Ronaldo Bicalho
Pesquisador na Universidade Federal do Rio de Janeiro.
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A matriz energética nacional

Do Blog Infopetro

Para acompanhar a discussão sobre a evolução da matriz energética brasileira é imprescindível conhecer uma publicação editada pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e Ministério de Minas e Energia (MME): O Balanço Energético Nacional (BEN).

O relatório consolidado do Balanço Energético Nacional apresenta, anualmente, a contabilidade relativa à oferta e o consumo de energia no Brasil, contemplando as atividades de extração de recursos energéticos primários, sua transformação em formas secundárias, a importação e exportação, a distribuição e o uso final da energia.

O documento final do BEN é disponibilizado no segundo semestre do ano posterior ao ano base. Dessa forma, os dados consolidados para o ano passado (2012) ficaram disponíveis no segundo semestre de 2013. Contudo, como forma de disponibilizar estatísticas energéticas ainda no primeiro semestre, a EPE elabora o documento intitulado “Resultados Preliminares do BEN”, cuja edição de 2013 – ano base 2012 – ficou disponível no seu site, até a publicação no segundo semestre dos atuais dados consolidados .

Além de trazer os resultados do ano anterior, o BEN traz uma série de balanços consolidados que cobre o período que vai de 1970 até o último ano disponível, que, no momento, é 2012. Portanto, são mais de quarenta anos de dados sobre a maneira como a energia vem sendo produzida, transformada e utilizada no Brasil.

Nesse sentido, o BEN constitui uma base de dados muito interessante para quem acompanha as discussões sobre energia. Para que se possa aproveitá-la plenamente, é necessário conhecer alguns conceitos-chave na sua construção, que facilitam a compreensão do alcance desse instrumento.

Utilização, transformação e produção de energia

Em primeiro lugar, cabe lembrar que a energia não é usada diretamente. É preciso que haja sempre algum dispositivo que converta a energia contida nas diversas fontes na forma de energia que se necessita. Assim, é necessário o aquecedor para converter a energia contida no gás no calor necessário para aquecer água para se tomar o banho quente. Aqui surgem dois conceitos importantes: energia final e energia útil. A primeira é a energia que colocamos à disposição do usuário e a segunda é a energia que esse usuário efetivamente aproveita; ou seja, a primeira é a energia contida no gás que ele consumiu, a segunda é a energia que ele realmente aproveitou na forma de calor.

A partir desses dois conceitos define-se um outro conceito chave: o rendimento na utilização. Esse rendimento pode variar com o uso, com a fonte e com a tecnologia presentes nessa utilização de energia.

Em termos dessa utilização, a energia contabilizada pelo BEN é a energia final; ou seja, a energia que é colocada à disposição do consumidor. Como esse consumidor vai usá-la, para que uso e com que eficiência, é um tipo de informação que não está disponível no balanço; já que o quadro contábil descreve o fluxo de energia até a “porta” do consumidor. Por isso, o BEN é um tipo de balanço chamado balanço de energia final. Para descrever o que acontece depois, é necessário um outro tipo de balanço: o balanço de energia útil. Porém, cabe salientar que pode-se encontrar essas informações não nos quadros contábeis, mas em uma seção à parte, na própria publicação, que cuida exatamente dessas informações.

No BEN, o consumo final energético é aberto para os seguintes setores: setor energético, residencial, comercial, público, agropecuário, transporte (rodoviário, ferroviário, hidroviário e aeroviário) e industrial (cimento, ferro-gusa e aço, Ferroligas, mineração e pelotização, não-ferrosos e outros da metalurgia, química, alimentos e bebidas, têxtil, papel e celulose, cerâmica e outros).

Em segundo lugar, é importante lembrar que para que as fontes de energia sejam utilizadas nos equipamentos hoje disponíveis é preciso adequá-las ao uso nestes equipamentos. Assim, não dá para pegar o petróleo e jogá-lo diretamente no motor. É necessário transformar esse petróleo em gasolina para que ele possa ser utilizado nos carros. Essa transformação define dois outros conceitos: energia primária e energia secundária. A primeira é a energia como ela é extraída da natureza e a segunda é aquela que sofreu algum tipo de transformação nos chamados centros de transformação: refinarias, centrais elétricas, destilarias de álcool, etc., para adequá-la ao uso.

