Editor-chefe da Carta Capital defende fundo de financiamento público para a mídia brasileira

 

Por Rafael Duarte, da agência Saiba Mais

A revista Carta Capital celebra 25 anos em 2019 e, ao longo deste período, se transformou no veículo progressista mais importante da mídia impressa no Brasil pós-redemocratização. O início, em 1994, coincide com os primeiros passos da internet no país. A Carta Capital acompanhou as mudanças da imprensa e segue de pé, nas plataformas imprensa e online.

Nos últimos três anos, a revista vem enfrentando o boicote do poder público, a partir do golpe de 2016 que derrubou a ex-presidenta da República Dilma Rousseff, e também dos anunciantes da iniciativa privada, que cortaram do dia para a noite o financiamento da revista para não “melindrar” os presidentes que vieram na sequência, a exemplo de Michel Temer e Jair Bolsonaro.

Editor-chefe da Carta Capital, o jornalista Sérgio Lírio participou nesta sexta-feira (29) da abertura do seminário “Os desafios da comunicação nas administrações públicas”, que acontece até sábado (30), em Salvador (BA).

Antes da mesa em que falou sobre “Como se comunicar com a sociedade”, ao lado das jornalistas Geórgia Pinheiro (editora do site Conversa Afiada) e Cynara Menezes (editora do blog Socialista Morena), Sérgio Lírio concedeu entrevista ao portal da agência Saiba Mais / Barão de Itararé.

O jornalista falou sobre formas de financiamento, os desafios da mídia progressista, a nova fase da revista Carta Capital e a importância da defesa da liberdade de expressão e de imprensa em meio aos ataques de um governo de extrema-direita no Brasil.

Confira a entrevista:

 

Saiba Mais – Que caminhos a mídia progressista precisa seguir para sobreviver em tempos de golpe e de ataque à democracia ?

Sérgio Lírio – O problema do financiamento não é apenas dos meios

progressistas, mas um modelo de negócio que faliu, acabou. Se chegou a uma formula que você tinha leitores, assinantes, telespectadores que compravam um produto… e pelas empresas especializadas você tinha um número, batia na porta dos anunciantes e conseguia receita, vinda dos leitores que compravam o produto e dos próprios anunciantes. Isso em qualquer parte do mundo. Em São Paulo ou em Osaka, no Japão, era um modelo geral de sustentação desse negócio. Isso está se perdendo porque você tem uma mudança no hábito do consumo de informação, de entretenimento. Entraram modelos para competir nesse jogo que são infinitamente mais poderosos, que são o Facebook e o Google. Se pensar de forma geral, a receita que antes iam para os meios de comunicação foram parar nessas redes sociais. Isso é um problema grave, afetou a forma de produção. Então os veículos, sejam eles progressistas ou não, tem o caminho que é o de convencer que o jornalismo é importante para a democracia nas relações humanas e sociais. E que é preciso financiar isso, pagar pela notícia.

 O que você sugere ?

Uma forma mais provável, há uma discussão no mundo inteiro, é algum tipo de financiamento, um fundo público de financiamento dos meios de comunicação. Uma verba que seria distribuída de forma mais equânime, mais igualitária para você ter mais diversidade de opinião.

Verba federal ?

Federal, estadual, municipal… teria que ter uma discussão geral de como financiar. Não é mais possível depender só de (alguns) mecenas. O que vejo em termo de possibilidade é prestar um serviço relevante, recuperar o sentido público da função pública do jornalismo e convencer o público de que é preciso financiar. Hoje os modelos que mais se sustentam na internet, com muito mais dificuldade que no passado, são os modelos de assinatura. As pessoas estão percebendo com a chegada desses governos de ultradireita, xenófobos, as máquinas de fake news, que é importante recuperar esses valores básicos, levar ao indivíduo a verdade possível, mediada. Eu só vejo esse caminho. Primeiro, fazer um bom trabalho, bem fundamentado e, segundo, a partir dele convencer o leitor que notícia de graça não existe, que notícia de graça sempre vai pender para a mentira.

Há algum modelo semelhante em outros países que se assemelham a essa sua sugestão ?

Há uma discussão mundial. Nos EUA menos porque sempre foi uma coisa muito ligada aos mecenas. E não é o melhor modelo ficar refém de um ou dois patrocinadores. Você tem alguns grandes dessa mídia nova comprando jornais, como o fundador do IBAI que comprou o Washington post. Mas a França tem um modelo que poderia ser replicado.

Como funciona ?

Quanto maior for o veiculo de comunicação, menos verba pública ele recebe. Há na legislação francesa um mecanismo para a apoiar a pluralidade, uma distribuição de renda para buscar a diversidade. Não é só ter meios de comunicação com força para fiscalizar o poder, mas ter meios de comunicação que expressem pontos de vista diferentes da sociedade, que é o grande problema do Brasil. Aqui não chega a ser um monopólio, mas é um oligopólio que tem uma grande empresa (Rede Globo) que dita o jogo com sua receita desproporcional. E você tem outras três ou quatro grupos no Brasil que são satélites da Globo e são os grandes distribuidores de informação. Pensando regionalmente, as principais TVs são canais ligados à Globo e geralmente ligados a algum interesse político. É assim no Rio Grande do Norte e em vários outros Estados do Nordeste, do Sudeste, quer dizer, políticos donos de meios de comunicação ligados à Rede Globo, é assim que se constitui um poder. E veja que na maioria dos jornais, a grande parte do conteúdo é suprida por duas ou três agências do centro sul, com a presença de colunistas do Estadão, da Folha, do Globo… então os jornais regionais acabam reproduzindo a visão de mundo concentrada em São Paulo.

 Leia a entrevista completa no portal da agência Saiba Mais 

Redação

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