…Hannah Arendt, no Brasil de hoje, se escandalizaria com a perversidade de nossas classes médias…

…Hannah Arendt, no Brasil de hoje, se escandalizaria com a perversidade de nossas classes médias…
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Um dos mais originais e brilhantes conceitos ideológicos sobre o ser humano e suas potencialidades é o de Hannah Arendt, sobre a “banalidade do mal”. Não é tão fácil de ser assimilado em toda a sua profundidade e paradoxos, apesar de sua simplicidade na essência da ideia que formula.
O que “agrediu” a mente de Hannah Arendt deixando-a absolutamente perplexa, foi o fato de enxergar o quanto eram COMUNS aqueles sádicos-preconceituosos-fanáticos-genocidas, os nazistas julgados em Nuremberg por seus crimes contra a humanidade.
Era afinal o MAL, uma “coisa banal”, potencializada em “gente comum” e não em “monstros de nascença”…? – eis a questão.
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De certo modo, o que ela viu naqueles alemães (maridos e pais amorosos, pessoas civilizadas nos aquários sociais em que viviam e monstruosos “apenas” com os seres a quem DESPROVIAM DE VALOR E/OU HUMANIDADE), na verdade é algo presente em TODA A HISTÓRIA HUMANA, o que vemos retratado não só nos livros e registros históricos, mas em obras de arte pungentes, os filmes e romances que narram os massacres de nações, povos, civilizações em ações continuadas de selvageria, crueldade e perversidades diversas inomináveis…
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Mas seriam os massacres dos índios nas Américas, dos negros, na África, os únicos exemplos do que é capaz a “maldade humana”? Ou teríamos HOJE, falas e ações de “gente comum”, a presença do MAL?
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Termino essa parte mais teórica de minha reflexão trazendo um conceito que me instiga há décadas: “A legitimação da exceção”. Trata-se da ideologia impregnada em determinada sociedade, que um líder ou grupos sociais a serem MASSACRADOS PELO ESTADO E PELA PRÓPRIA SOCIEDADE, através de falas, discursos e ações de perseguição e destruição daquelas pessoas, são “LEGITIMADOS” POR AQUELA SOCIEDADE, devido ao DESPROVIMENTO DE VALOR HUMANO que passa a valer para esses “seres de exceção”.
Um exemplo? A religião católica endossava o genocídio dos índios em todo o mundo, por serem “seres sem alma” – animais, em última análise. O filme “A Missão”, com Robert de Niro tem uma cena antológica sobre isso, quando tenta mostrar através do talento de um menino índio, “a presença da alma humana” nos silvícolas.
TODA A MALDADE HUMANA É PRECEDIDA DESSE HORROR, A “LEGITIMAÇÃO DA EXCEÇÃO”, quando pessoas se permitem adotar, apoiar, celebrar, falas, ações, condutas que causam sofrimentos indizíveis ao outro, porque em suas mentes e corações esse “outro” não é visto em sua INTEGRIDADE HUMANA, mas, como dissemos, É DESPROVIDO DE “VALOR”…
(o fato de nossas classes médias não se importarem em absoluto com as chacinas que existem há décadas em nossas periferias e favelas, um autêntico “genocídio legalizado pelo costume”, atesta essa teoria…)
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O que essas coisas e conceitos têm a ver com o Brasil de hoje? Vejamos algumas falas e ações de altíssimo grau de perversidade e injustiça, endossados por nossas classes médias.
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1) Quando uma jovem estudante ficou cega de um olho pela ação da PM paulista, apenas por participar de uma manifestação “pró-democracia” e contra o impeachment de Dilma Rousseff, as redes sociais foram inundadas por comentários dignos de NAZISTAS, o mesmo espírito, o mesmo ódio – apenas trocavam os judeus na Alemanha pelos “petralhas” no Brasil de hoje.
