Conspiração 2: A Franquia do Crime, por Gustavo Gollo

Terá a Franquia do Crime já dominado meios de comunicação e fração tão grande do estado que se tornou impossível tentar combatê-la?

Conspiração 2: A Franquia do Crime, por Gustavo Gollo

A expressão depreciativa “conspiração” costuma ser aplicada a qualquer explicação alternativa às veiculadas pelos grandes meios de comunicação. Tal ocorrência impõe ao rótulo um matiz fortemente conservador, possibilitando a ele, com uma só tacada, desacreditar toda tentativa de crítica a notícia endossada pelos grandes jornais, de modo que as dúvidas lançadas sobre qualquer notícia que venha sendo veiculada em uníssono pelos meios de comunicação – que se repetem uns aos outros –, são automaticamente negadas, e imediatamente desqualificadas. O resultado é a validação de qualquer notícia que tenha sido repetida pelo conjunto dos grandes meios de comunicação, e a negação de qualquer possibilidade alternativa.

Não bastasse a leviandade com que a pecha pode ser imputada aos que duvidam das versões oficiais de qualquer história – aquelas endossadas pelos meios de comunicação –, o rótulo costuma ser lançado em bloco, agregando ao intrometido – o bisbilhoteiro petulante que ousa duvidar das verdades patrocinadas pelos poderosos –, o espectro geral de “conspirações” que inclui as sandices mais inverossímeis.

Toda a situação conspira a favor dos poderosos patrocinadores dos meios de comunicação e contra os que lhes denunciam os abusos, dificultando o desmascaramento de conspirações, por vezes, bastante óbvias.

Dias atrás, tratei de uma delas: o pacto de silêncio instituído entre todos os grandes meios de comunicação do país, que emudeceram por completo sobre o Escritório de Crime, a notícia bombástica lançada pelo maior meio de comunicação do país em 19 de agosto de 2018 até a divulgação, no primeiro de novembro, da instauração de uma investigação das investigações do assassinato de Marielle Franco, pela Procuradoria Geral da República. Lembrando que toda a intimidade demonstrada entre os autores da reportagem e os assassinos, assim como as informações sobre tabela de preços de assassinatos, e detalhes análogos, parecem caídos no esquecimento, nunca sendo referidos, mesmo ao se tratar do Escritório do Crime.

Mas, se, tortuosamente, os acontecimentos de novembro acabaram trazendo à baila o Escritório do Crime, desvelando-o do encobrimento que cerca as conspirações, permaneceu inexplicado o pacto de silêncio, vigente por mais de 2 meses entre todos os grandes meios de comunicação, sobre sinistro sindicato de assassinos.

Lembremos, a seguir, de outra ocorrência constrangedora para os meios de comunicação.

A Franquia do Crime

A expressão é embaraçosa, mais ainda quando em dupla com “Escritório do Crime” – ambas oriundas da mesma fonte, as organizações Globo, e embebidas do mesmo matiz sensacionalista que tende a arranhar a própria credibilidade. A palavra “Franquia” no entanto, contida na locução, é bastante esclarecedora.

No dia 14 de março de 2018, talvez não coincidentemente o mesmo do assassinato de Marielle Franco, a TV Globo iniciou uma série de reportagens com esse título, na qual apresentava um esquema bastante moderno e ágil, similar a uma franquia, de implementação do crime organizado.

A Franquia do Crime, segundo as reportagens, ofereceria a seus associados todo o respaldo para a instituição de uma milícia – um sistema de dominação sobre a população de determinado território. Para isso, os franquiados necessitariam apenas formar um grupo de indivíduos com treinamento policial, incluindo uns policiais da ativa.

Uma milícia se assemelha ao irmão mais velho das gangues, naquilo que tende a se tornar uma gangue quando seus membros ficam adultos. Tendo assumido o controle de um território, a milícia passa a assumir o controle de toda a atividade ilegal na área, decidindo o que é, e o que não é permitido ali, cobrando taxas extorsivas por qualquer atividade local que resulte em lucro, como o tráfico de drogas, agiotagem e serviços em geral. Também costumam cobrar proteção de comerciantes, ou de qualquer um que lhes possa pagar alguma taxa. Determinam que políticos podem fazer suas campanhas no local, tendo eleito vários candidatos próprios. Suas determinações são garantidas com a execução exemplar de qualquer um que se lhes oponha; suas mensagens costumam ser divulgadas a bala. Uma versão muito meiguinha do mesmo quadro foi oferecida aqui, pela BBC Brasil; uns amores.