A partir desses conceitos é possível definir mais um conceito: o rendimento na transformação. rendimento esse que varia em função do tipo de transformação, das fontes transformadas e da tecnologia empregada. Diferentemente do rendimento de utilização, o rendimento de transformação é explicitado pelo BEN.

No BEN, as fontes primárias são as seguintes: Petróleo, Gás Natural, Carvão Vapor, Carvão Metalúrgico, Urânio (U3o8), Energia Hidráulica, Lenha e Produtos da Cana (Melaço, Caldo-de-Cana e Bagaço) e outras fontes primárias (Resíduos Vegetais e Industriais para Geração de Vapor, Calor, energia solar, eólica e Outros).

Já as fontes secundárias são as seguintes: Óleo Diesel, Óleo Combustível, Gasolina (Automotiva e de Aviação), GLP, Nafta, Querosene (Iluminante e de Aviação), Gás (de Cidade e de Coqueria), Coque de Carvão Mineral, Urânio Contido no UO2 dos Elementos Combustíveis, Eletricidade, Carvão Vegetal, Álcool Etílico, (Anidro e Hidratado) e Outras Secundárias de Petróleo (Gás de Refinaria, Coque e Outros). Além disso, são consideradas como fontes secundárias os Derivados de Petróleo que, mesmo tendo significativo conteúdo energético, são utilizados para outros fins (Graxas, Lubrificantes, Parafinas, Asfaltos, Solventes e Outros) e o Alcatrão obtido na transformação do Carvão Metalúrgico em Coque.

No que diz respeito aos centros de transformação, o BEN considera os seguintes: Refinarias de Petróleo, Plantas de Gás Natural, Usinas de Gaseificação, Coquerias, Ciclo do Combustível Nuclear, Centrais Elétricas de Serviço Público e Autoprodutoras, Carvoarias e Destilarias. Além desses centros são consideradas outras transformações que incluem os efluentes (produtos energéticos) produzidos pela indústria química, quando do processamento da Nafta e outros produtos Não-Energéticos de Petróleo.

Em terceiro lugar, cabe lembrar que para que as energias primárias possam ser utilizadas diretamente ou transformadas, é preciso extrair o petróleo, o gás, o carvão e o urânio do subsolo, armazenar a água em grandes reservatórios, plantar e abater as árvores e a cana, enfim dar as condições mínimas para que a energia contida nos recursos energéticos – renováveis e não renováveis – seja direcionada para a transformação ou, em alguns casos, para a utilização final. Essas atividades constituem a produção de energia primária e são explicitadas pelo BEN.

Em função disso, quando se fala em produção de energia no Balanço Energético, está se falando nessa produção de energia primária. A “produção” de energia secundária (por exemplo, produção de gasolina na refinaria) não é considerada como sendo produção de energia, mas como uma saída do processo de transformação; portanto, encontra-se em outro ponto do fluxo de energia – transformação – que não é a produção de energia. Nesta última são contabilizadas apenas a produção de energia primária.

Na produção tem-se, de um lado, os recursos naturais, de outro, a energia primária. Nesse nível da cadeia energética é possível identificar mais um rendimento: o rendimento na produção. Rendimento esse que varia com o tipo de extração, com a fonte e com as tecnologias empregadas. Esse rendimento não é explicitado pelo BEN. Para uma descrição mais detalhada dos recursos, das reservas e dos potencias energéticos é preciso um balanço chamado de balanço de recursos e reservas. O BEN começa a descrição dos fluxos energéticos na produção, portanto não incorpora no quadro contábil os recursos e os potenciais energéticos do país. Contudo, assim como as informações sobre o uso da energia, esses dados se encontram em uma seção à parte, na própria publicação, que disponibiliza exatamente essas informações.

O texto continua no Blog Infopetro.

Ronaldo Bicalho

Pesquisador na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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