O Estado Laico, as religiões e a esquerda

O ESTADO LAICO, AS RELIGIÕES E A ESQUERDA – D. Pedro II é deposto e vai com sua família para o exílio na Europa, depois de figurar como Imperador do Brasil durante impressionantes 48 anos. Os militares republicanos, influenciados pelas teses positivistas, separam Estado e Igreja e criam o estado laico que temos hoje. 

Tudo devidamente consagrado pela Carta Constitucional de 1890. Ou seja, lá se vão 123 anos de estado laico e republicano, consagrado por força legal. 

Nota-se uma certa preocupação em algumas pessoas com relação ao “perigo” do avanço de forças teocráticas no país, que, em tese, estariam a ameaçar o estado laico legado pelo iluminismo e tornado realidade ao fim do século XIX. Creio que os temores são legítimos, porém, demasiados. 

Não há a menor possibilidade de se alterar o status de estado laico na República Federativa do Brasil. 

A sociedade brasileira jamais aceitaria tamanho retrocesso. Inclua-se nesta sociedade um número sem fim de sindicatos, associações de classe, movimentos sociais, estudantis, artísticos, culturais e, também, a repulsa dos militares brasileiros, salvo alguma exceção que sempre existe para confirmar a regra. 

Foram os militares que tornaram o Brasil um estado laico, é mais fácil encontrar militares trabalhistas, e até comunistas, do que encontrar militares simpáticos a causa da extinção desse estado laico, por eles mesmos erigido.

Penso que o fenômeno do “avanço” das religiões na vida política brasileira é mais uma fantasia e um temor (oriundos possivelmente do desconforto católico) do que uma realidade objetiva. 

As religiões, ou melhor dizendo, a confissão Católica Apostólica Romana, sempre esteve presente no dia a dia da vida política nacional, desde Cabral. 

Até os dias de hoje a Igreja Católica conserva importante influência em vários setores da vida política, econômica e social da nação, através de suas comissões, que atuam em diferentes setores da sociedade. 

O estado laico quer dizer que as leis basear-se-ão numa Carta Constitucional e não mais no Direito Canônico. Em sua vida civil, cardeais, bispos, padres e afins respondem a lei, e, em sua vida particular, dentro da organização religiosa a qual pertencem, respondem hierarquicamente aos seus superiores até chegar ao Papa, no Vaticano. 

Ocorre que o estado laico não proíbe a religião, ao contrário, ele aceita todas as confissões e não professa oficialmente nenhuma. O que isto quer dizer? Quer dizer que, em que pese a existência legal do estado laico, as religiões tem total liberdade de atuação em busca de seus fiéis, aos quais procuram catequizar de acordo com seus dogmas. 

A religião está presente no cotidiano da vida de centenas de milhões de brasileiros, isso é inegável e é daí que surge a força política dessas confissões. Não é força legal, capaz de impor dogmas ao estado, mas é uma força política que atua cotidianamente e que busca fazer valer suas teses junto a seus fiéis, orientando-os inclusive em temas polêmicos como o aborto ou o casamento homossexual. 

As igrejas atuam e fazem pressão nos parlamentos desde sempre! 

O que chamam hoje de avanço religioso refere-se, na verdade, a outra situação. Há um inegável avanço da confissão evangélica no Brasil, ao passo que a confissão católica permanece estagnada. 

Em 1980 os evangélicos representavam 6,6% da população. Em 2010, já eram 22,2% da população. Note-se que entre 2000 e 2010 houve um enorme avanço, de 61,45%, no número de evangélicos em nosso país. O número de católicos, entre 2000 e 2010, caiu 1,3% e atualmente o número de evangélicos já representa 1/3 do número de católicos. 

Estes dados estão presentes nos censos feitos pelo IBGE. 

De tudo o que foi exposto até aqui, podemos extrair a tese (que evidentemente precisa ser melhor trabalhada) de que não há ameaça alguma ao estado laico brasileiro. 

Mais correto seria dizer que a igreja católica deixou de ter o monopólio da fé no país e que o crescimento exponencial das confissões evangélicas está provocando uma disputa surda entre esses dois ramos da fé cristã. É uma disputa por espaço, por fiéis, por influência política e econômica, etc. 

Isso não é uma ameaça ao estado laico, mas sim uma acirrada batalha entre confissões que disputam entre si a crença de milhões de cidadãos e cidadãs do Brasil. 

As igrejas estão onde sempre estiveram, presentes na vida da sociedade e tentando influenciar os rumos das políticas públicas implementadas por governos municipais, estaduais e pelo governo federal. 

Setores de esquerda tem adotado uma postura refratária contra a fé evangélica. Melhor seria examinar os números e a realidade concreta e objetiva dos fatos, que demonstram com nitidez o crescimento dessa confissão, e tratar de disputar corações e mentes nos meios evangélicos, antes que a direita o faça de modo irreversível. 

Por acaso é novidade o fato de que a esquerda brasileira sempre manteve fortes laços com a fé católica? Certamente que não! Então, não adianta estigmatizar os evangélicos, melhor será levar as teses da esquerda até eles! 

Não há vácuo na política. 

Ou a esquerda ocupa determinados espaços, e busca influenciá-los, ou quando se der conta do tempo que perdeu estigmatizando uma confissão religiosa, que hoje abrange quase 45 milhões de cidadãos, poderá ter sido tarde demais.

Luis Nassif

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