Rui Daher
Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor
[email protected]

Crime, fome e consciência política, por Rui Daher

Trabalhadores rurais

Crime, fome e consciência política

por Rui Daher 

(para o GGN)

No período ditatorial, entre 1964 e 1985, o processo de abertura para a democracia foi chamado de lento e gradual. Assim foi. No golpe de 2016, não. Embora em planos diferentes, o processo é rápido e em progressão geométrica. De ampliação de covas rasas.

Acabar com o sistema atual de aposentadoria dos trabalhadores rurais assalariados é ato criminoso. Mesmo com o alto índice de informalidade no campo (60%), o governo usurpador se preocupa com pobres caboclos, campesinos e sertanejos, fazendo-os contribuir na mesma forma dos assalariados urbanos.

Vocês conhecem aposentados rurais? Sempre parecerão ter o dobro de suas idades reais, que será o triplo da dupla Doriana & Luboquita. É a lida no campo, debaixo de chuva ou sol, trabalho mãos na terra e nas enxadas, roupas maltratadas, meus senhores. E quem irá impedir que isso aconteça? A bancada ruralista?

https://www.youtube.com/watch?v=EGyb11knYYo]

(em CartaCapital)

Em artigo recente, o diretor-geral da ONU para Agricultura e Alimentação, o brasileiro José Graziano da Silva, diz que “a forma mais eficaz de combater a fome é o consenso político para enfrenta-la”. Se assim for, no Brasil de hoje em dia, viveremos na fome.

Quem irá duvidar? O Brasil é uma prova viva do que diz o diretor da FAO. Inteligentes que são, tenho certeza que leitores e leitoras pensaram nos 13 milhões de desempregados? Ou nos 45 milhões da população ainda abaixo da linha de pobreza? Talvez, nos caboclos, campesinos e sertanejos sem apoio de um ministério como o Desenvolvimento Agrário?

Não? Então já sei, lembraram-se dos assentados, comunidades indígenas e quilombolas. Não, também?

Deixe-me ver. Consenso político. Bem, no momento, difícil contar com isso. Gestado há pelo menos uma década, em abril de 2016, um golpe de Estado, de responsabilidade congressual, judiciária e midiática ceifou a democracia brasileira.

Curiosamente, na sequência, a política foi rolando com pequenos golpes, filhotes do maior, mas com os mesmos atores. Eles têm sido vorazes em destruir conquistas passadas. Desde aquelas criadas por políticas econômicas nacional-desenvolvimentistas até os patrimônios especiais e soberanias conquistados após os períodos de Getúlio, Juscelino e dos governos militares.

Não apenas a voracidade me surpreende, mas a rapidez. Decisões que demoraram décadas para amadurecer, algumas até com participação popular, sistemas e aparelhos sociais, são decapitados num estalar de dedos. De um dia para o outro e sem contestação da velha mídia.

Falam em reformas, o que me faz pensar ter vindo daí a péssima ideia de se cogitar o nome de Luciano Huck para concorrer à Presidência da República, em 2018. Afinal, no seu programa global não havia (ainda há?) um quadro em que ele reformava a casa de uma família pobre?

Se Graziano acha que “a melhor vitamina contra a fome” está no consenso político de enfrenta-la, sugiro que envie um e-mail para as seguintes pessoas: Ciro Gomes, Geraldo Alckmin, Henrique Meirelles, Jair Bolsonaro, João Dória Júnior, Joaquim Barbosa, Luiz Inácio Lula da SilvaManuela D’Ávila e Marina Silva, com os seguintes dizeres:

“Prezados senhores, senhoras, senhoritas, sei lá,

Como vocês (perdoem-me a indevida intimidade) sabem, dirijo uma organização mundial que trata de agricultura, que vira alimentos, que matam a fome. Creio já o terem percebido em suas casas ou naquelas de repasto. Se o termo os fez lembrarem olhares bovinos, foi justamente essa a intenção.

Alguns de vocês, sei, já passaram fome. Não importa se por miséria ou vontade de emagrecer. De qualquer jeito, é uma coisa chata, mas o primeiro é mais tenebroso.

