Sobre trânsito e cidadania

(Comentário ao post Os fatores das mortes nas estradas)

Eu acredito que a solução do problema passa necessariamente pela mudança de atitude dos cidadãos motoristas. Ter a consciência que o carro pode ser uma arma, entender os riscos e a responsabilidade como cidadão na condução de um veículo, saber de seus direitos e deveres, tudo isso não pode ser visto como utopia. O país tem que crescer em todos os aspectos, e não somente no econômico. Acredito que uma mudança na forma do brasileiro lidar com o trânsito influenciaria inclusive outros setores da sociedade.

Inovações tecnológicas podem trazem mais segurança sim, mais são inócuas enquanto houver abusos e irresponsabilidade dos motoristas. Não há airbag que salve um motorista que colida em alta velocidade, ou um controle de tração que evite que um carro capote quando há irresponsabilidade na forma de conduzir o veículo. Estas inovações podem inclusive agir de forma contrária para motoristas irresponsáveis, que podem achar que podem abusar da máquina. Para motoristas responsáveis, as inovações aumentam bastante a segurança.

Sobre trânsito e cidadania escrevi um texto onde relato as minhas observações sobre o trânsito de sp, na ótica de um pedestre e ciclista, e faço uma reflexão sobre como o trânsito poderia ser a base para uma transformação do cidadão brasileiro.

Do Blog de lmstefanini no Brasilianas.org

Trânsito e Cidadania

Faz um ano que comecei a fazer os meus deslocamentos pela cidade de São Paulo através de transporte público e aqueles ditos “alternativos”, no caso a bicicleta. Desde então eu posso afirmar, houve sim uma transformação em minha vida, seja na forma de pensar a cidade, como enxergar o trânsito, e por consequência os motoristas, nem tão cidadãos.

No primeiro caso a transformação se deu de uma forma já muito relatada por quem trilhou caminhos semelhantes. Passa-se a ter uma maior proximidade com a cidade e com os cidadãos. Visualiza-se as passagens, vias e calçadas como espaços comuns, espaços públicos e de todos. Por consequência encontros foram propiciados, e lugares e pessoas descobertas.

A segunda transformação, nem tão positiva, mas muito didática, foi conseguir visualizar de uma forma mais distante e abrangente a violência e a catástrofe que é o trânsito brasileiro, seja nas relações entre os motoristas, como nas suas redes de impunidade e corrupção. Neste artigo descrevo um pouco esta observação, e tento colocar uma luz no final, ou uma alternativa para amenizar problemas.

Uma das primeiras motivações em deixar o carro foi sem dúvida me distanciar de uma rede de insegurança, gastos e corrupção que já visualizava em tudo que envolvia o automóvel. Começava com um processo suspeito de tirar a habilitação, onde quem faz o que a cartilha recomenda tem mais dificuldades de passar. Depois um licenciamento cheio de amarras, burocracias e jeitinhos. Ao tirar o carro, ganhava uma conta de seguro pornográfica. Se o carro quebrasse ou batesse, o que não é raro, tinha que ouvir indicações de lugares mais baratos, que claro, eram os mesmo que alimentavam aquele seguro pornô, que eu nem mesmo desfrutava. Assim resolvi dizer um basta. Outras motivações foram econômicas (sim eu fiz uma planilha, gosto um pouco de economia, e o gasto com o carro é realmente muito alto), a perda de tempo no trânsito e o stress e a violência presentes nele. E quanto a este último, posso afirmar, foi aonde eu tive as maiores e piores descobertas.

O povo brasileiro é violento. Eu não consigo amenizar esta frase quando leio os números de mortes, ou quando vejo cenas de brigas em plena luz do dia no trânsito. Visualizei diversas delas, violentas, que eu até hoje não entendi porque começaram. Carros trazem uma noção de poder, há uma guerra de quem pode mais para dominar o espaço público, e coitado dos pedestres e ciclistas. Já visitei outros países, não afirmo que é o trânsito que gera violência, pois não vi reações proporcionais em agressividade e quantidade a que vejo aqui. Argumenta-se que a impunidade e a corrupção geram esta situação, concordo, mas não teria a capacidade de discutir profundamente isto aqui neste texto. O que quero colocar aqui é; a educação e a cidadania no trânsito podem ser base da transformação do cidadão brasileiro.

O trânsito, é um lugar público, lugar de passagem, lugar de convívio, e arrisco que é aonde a grande maioria do brasileiros está exposta. É o lugar onde convivem todas as classes sociais. É o lugar onde convivem autoridades e cidadãos. É um lugar onde são necessárias relativamente poucas leis para ser regulamentado. É o lugar onde o poder público tem a oportunidade de aplicar as mais modernas políticas públicas, e da forma mais eficaz na conscientização da população de seus direitos e deveres como cidadãos. A transformação do trânsito, trazendo a tona o conceito de cidadania para os brasileiros seria o começo de uma transformação, e com grande potencial de “contaminar” todo o seu entorno.

Imaginem então, daqui há alguns anos um carro de alguns milhares de dólares parando para um senhor ou um mendigo passar. Ou um ladrão de carros sabendo que não poderia mais se infiltrar no trânsito caótico e violento, que seria facilmente identificado. Sim, podemos.

Publicado no blog oinsustentavel 

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