A inserção das mulheres nas polícias

Por Marco Antonio L.

Da Carta Capital

Reforma policial e perspectiva de gênero

por Márcia Esteves de Calazans *

Passados praticamente dez anos dos primeiros estudos, no Brasil, sobre mulheres policiais militares, observa-se que a produção nacional aumentou assim como neste período a publicação internacional tem dispensado razoável atenção ao tema na perspectiva da redução da violência, entendendo que a inserção de mulheres nas polícias leva consigo a possibilidade de discussão das diferenças e o respeito a estas.

Como abordagem recorrente na produção bibliográfica internacional, a ênfase está nos elementos da tríade reforma policial, concepções de segurança pública, inserção de mulheres, e produção do conhecimento. Estão nesses estudos articuladas entre si, categorias fundamentais, que são: o conceito de gênero; as políticas identitárias das mulheres; o conceito de patriarcado e as formas da produção do conhecimento.

O que marca de forma radical o tratamento ao tema. Portanto não somente a produção bibliográfica aumentou, mas, sobretudo, ganhou nova abordagem. Em que pese novas abordagens, no Brasil, em sua grande maioria, os estudos mostram-se ainda, descritivos em relação à alocação de mulheres, apontam as desigualdades de gênero nas forças policiais e o impacto da violência institucional sobre as mulheres.

Faz-se importante somar-se a estes gender-sensitive police reform – gênero como potencial de reforma policial. Os estudos internacionais desenvolvidos pela United Nations Development Programme (UNDP) têm trazido para o cenário das políticas de segurança pública e das reformas policiais a necessidade de integrar gender-sensitive police reform (GSPR), considerando as sociabilidades de homens e mulheres, modelos construídos, comportamentos e posições sociais os quais passam a ter protagonismo nas políticas de segurança pública – segurança enquanto direito – e das reformas policiais. Relatório realizado pela UNIFEM Progresso das Mulheres no Mundo 2008/2009, mostra que no início de 2007, o Governo da Índia enviou mais de 100 mulheres polícias para a Libéria.

Sendo esta a primeira Unidade Policial Formada inteiramente composta por mulheres em toda a história das operações de manutenção da paz da Organização das Nações Unidas. Conforme a UNIFEM e a Polícia da ONU, o objetivo é dobrar a proporção de mulheres que fazem parte da sua Polícia (UNPOL, na sigla em inglês) para 20% até 2014. Em agosto de 2009, a ONU lançou a campanha “Esforço Global” para aumentar o número de policiais do sexo feminino atuando nas missões de paz.

Atualmente, do total do contingente na UNPOL servindo em 17 missões, apenas 8,5% são mulheres. Neste bojo, Bangladesh está tentando recrutar mais 10 mil policiais do sexo feminino nos próximos meses, enquanto a Libéria também estabeleceu a meta de 20% até 2014.

A presença de mulheres policiais na Libéria ajudou a aumentar o número de denúncias de casos de violência sexual e de gênero. Recentemente, a UNIFEM desenvolveu um estudo no qual centrou-se especificamente sobre as lições aprendidas com a reforma de gênero na polícia no Kosovo, na Libéria e Serra Leoa. Os resultados do estudo mostram que a reforma de gênero na polícia constitui um instrumento vital para o avanço da implementação da Resolução n° 1.325, as mulheres e os direitos de execução de direitos humanos no âmbito da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW). Pensar a reforma da polícia na perspectiva de gênero (GSPR1) tem a premissa de que homens e mulheres têm seus papéis construídos, comportamentos, posições sociais, e diferentes acessos a recursos, o que pode criar vulnerabilidades específicas de gênero ou inseguranças gênero, alguns dos quais são particularmente importantes durante e após o conflito. GSPR aplica, portanto, uma análise de gênero para a polícia e os processos de reforma, garantindo os princípios da igualdade de gênero. Esses aspectos são sistematicamente integrados em todas as fases do planejamento a reforma política, projeto, implementação e avaliação.

Também aborda, por exemplo, como a construção das identidades de gênero moldam as percepções dos policiais e da planificação da segurança pública. Como consequência de construir tal reforma, levando em consideração a perspectiva de gênero nas mais diversas etapas do planejamento, resultará em contribuir para a construção de instituições policiais que não sejam discriminatórias, reflexo da diversidade dos cidadãos e prestar contas à população em geral. Como tal, os serviços de polícia serão cumprir o mandato essencial da polícia de preservar o Estado de Direito (2).

Pensando em países onde a inserção de mulheres nas polícias é recente, sobretudo países que viveram longos períodos de conflitos, a reforma da polícia deve ser projetada para resolver problemas como a corrupção, o uso excessivo da força, preconceitos étnicos, discriminação de gênero e afins, deve trabalhar com cada um desses elementos de mudança institucional. Portanto, pensar as reformas nas polícias há que inserir nesta discussão e planejamento a perspectiva de gênero.

Por exemplo, a polícia da Nicarágua tem buscado a “perspectiva de gênero” como um de seus nove princípios e valores institucionais, para a reforma policial. Neste sentido, a reforma das polícias é amplamente entendida como um dos pilares da recuperação pós-conflito, como elo efetivo de todos os processos de governança. A reforma da polícia, na perspectiva de gênero, é um componente de extrema importância na planificação da Segurança Pública Cidadã.

Ainda observamos profundos preconceitos quanto ao gênero nos quadros policiais. Os estudos, práticas e projetos desenvolvidos pela UNIFEM, no mundo, têm apontado que as experiências das mulheres trazem consigo , na crise das polícias, a potencialidade do novo.
*Márcia Esteves de Calazans é psicóloga Social, professora e Pesquisadora no PPG Políticas Sociais e Cidadania da Universidade Católica do Salvador – Bahia. Líder do Grupo de Pesquisa Violência, Democracia, Controle Social e Cidadania UCSALCNPq.

1 Gender Sensitive Police Reform in Post Conflict Societes.

2 Gender Sensitive Police Reform in Post Conflict Societes

Luis Nassif

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