“Redução da maioridade é ineficiente no combate ao crime”

Reduzir a maioridade penal hoje com base no “populismo” não resultará na queda dos índices de crimes violentos cometidos por menores de 18 anos no Brasil, analisa a doutora em sociologia pela USP, pesquisadora da UNESP e coordenadora-adjunta do Núcleo de Pesquisa do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), Alessandra Teixeira.

A especialista baseia parte de seus argumentos em dados fornecidos pela própria Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (Fundação CASA), do Estado de São Paulo. Dos 9.016 adolescentes detidos até 5 de abril, apenas 82, o equivalente a 0,9% do total, praticaram o latrocínio, que é a pratica do roubo seguido de morte. Já 41,8% estão cumprindo penas socioeducativas por tráfico de drogas e 39% por roubo qualificado, quando as vítimas acabam sofrendo algum tipo de lesão corporal.
 
A redução da maioridade penal voltou ao debate nos principais meios de comunicação após a morte do estudante de comunicação, Victor Hugo Deppman, de 19 anos, na porta da residência durante assalto praticado por um adolescente de 17. O agressor estava prestes a completar 18 anos, mas como no momento do crime era menor de idade cumprirá pena socioeducativa de até três anos na Fundação Casa.
 
O incidente deu respaldo para o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB-SP), levar ao Congresso Nacional um projeto de lei que prevê punições mais rígidas para menores de 18 anos. A proposta, assinada pelo deputado federal Carlos Sampaio (PSDB-SP), amplia a pena máxima de três para oito anos em casos de reincidência e prática de crimes hediondos, como assassinato e tráfico de drogas. O PL também aumenta a punição para adultos que aliciarem menores de idade a cometerem crimes.
 
Em sua proposta, Sampaio (clique aqui) toma o cuidado de  não alterar a maioridade penal, mas apresenta alterações que tornam mais rígidas três leis, uma do Código Penal, outra do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a última do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase).
 
Para Alessandra a PL atenderia, em princípio, a comoção popular que ressurgiu após a morte do estudante Victor Hugo Deppman, entretanto essa seria a saída menos racional em se tratando de segurança pública.
 
“As políticas de segurança funcionam, efetivamente, quando são praticadas em articulação com outras políticas. Não podemos nos esquecer, por exemplo, que existem problemas imensos e históricos relacionados à educação pública”, pondera.
 
A pesquisadora destaca, ainda, que a redução da maioridade penal só faria sentido se o país tivesse detenções capazes de recuperar pessoas e não o contrário. “A realidade do nosso sistema prisional é de um centro produtor de criminalidade organizada. Portanto, colocar indivíduos cada vez mais jovens nas cadeias consolidará os laços desses jovens com o crime”, sustenta.
 
Alessandra afirma que não existe vontade política para reduzir a criminalidade de jovens nos centros urbanos, e questiona a falta de ações que ataquem os mercados receptores de mercadorias roubadas, como as feiras “do rolo”, comuns nas periferias. “Existe toda uma economia em torno disso, tanto para o crime patrimonial quanto para o tráfico. E a pergunto é, primeiro, por que esses mercados não são desmontados por uma polícia civil investigativa?”.
 
As medidas de “populismo penal”, ressalta a pesquisadora, não são fenômenos exclusivos do Brasil e costumam ocorrer da mesma forma em outros países: após um acontecimento trágico de comoção popular. “Então, em vez de pensarem, racionalmente, em estratégias políticas, que nem sempre são as mais fáceis de realizar, os governantes propõe medidas legais mais gravosas, como resposta imediata à população”, completa.
 
Não existem estudos, no mundo, comprovando que a redução da maioridade penal traz impactos profundos e de longa duração sobre o volume de crimes praticados por jovens e adolescentes. Ainda assim, hoje, trinta propostas de emenda à constituição sobre redução da maioridade penal de jovens aguardam avaliação na Câmara dos Deputados e outras dez no Senado. A primeira PEC, de 1993, feita pelo então deputado Benedito Domingos (PP-DF), propõe para 16 anos a idade de imputabilidade penal.
 
Apenas 661 jovens detidos nas instituições da Fundação Casa, de São Paulo, têm entre 12 e 14 anos. A maioria, 6.614, possui entre 15 e 17 anos, e 1.740 adolescentes estão com 18 anos ou mais.  O índice de adolescentes que voltam a cumprir pena na instituição é de 13,5%. Proporção bem menor do que a registrada em 2006, na antiga Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (Febem), de 29%.
Redação

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