O PESADELO DE WALL STREET E DA AMÉRICA – Editorial do Le Monde

Seguramente, poderíamos ser tentados, na Europa, a nos alegrar com a revisão para baixo dos números do PIB americano, publicados na sexta-feira 27 de agosto. No segundo semestre o crescimento na zona do euro foi claramente superior ao dos Estados Unidos: 4% contra 1,6% em bases anuais. Havia muito tempo que o Velho Continente não havia se distanciado tanto do Novo.

Na verdade, isto é inquietante. O enfraquecimento da economia americana – a mais poderosa do mundo, com cerca de 20% do PIB mundial – é uma má notícia para todo o mundo, China, Japão, países emergente e Europa. É inútil esperar uma retomada durável e sólida da economia mundial sem uma retomada durável e sólida da economia americana.

Durante a Grande Depressão foi a um ritmo extremamente acelerado de crescimento que a economia americana se recuperou, em meados da década de 1930, após seu buraco negro. Nada similar ocorre desta vez. Sua capacidade de resistência, antes tão elogiada por economistas, seu otimismo e sua tradicional energia vital desta vez parecem faltar.

O mercado imobiliário, onde se iniciou a crise das subprimes, não parece estar se recuperando, como o mostram esta semana os níveis historicamente baixos das vendas de imóveis novos ou usados. A dívida pública cresce, ao ponto de deixar de sobreaviso as agências de classificação que ameaçam rebaixar o país à nota de triplo A se os déficits não forem rapidamente reduzidos. Quanto ao consumo, o motor tradicional do crescimento do outro lado do Atlântico, este encontra dificuldades para crescer, as famílias pensam em poupar mais e pagar suas dívidas, enquanto o país enfrenta um fenômeno até então desconhecido, o desemprego de longa duração.

Se se perceber qualquer coisa funcionando mal no modelo econômico americano, percebe-se também a total impotência da Casa Branca em acalmar a opinião pública e em propor novos remédios. É fato que a administração Obama está dividida entre o campo dos economistas que aconselha a resolver o mais rápido a consolidação das finanças públicas, notadamente pela majoração dos impostos e aquela dos especialistas que se posicionam, ao contrário, contra a inércia da Reserva Federal e pleiteam uma reinjeção maciça de fundos públicos para evitar uma outra queda na economia. Para também afastar o fantasma de um longo período de deflação, como aquele experimentado pelo Japão após a explosão de sua bolha imobiliária e da Bolsa no final da década de 1980 e a falência geral do seu sistema bancário.

Portanto, é a síndrome japonesa que assusta a América de hoje. Ou seja: um longo período de crescimento quase nulo e de consumo estagnado, uma sucessão de planos de retomada estéreis, levando o déficit público a níveis assustadores (mais de 200% do PIB). Tudo isto com uma Bolsa quase que em estado de coma. Só para lembrança: o índice Nikkei (da Bolsa de Nova York) valia mais de 40.000 pontos há 20 anos e vale menos de 9.000 atualmente. Wall Street e a América têm razão para estarem vivendo um pesadelo. O resto do mundo também.

Tradução: Argemiro Pertence é engenheiro, ex-vice-presidente da AEPET e comentarista internacional do programa `Faixa Livre` (Rádio Bandeiras 1360 kHz – AM – Rio de Janeiro, 8 às 10 horas.

Le Monde – 28/08/2010.

Redação

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