“A fome responde por metade de todas as mortes de crianças até cinco anos de idade no planeta”. Países muito mais ricos e desenvolvidos que o Brasil, como Reino Unido, Estados Unidos e Canadá, mantêm uma rede de banco de alimentos. Segurança alimentar, o que aqui apelidaram assistencialismo, arriscado de ser eliminada por um tal de ajuste fiscal.

Taí, Doutor Meirelles, “eu fiz tudo pra você gostar de mim”, mas seu fiscal não vê que um terço dos alimentos são desperdiçados País afora e prefere privilegiar um rentismo não alimentar. Neste sentido, você e os demais são criminosos, inclusive por se empanturrarem nos restaurantes de luxo de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. 

O Programa Bolsa Família, também vilipendiado, foi introduzido na Malásia, Malawi, Moçambique, Niger e Senegal.

Tentem conversar, criar um consenso, nem que seja jogando dominó lá no Botequim do Serafim, agora com novo endereço: céu ou inferno. Escolham e boas eleições”.

Nota: como em todos os anos, em dezembro blog e coluna fazem um mês sabático. Se deixarem ou implorarem, volto no início de janeiro com as previsões para 2018. Em linguagem teatral, Boas Merdas!

[video:https://www.youtube.com/watch?v=dqIv2D7LXWs

 

Rui Daher

Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor

4 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. piorou mas melhorou

    Pois é, seu Rui.

    E nós estávamos indo tão bem! Acho que a culpa de ter piorado foi desse tal de golpe. Era de se esperar, depois daquele povo inteligente espancar suas panelas. Tanto bateram que conseguiram. Agora não dão mais dinheiro para alimentar vagabundos. Melhorou muito. Passaram a ver seu rico dinheirinho ser bem empregado pelos MeiReles, Gedéis e Tremes da vida. Malas e apartamentos cheinhos dele. Afinal os pobres tem que perder a mania de comer!

    Pelo menas’ a kurrupissaum acabou. Ninguém aguentava mais aquelas roubalheiras de Petrobrás e de pré sal. Tanto mandaram que parece que os kurruptos foram todos para Cuba.  

  2. Prezado Rui
    Já que tu estará

    Prezado Rui

    Já que tu estará em mês sabatico, sugiro que assista o filme,  O Capital de Costa Gravas, disponivel no Youtube gratuitamente.

    Lhe marcará a famosa frase do banqueiro Marc Tourniell numa reunião de acionistas – minha função é roubar dos pobres,  para dar aos ricos, para à alegria de todos no famigerado recinto !!!

    É isso que estamos vendo no Brasil atualmente, e com tristeza sabemos que o fascinora Meireles é indicação de Lula a dupla Dilma / Temer.

    Abaixo o link para o filme (completo).

    https://www.youtube.com/watch?v=mFNpTVlN938&t=321s

    Bom descanço e até janeiro

    Bom deT

    Marc Tourneil ourneil Marc Tourneil

  3. Consciência poitica…

    Sem que essas pessoas se levantem e lutem não ha muito o que possamos fazer. Podemos lutar ao lado delas, mas não sozinhos.

  4. Convidados para o seu botequim

    Pessoas que fazem muita falta.

    Professor Nicolau Sevcenko, um luminar que se foi muito cedo e cuja inteligência e engajamento em favor da democracia e

    da igualdade são exemplo e inspiração. Imagino o que estaria fazendo e falando se estivesse entre nós em momento

    inimaginável de retrocesso nauseante e vertiginoso como você descreve. 

    Reproduzo 2 vídeos de sua participação no programa Provocações do também saudoso Antonio Abujamra.

    E o documentário “Zumbi somos nós”, em que o professor também participou com sua característica marcante de

    conhecimento sólido e reflexão crítica  a serviço do humanismo. Este documentário trata de assuntos candentes e parece

    que feito hoje, em especial sobre racismo e movimentos sociais de moradia e cidadania. 

    Saudades e orgulho do que este país produz de conhecimento, de inconformismo com a desumanização, de opção pela

    coragem em lutar por ideais nobres. 

    Boas festas e não desista de pregar no deserto. Flores nascerão. 

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=CxFaHUusv5g%5D

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=_Jcsf3FTZ0M%5D

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=mp0NjShqoA%5D

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?v=jVHmoqHciD8%5D

     

    SP, 07/12/2017 – 19:34

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador