Caso Wajngarten: se a Folha elogiou o PT, a coisa é grave, por Gustavo Conde

A Folha parece estar buscando alguma coisa que não o eterno "passar de pano". Como sempre, pode ser alarme falso

Caso Wajngarten: se a Folha elogiou o PT, a coisa é grave

por Gustavo Conde

Curiosa a inflexão sutil na solução editorial presente no jornal Folha de S. Paulo de hoje. Eles evocam o governo Dilma no título da manchete para dizer que casos de conflitos de interesses como os de Wajngarten – no governo Dilma – foram sanados.

A matéria é assinada por Reynaldo Turollo Jr.

É uma mudança quase imperceptível aos olhos céticos de leitores mais à esquerda mas, na verdade, é curva acentuada para os padrões modorrentos que habitam o ethos do jornalismo político brasileiro.

A Folha parece estar buscando alguma coisa que não o eterno “passar de pano”. Como sempre, pode ser alarme falso, mas a maldita mania de lidar com fatos empíricos da linguagem é um vício e uma desgraça.

Ao ponto: ser comparado ao governo Dilma é corrosivo para Bolsonaro. Os bolsonaristas ficam confusos e o governo do “ídolo” é arrastado para o velho mundo político criminalizado de sempre.

Ocorre um ‘destacamento’, por assim dizer, no sistema de blindagem espontânea que reveste o governo Bolsonaro – decorrente do antipetismo estrutural que povoa as redações.

A comparação surpreendente e positiva para Dilma dá pistas de que o jornal da família Frias não vai recuar tão facilmente no caso Wajngarten, como costuma recuar em outras denúncias relativas ao governo federal.

Lembremos das grandes matérias do jornal sobre os disparos ilegais no WhatsApp, das parcerias com o The Intercept e da ligação da família Bolsonaro com o assassinato de Marielle. Foram todas matérias robustas, que demandaram forte investimento editorial e que, no entanto, foram engavetadas, não se sabe se de maneira permanente ou provisória.

O caso Wajngarten, por outro lado, é mais sensível e diz respeito à própria sobrevivência de alguns veículos de comunicação e à respectiva receita publicitária do governo federal que costumava ser rateada entre as grandes empresas de mídia.

O pronunciamento de Wajngarten no dia em que a reportagem-estopim foi publicada revelou a forte tensão instalada entre Folha de S. Paulo e governo.

O secretário da Secom soltou as acusações de praxe contra a imprensa que habitam o discurso bolsonarista, mas deixou uma estranha ameaça no ar.

“Eles mexeram com a pessoa errada”, disse ele, sem antes forrar a investida: “se determinados grupos de comunicação ou institutos de pesquisa tinham em mim a tentativa de construção de uma ponte de diálogo, esta ponte foi explodida agora.”

A escalada retórica revela uma situação inédita de crise entre governo e imprensa. O uso dos dados do governo Dilma foi a cereja do bolo e, concretamente, a resposta em tom de ameaça do jornal dos Frias contra o governo.

É a senha: “podemos fazer com vocês o que fizemos com o PT”.

É uma briga boa de ver, a despeito da destruição do país por essas duas dimensões do horror: o jornalismo venal, seletivo e de conveniência versus um governo abertamente nazista e mergulhado em todas as tipificações de corrupção passíveis de serem catalogadas no grande almanaque hediondo do crime organizado.

A relação sempre tensa entre a Secom e a sede de verba publicitária dos grandes veículos de comunicação do país está sendo gerenciada, neste momento e portanto, pelo escândalo Wajngarten.

E, pela primeira vez, a memória positiva dos governos petistas invadiu a correlação de forças na arena pública.

É sinal de que a corda está prestes a arrebentar.

Mas, enquanto a imprensa familiar brasileira goza de um imenso emaranhado de conexões e interesses muito bem estruturados e organizados ao longo do século, a Secom é “amarrada” ao seu titular pela boa e velha corda que sustenta cargos públicos de confiança.

Uma corda frágil que ainda vem com um arremate em sua amarração final. Um arremate em forma de forca.

Redação

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