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2) Tenho amigos e familiares boníssimos em seus aquários sociais, são civilizados, gentis, éticos, tentam arduamente “ser boas pessoas”… – e apesar dessas características, NUNCA TIVE O PRAZER de ouvir deles, uma única vez, de relance que fosse, uma crítica aos PMs de São Paulo e Rio, quando tiravam selfies sorridentes nas “passeatas dos brasileiros de bem” (sic…), a pedido desses mesmos cidadãos, enquanto agrediam da maneira mais violenta e covarde aos chamados “petralhas” – é a doença da “legitimação da exceção” presente no inconsciente dessas pessoas, algo do tipo: “…se está na rua defendendo bandido chefe de quadrilha, tem mais é que ganhar porrada mesmo…” – frase que cansei de ouvir e ler nas redes sociais, desses “cidadãos do bem”.
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3 – A omissão de nossa sociedade com a miséria e a vida degradante, desesperadora às vezes, de milhões de brasileiros. A omissão, é “A CUMPLICIDADE DO COVARDE”, é essa não-ação, de quem no fundo, não se importa, é indiferente aos horrores vividos pelo outro. A falta de cognição de nossas classes médias em relação à REALIDADE VIVIDA por nossos pobres é algo estarrecedor. Ao ponto de tratarem com desprezo – por puro preconceito ideológico! – os programas sociais adotados por Lula e Dilma em seus governos, tratando como “vagabundos preguiçosos”, os que recebem o Bolsa Família, programa aplaudido em todo o mundo civilizado…
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4 – O massacre a Lula – talvez o exemplo mais emblemático desse período DOENTIO da nossa História, porque nossas classes médias simplesmente “se esqueceram” DE TODOS OS PRINCÍPIOS DE VIDA E OS CIVILIZATÓRIOS, que aplicam em seu dia a dia, com as pessoas por eles consideradas “normais” – ou, providas de valor humano…
As pessoas não percebem que é NESSE PARADOXO, que reside a essência do MAL em nossa sociedade – porque “legitimam” dentro de si mesmas, a celebração de todas as falas, ações, selvagerias e injustiças gritantes cometidos pela mídia, por Moro, pelos procuradores da Lava Jato, pelas autoridades em geral, contra Lula, nos últimos anos.
Não enxergam que essas mesmas falas, ações, perversidades, se cometidas contra um político “a quem respeitassem”, se rasgariam de dor, perplexidade, indignação e até revolta. Não enxergam o quanto tal paradoxo e incoerência lhes causa a FRATURA DO SER, a esquizofrenia perversa de celebrar para o ser tornado o “satanás de suas almas”, o que chorariam amargamente se cometido contra “um ser humano normal”…
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Todos nós que mantemos a lucidez em dia, citaríamos dezenas e dezenas de outros exemplos: a proibição de Lula ir ao enterro de seu irmão Vavá (nossas classes médias taxando-o de “hipócrita”, por Lula não ter ido ao enterro de dois irmãos que ele nem conhecia – nunca tentaram se informar da verdade, comprando a versão soltada por Carlos Bolsonaro nas redes sociais…), a aceitação da ideia de que Lula tentou “culpar dona Marisa”, por simplesmente ter afirmado que ela, e não ele, tinha gostado da cobertura. o caso do reitor Cancellier, que nossa classe média não repudiou por se tratar de uma delegada da Lava jato, a autora da ação criminosa, tantos exemplos…..
Paro por aqui.
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Fica o registro de uma SOCIEDADE ENFERMA, banhada em inúmeros e seculares PRÉ- CONCEITOS, tornada fanática, tangida em seus “raciocínios” e emoções em um trágico, perverso e tosco rebanho (des)humano…. Uma sociedade capaz de eleger pessoas psicóticas e cruéis como Joaquim Barbosa, Aécio Neves, Sérgio Moro, Dória Jr., Witzel, Bolsonaro, como seus “heróis”…. – e odiar Lula, preso sem crime algum cometido.
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Somos na atualidade a sociedade que melhor espelha a teoria de Hannah Arendt, somos essa trágica nação em que diversas formas de MAL se tornaram BANAIS.
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Levaremos décadas de reflexões, debates, estudos, sofrimentos, para atingirmos um mínimo estágio de um país educado, civilizado, solidário com seus pobres e miseráveis, democrático.

Redação

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