Violência policial em São Paulo, um fruto podre da falsificação histórica

São Paulo foi a província mais atrasada da Colônia e do Império. Não podendo enriquecer com o açúcar (produzido no nordeste) e com ouro e pedras preciosas (que foram encontradas em Minas Gerais), os bárbaros paulistas, quase sempre fluentes apenas em tupi-guarani, se especializaram no trabalho mais desumano possível: destruir malocas e caçar índios e realizar expedições punitivas em aldeamentos quilombolas. Séculos depois, quando São Paulo começou a enriquecer com o café os bandeirantes degoladores de índios e de negros seriam glorificados pela historiografia paulistana.

A história de São Paulo se caracteriza pela brutalidade exagerada, mas foi escrita de maneira recalcada. Isto talvez explique o conservadorismo dos paulistas e sua peculiar sede de sangue. Apesar de se considerarem mais civilizados do que os outros brasileiros, os herdeiros das malocas de brancos e mamelucos construídas na Borda do Campo que se transformaram em São Paulo, aplaudem a violência policial.

Instigados pela população e por uma parcela significativa da imprensa local, a PM de São Paulo é uma das mais letais do mundo. Apesar disto existem paulistas que não estão satisfeitos. Eles clamam por mais violência e inevitavelmente acabam sendo atendidos pelos incautos policiais.

A tragédia paulista é evidente. Mutiladas, as famílias das vítimas da violência policial clamam por uma Justiça que não é e não será feita pelo TJSP. A pena de morte é proibida, mas em São Paulo raramente um policial assassino é condenado e preso. Em geral predomina no TJSP a idéia estapafúrdia de que o policial sempre age em legítima defesa (foi o que ocorreu recentemente durante o julgamento de um recurso envolvendo policiais que participaram do massacre no Carandiru).

Com exceção do uso da língua portuguesa, os policiais paulistas são herdeiros legítimos dos antigos mamelucos bandeirantes. E não deixam de ser tão ou mais violentos que seus duplos antigos. Mas ao desumanizar suas vítimas eles também se desumanizam. Não por acaso, os suicídios e conflitos letais entre policiais também são comuns em São Paulo.

O que fazer? Creio que a primeira coisa a ser feita é remover as camadas históricas tóxicas que foram sendo sedimentadas pelo recalque ideológico. Os bandeirantes devem deixar de ser vistos como heróis, como símbolos de uma civilização que nunca existiu na província mais pobre e atrasada da Colônia e do Império.

Os paulistas precisam ver quem os bandeirantes realmente foram (mamelucos assassinos, caçadores de índios e de negros que sequer falavam língua-portuguesa) para perceber que não há nada de glorioso naquilo que eles fizeram. Ao encarar o passado de uma forma desideologizada os habitantes de São Paulo começarão a adquirir a capacidade de entender e modificar a triste realidade em que o Estado segue mergulhado.

A violência policial poderá então começar a ser confrontada e destruída. Não com tiros e coquetéis molotovs e sim com a tranqüilidade que advém do cumprimento da Lei tal como a mesma foi escrita: a pena de morte é proibida, o homicídio praticado pelo policial também é crime.

O heroísmo dos bandeirantes é uma tradição inventada. E apesar dos símbolos que ela ajudou a produzir (o Palácio dos Bandeirantes, a estátua do Borba Gato, o Monumento das Bandeiras, etc…) esta ideologia se tornou tóxica e nociva à pacificação da sociedade paulista. É ela que justifica a violência policial, o sofrimento dos familiares das vítimas, a ausência de justiça e a evidente brutalização dos policiais.  

A perversão histórica e histérica que orienta a ação da PM/SP ficou evidente na afirmação do novo comandante da ROTA. Segundo ele, a abordagem dos cidadãos nos Jardins pelos policiais deve ser diferente daquela que é usualmente empregada na periferia http://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/abordagem-nos-jardins-tem-de-ser-diferente-da-periferia-diz-novo-comandante-da-rota/. A sinceridade do oficial é reveladora.

O racismo da PM/SP é programático. Os soldados (eufemismo para pistoleiros) do governo do Estado de São Paulo sabem que o TJSP só liberou-os para maltratar e matar pretos e mulatos pobres nos bairros pobres. Se ousarem dispensar o mesmo tratamento aos parentes dos juízes, desembargadores e tucanos nos Jardins eles serão punidos na forma da Lei que é deliberadamente ignorada na periferia. Isto prova que, no fundo, PM/SP não é uma instituição republicana e sim uma organização criminosa a serviço dos interesses de uma elite mesquinha que preservou a mentalidade colonial.

 

PS: A foto que ilustra esta matéria é propositalmente uma falsificação tão grotesca quanto a história gloriosa dos bandeirantes.

Fábio de Oliveira Ribeiro

3 Comentários

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  1. VIOLENCIA POLICIAL

    Este texto é extemamente representativo da sanha revisionista (e desonesta) do chamado “politicamente correto”. Julgar pessoas e instituições segundo o nosso pensamento e do nosso relativismo pós-moderno é de uma canalhice ímpar.

     

    São Paulo, até por ter poucos recursos buscou no desbravamento dos sertões e na ocupação do restante do sudeste e do centro-oeste a sua redenção e fez do empreendedorismo, desde o inicio, a sua vocação economica. O Brasil deve a São Paulo a conquista e povoação de quase metade do seu território: Paraná, Minas Gerais, Góias, Tocantins, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e o Distrito Federal nasceram das “terríveis” bandeiras paulistas.

     

    Demonizar seus personagens históricos, que é o que o pensamento “políticamente correto” mais sabe fazer não vai tornar SãoPaulo menos violento. Entender que o momento histórico é outro e que devemos buscar uma cultura de paz, sim! Isso, por si só, irá reduzir drasticamente a violência cotidiana, perpetrada pelos cidadãos “de bem”. Quanto ao crime organizado, a resposta do Estado tem de ser mais contundente. O PCC já é uma das maiores organizações criminosas das Américas e vem, inclusive, começando a chamar a atenção de organizações internacionais de segurança. Apenas com muita investiento em inteligência e na integração da atuação de nossas várias corporações policiais.

     

    Enfim, vamos deixar o Borba Gato e o Anhanguera em paz e focar em nossos reais(e gravissimos) problemas de violência e criminalidade…!

    1. Discordo.Revisionistas são

      Discordo.

      Revisionistas foram os idiotas, aloprados e malandros que transformaram os jagunços paulistas em heróis. 

      Portanto, o que proponho é resgartar a História levando em conta tudo aquilo que realmente foi feito: extermínio e aprisionamento de índios, invasão de terras indígenas, exploração bestial do trabalho escravo e perseguição brutal de negros fugidos, etc…

      No mais o seu comentário apenas comprova tudo o que foi dito. Se não for uma vítima da falsificação histórica você é apenas um histérico que insiste em preservar a imagem idealizada que foi construída dos jagunços paulistas para naturalizar a violência policial cotidiana nas periferias de São Paulo. 

    2. Parei de ler em “conquista e povoação”. Povoar o que já estava povoado é assassinato mesmo, não é revisionismo. Conquistar o que? Contra quem? Revisionismo é querer validar a violência com a desculpa da “conquista e povoação.”.

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