Arruaça policial, por Janio de Freitas

Por Rocco

Da Folha

Arruaça policial

Janio de Freitas

Estupidez é palavra de diferentes sentidos. A polícia paulista quer adotar todos para caracterizar seu fracassado papel contra os protestos que perturbam o centro paulistano.

Depois da estupidez dos tiros de balas de borracha e das bombas de gás lançadas a esmo contra os manifestantes, em enorme quantidade, vem o indiciamento por formação de quadrilha de dez detidos na terça-feira. Uma polícia que não distingue entre os que se valem de um momento caótico para fazer baderna, mesmo com vandalismo, e os que se organizam com a finalidade de ganhar pelo crime, não pode se impor nem a arruaceiros.

É inacreditável que as polícias, não só as nossas, jamais pensem em ações mais simples diante de manifestações coletivas. Ou, ao menos, desprovidas de violência. Com a quantidade de policiais, carros e motos postos no centro de São Paulo terça-feira, é incrível que à PM não tenha ocorrido alguma coisa como um cerco à manifestação em determinadas quadras. Para depois estreitar o aperto, fora das ruas necessárias ao trânsito intenso. Em vez da tentativa de desmontar a manifestação a poder de gás e balas de borracha.

Aqui ou fora, as manifestações são sempre as mesmas, com dificuldade de variação maior. E as polícias são sempre as mesmas na estupidez inútil da sua violência armada e da irracionalidade. Logo, os oportunistas estarão sempre prontos, entre os manifestantes, para entrar em ação. E quem lhes dá a oportunidade é sempre a polícia. As bombas de gás, os tiros, os cassetetes incitam as respostas desafiadoras: é a hora dos arruaceiros.

LER E SABER

O afastamento da vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat, por Roberto Gurgel, procurador-geral, ressalta a grandeza da discordância por ela exposta quando defendeu, no Supremo, a soberania de cada um dos Poderes. Gurgel dera parecer aceitando a interferência do Supremo no Congresso, ocorrida por liminar de Gilmar Mendes que sustou a meio a tramitação de um projeto.

A atitude de Gurgel coincidiu com outro parecer importante de Deborah Duprat, contrário ao atual direito de veto à produção literária e à circulação de biografias não autorizadas pelo biografado, ou até por parentes seus. É a combinação de censura prévia e de cassação por censura posterior.

Aos argumentos jurídicos contra tal direito, que não cabe lembrar aqui, junto uma comparação a meu ver bastante ilustrativa. A edição de uma biografia normal é, em geral, de 3.000 livros, chegando uma biografia de grande sucesso a algumas dezenas de milhares. É essa a dimensão do que o veto rejeita, em nome da proteção aos direitos individuais de privacidade e aos de descendência.

Se a publicação do indesejado pelo personagem, ou por parente seu, sair sem prévia autorização em um jornal com 300 mil exemplares ou revista com mais centenas de milhares de exemplares, a divulgação não será impedida. E o biografado, ou parente seu, poderá entrar com ação judicial em busca da indenização a que se julgue com direito.

É assim, no caso de jornais e revistas, porque o Estado de Direito democrático não comporta o veto antecipado ao que o cidadão tem o direito de ler e saber. Mas, no Brasil, o livro pode ser uma negação do Estado de Direito.

ESTARREÇA-SE

O aspecto não é atraente, já pelo título hermético: “Cypherpunks – Julian Assange”. Mas não se precipite. Esse livro à venda no Brasil tem grande atualidade quando o mundo se estarrece com a infiltração informática do sistema de segurança na vida privada dos americanos. São diálogos de Assange, o cabeça da WikiLeaks, sobre “a liberdade e o futuro da internet”. Nas palavras de Pablo Ortellado, Assange, a rigor, não faz “um alerta para o futuro, é um alerta para o presente”. A CIA e a NSA (outro monstro da espionagem americana) confirmam. E o livro estarrece mais os já estarrecidos.

Janio de Freitas, colunista e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa com perspicácia e ousadia as questões políticas e econômicas. Escreve na versão impressa do caderno “Poder” aos domingos, terças e quintas-feiras.
Luis Nassif

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