Uma vez formado o grupo de indivíduos com prática na área de segurança – a participação de policiais no grupo lhe garante autoridade – a franquia lhe oferece parceria e apoio da polícia, dos sistemas legais e dos meios de comunicação, além de eventualidades, como cobertura na internet, através de hackers, impedindo a disseminação de memes inconvenientes, por exemplo. O apoio administrativo também pode ser proporcionado pela franquia, que vela pelo bom andamento do empreendimento em troca de uma taxa proporcional aos rendimentos da empresa. A camaradagem entre os policiais e colegas milicianos favorece o rumo dos negócios, assim como a cordialidade e o respeito entre eles e os tribunais e meios de comunicação.

O apoio da polícia, oferecido pela franquia, quando necessário, pode, por exemplo, se configurar na forma de ataques a traficantes que se recusem a entregar o fruto de seu comércio.

A intervenção militar imposta ao RJ para, entre outras coisas, conter essa apropriação do estado pelos criminosos, precisou de uns poucos meses para aderir ao esquema, passando a atuar como tropa de choque dos milicianos contra traficantes.

De acordo com a reportagem da Globo, o esquema de franquia tem sido extremamente profícuo, de maneira que as milícias têm se propagado profusamente, abarcando aproximadamente 2 milhões de habitantes no estado do RJ, um ano atrás, na época da reportagem. O empreendimento anda de vento em popa e certamente já se ampliou consideravelmente, desde.

Lamentavelmente, no dia em que a série foi ao ar, e 4 policiais foram presos, acusados de participação em milícias, ocorreu também o assassinato de Marielle Franco, fato ameaçador que talvez tenha arruinado o restante da série e evitado que outros meios de comunicação tocassem no assunto. Desde então, durante o restante do ano de 2018, o assunto foi ganhando esquecimento, ou, talvez, inexistência. A permanência dos vídeos com a notícia na internet, e outros vestígios – vídeos e textos inconvenientes às vezes somem –, atestam, ou, talvez, garantem a existência da Franquia do Crime, tivessem sido excluídos e a Franquia do Crime teria se tornado uma conspiração.

Franq2

Ainda que a concepção de uma organização criminosa tão gigantesca, moderna e intimamente entranhada no estado pareça inverossímil, o alastramento bastante palpável das milícias é bem claro, não deixando dúvida sobre o bom momento vivido pelo ramo, atualmente, e sugerindo, fortemente, haver uma coordenação central de toda a atividade.

Mas, que desatino estaremos a imaginar? Não estaríamos delirando ao dar azo a conjectura tão absurdamente fantasiosa?

Haverá mesmo uma Franquia do Crime respaldando o alastramento explosivo das milícias por todo o estado do RJ e ameaçando englobar o país, por completo, em poucos anos? (Os números apresentados pela Globo sugerem que isso esteja ocorrendo muito rapidamente).<

Mas se isso está ocorrendo, e de maneira galopante, por que não se toca em assunto tão drástico e premente? Terá sido instituída uma proibição sobre o assunto entre os grandes meios de comunicação?

Não parece aceitável que, tendo abarcado 2 milhões de habitantes em duas décadas, as milícias acabem por abarcar todo o país? Será tal preocupação fruto de crenças conspiratórias?

Estará a população brasileira sendo mantida na ignorância acerca do crescimento e riscos da Franquia do Crime?

Por que não se alardeia o estado de coisas descrito na reportagem da Globo, de um ano atrás, e se delibera pela solução definitiva desse estado de coisas?

Terá a Franquia do Crime já dominado meios de comunicação e fração tão grande do estado que se tornou impossível tentar combatê-la?

Terá sido a Franquia a responsável pelo assassinato de Marielle? E será ela também a responsável pelo atraso na solução do crime?

A ideia da existência de uma Franquia do Crime já quase indistinguível do estado brasileiro se assemelha a um delírio, a uma fantasia conspiratória. Ao menos enquanto ela não bate em nossa porta.

Veja também:

https://jornalggn.com.br/violencia/marielle-franco-e-a-franquia-do-crime/

# Conspirações, # Marielle # Franquia do Crime

Redação

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