética nacional.

Maurício De Angelo Andrade – Médico pela Universidade Estadual de Campinas e bacharelando em Economia pela Universidade de São Paulo. Profissional do setor Farmacêutico/Life Sciences em São Paulo

André Castro Carvalho – Bacharel, mestre e doutor em Direito pela Universidade de São Paulo. Advogado em Direito Público e professor em São Paulo

Lourdes Nassif

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