Mais livros e menos armas, please…, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Se a cultura da violência não estivesse sendo propositalmente espalhada por Jair Bolsonaro e pelo general-vice várias famílias de Suzano não seriam obrigadas a lamentar uma tragédia

Mais livros e menos armas, please…, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Esta semana dois fatos aparentemente isolados se tornaram notícia. No Rio de Janeiro a polícia prendeu os suspeitos de executarem Marielle Franco. Na casa de um deles centenas de fuzis modernos forem apreendidos. Em Suzano, Estado de São Paulo, dois rapazes armados invadiram uma Escola e praticaram um massacre.

Marielle foi morta por razões políticas. Os mandantes do assassinato ainda não foram localizados, mas as evidências sugerem que existe uma ligação entre os pistoleiros e a família Bolsonaro.

A motivação dos assassinatos praticados em Suzano não ficaram muito claros.

O general-vice imediatamente culpou os Games Violentos. É fato, em 2008 o US Army começou a explorar o potencial militar destes Games. Se prestarmos atenção ao vídeo Collateral Murder, percebemos que o piloto norte-americano que despedaçou vários jornalistas há uma distância considerável poderia facilmente se desligar da violência praticada e passar a atuar como se estivesse apenas jogando um jogo letal.

O mesmo pode ser dito dos militares dos EUA que, operando Drones de combate, usaram mísseis Hellfire para matar supostos terroristas há milhares de quilômetros de onde eles estavam jogando.

Mas não era deste jogos letais que o general-vice estava se referindo. Hamilton Mourão condenou os Games Violentos jogados por garotos e garotas ao redor do mundo. A relação entre os Games e o vício já foi bem estabelecida. A relação entre a violência virtual e a violência real é menos evidente. Existem centenas de milhões de jogadores ao redor do mundo, mas a esmagadora maioria deles nunca cometeu um homicídio.

Além disso, o próprio Mourão é um exemplo interessante. Ele disse que na época que ele era criança esses Games Violentos não existiam. Entretanto, isso não impediu que ele se transformasse num profissional da violência capaz de dizer em setembro de 2018 “Meus heróis não morreram de overdose…. Heróis matam.”

https://www.youtube.com/watch?v=3Iy-mkQhAdg

A violência está tão impregnada na consciência do general Mourão que, ao culpar os Games Violentos pelo massacre de Suzano, ele se esqueceu de algo importante. Ao dizer que “Heróis matam…” ele mesmo pode ter incentivado os dois garotos que cometeram o massacre de Suzano. Liderar pelo exemplo é uma tarefa difícil tanto para os militares quanto para os políticos. Entretanto, ninguém pode dizer que as tarefas de ambos são idênticas.

Preso injustamente Lula nunca incentivou ninguém a pegar em armas e começar uma guerra civil. O ex-presidente petista é responsável e está dando um excelente exemplo de civilidade. O mesmo não pode ser dito do general Mourão. Tudo indica que o vice-presidente ainda não conseguiu se ajustar bem ao seu novo papel. De vez em quando ele se comporta como se estivesse arengando suas tropas num quartel. Isso ocorreu por exemplo, quando Mourão comparou a deforma da previdência a uma batalha e disse que é preciso “avançar e degolar”.

Os garotos que massacraram crianças em Suzano fizeram exatamente isso. Eles avançaram e degolaram algumas de suas vítimas.

Jair Bolsonaro não é muito melhor do que seu vice. Durante a campanha o novo presidente brasileiro ensinou crianças a atirar, ameaçou fuzilar petralhas e defendeu a liberação das armas de fogo. Os autores do massacre de Suzano eram adeptos fanáticos do bolsonarismo. Isso certamente deve ter influenciado muito mais a conduta deles do que os Games Violentos.

Nos EUA os massacres nas escolas fazem parte do cotidiano. As autoridades e os jornalistas norte-americanos geralmente tratam os atiradores como maníacos solitários que agiram sob a inspiração de ideologias anti-cristãs ou anti-americanas. A facilidade de acesso a munição e armas de fogo (inclusive fuzis) só é considerado a verdadeira raiz do problema dos massacres pelos norte-americanos pacifistas. Em quase todos os Estados dos EUA a compra, a venda, a posse, o porte e o uso de armamentos é um direito garantido por Lei e defendido vigorosamente pelos republicanos. Sempre que os militantes do desarmamento ganham algum terreno os defensores da Segunda Emenda à Constituição dos EUA fazem suas grotescas Open Carry Demonstrations.

No Brasil a esmagadora maioria da população é a favor do Estatuto do Desarmamento. As manifestações em favor revogação da Lei 10.826/2003 estão restritas à internet (os autores do massacre de Suzano pertenciam a algumas comunidades virtuais que cultuam armas de foto) e a um punhado de deputados e senadores maníacos (cujas campanhas foram financiadas pelos fabricantes de armas).

E já que estamos falando de armas lembrei-me de algo importante. Meu avô materno fabricava e consertava espingardas. Ao fazer 16 anos, todo neto dele ganhava uma de presente. Não ganhei a minha. Aos 18 anos criei coragem e reclamei. Foi então que meu avô me disse algo inesquecível:

– Você é esquentado como seu pai. Se eu lhe der uma arma você vai fazer bobagem e acabará com sua vida.

Meu avô nasceu em Apiaí e viveu quase toda a longa vida dele na cidade de Eldorado-SP. Jair Bolsonaro morou naquela cidade. Ele provavelmente conheceu meu velho João Ribeiro de Freitas. Infelizmente o novo presidente não teve a oportunidade de aprender algo útil com meu avô.

Se nenhum civil tivesse acesso às armas de fogo Marielle Franco estaria viva e defendendo suas propostas em Brasília. Se a cultura da violência não estivesse sendo propositalmente espalhada por Jair Bolsonaro e pelo general-vice várias famílias de Suzano não seriam obrigadas a lamentar uma tragédia.

Uma coisa, porém, tem ficado evidente desde o golpe com o Supremo com tudo. Não existe nada que não possa ser piorado no Brasil. Portanto, os pais que têm filhos em idade escolar e os professores devem esperar o pior. Mas nem por isso é justo ou correto incentivá-los a comprar armas. O mais correto seria organizá-los para sair às ruas em defesa do desarmamento. O Brasil precisa de mais livros, não de mais armas.

Fábio de Oliveira Ribeiro

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