Processo Condor: Pesquisadores e juristas debatem condenação de torturadores à prisão perpétua

Encontro reuniu advogados, procuradores, ativistas e pesquisadores ligados ao caso; debate foi moderado pelo presidente da Associação 24 de Março

Encontro reuniu advogados, procuradores, ativistas e pesquisadores ligados ao caso – Janaina Cesar/Opera Mundi

do Ópera Mundi

Processo Condor: Pesquisadores e juristas debatem condenação de torturadores à prisão perpétua

por Janaina Cesar
Roma (Itália)

A Associação 24 de Março organizou um evento para debater o Processo Condor e analisar as motivações que levaram a Corte romana a condenar à prisão perpétua, na Itália, 24 torturadores de ditaduras do cone sul ligados ao processo.

O evento aconteceu na última sexta-feira (07/02) na Universidade Roma 3 e reuniu pessoas ligadas ao caso como advogados de defesa, procuradores, ativistas e pesquisadores. O debate foi moderado por Jorge Ithurburu, presidente da Associação 24 de Março. Ithurburu está por trás dos Processos Condor, a associação ajudou familiares de vítimas a fazer a denúncia na justiça italiana.

A sentença emitida em 8 de julho de 2019 reverteu a da primeira instância e condenou a cúpula e o segundo escalão pelo homicídio doloso com múltiplos agravantes de 25 italianos na chamada Operação Condor. De fato, o documento estabeleceu as responsabilidades dos militares pois estes não agiram apenas para respeitar as ordens de seus superiores, eles eram cúmplices dos crimes perpetrados.

A Condor foi uma rede de colaboração dos anos 1970 e 1980 entre Chile, Uruguai, Argentina, Peru, Bolívia, Paraguai e Brasil, que permitia a troca de informações e prisioneiros e tinha como objetivo aniquilar dissidentes políticos, sem qualquer hesitação.

A Corte tomou tempo para escrever as motivações. O documento que foi entregue e publicado no final de janeiro deste ano, deveria estar pronto desde outubro de 2019. Em 120 páginas de memória, história e embasamento jurídico, o tribunal reconheceu a existência da Operação Condor e as violações sistemáticas de direitos humanos atrelados à ela.

“Eduardo Galeano dizia que via a América do sul como um lugar símbolo da impunidade”, disse Franco Ippolito, presidente da Fundação Basso, ao abrir o evento e chamar para falar o ex procurador da república Giancarlo Capaldo, responsável pelo caso na primeira instância. “Eu era o procurador substituto. Como faria para encontrar provas de fatos ocorridos 20 anos atrás? Muitas pessoas me ajudaram a adquiri-las”, disse ele nominando algumas, como a arquivista italiana Giulia Barrera, por exemplo.

Obviamente surgiram problemas durante os quinze anos de investigação e mais outros tantos de processo, “pois um processo a história necessita de uma cultura muito avançada e nós ainda não chegamos lá”, declarou. Para ele, a sentença reafirma a força de um direito, da justiça que vai além da normativa. “Desejei por muitos anos o reconhecimento desse caso feito sem clamor. Nenhum ditador ou alguém que comete crime contra a humanidade pode estar tranquilo. Sempre existirá um juiz para condená-lo.”

Arturo Salerni, um dos advogados de parte civil, rechaçou a fala de Capaldo e lembrou as quantidade de histórias e pessoas que foram ouvidas. “Quantas histórias fizemos reviver? De Juan Josè Montiglio que ficou ao lado de Salvador Allende até a morte, por exemplo. Nesse processo, reconstruímos, depois de 40 anos, a história da Condor. A justiça diz que diante de crimes contra a humanidade certos crimes são imprescritíveis. A primeira sentença foi importantíssima”, afirmou.

Já Luca Ventrella, advogado do Estado, ressaltou o lado negativo da sentença de primeiro grau. “Faltou coragem jurídica para condenar os acusados. Os documentos, as provas, as testemunhas, estava tudo lá. Não se entendia porque absolveram os intermediários, os do segundo escalão, pois eles tinham autonomia de decisão”, disse o representante da AGU italiana. Ventrella fez uma comparação ao processo de massacre nazista onde também atuou: “naquele caso qualquer um que tivesse tido função de comando foi condenado”, disse.

Alessia Liistro, uma das advogadas da parte civil, a última a falar, disse que estar ali significava concluir um trabalho. “Nessa sentença,  cada um de nós, advogados, encontrou um pedacinho da própria defesa”, disse. Para Liistro, o trabalho da Corte de apelação foi facilitado com as novas provas apresentadas durante o julgamento pelo advogado Andrea Speranzoni. Mas, como Ventrela, apontou o fato de a Corte de apelação ter se surpreendido “porque tinham sentenças estrangeiras e documentos que na primeira sessão não foram analisados”.

O Processo Condor contou com muitos advogados de defesa da parte civil. Liistro e Salerni atuaram ao lado de Andrea Speranzoni, Alicia Mejía, Giancarlo Maniga, e Marcello Gentili, que veio a falecer dia 7 deste mês.

Redação

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