Retrospectiva invisível, por Maurício Pestana

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Por Maurício Pestana* 

Via Guest Post para o Portal Geledés 

Foram 396 mortes por intervenção policial em São Paulo no ano de 2014. A maioria das vitimas era jovem, negra e do sexo masculino. Quase um terço tinha entre 13 e 17 anos. De todas as mortes registradas, 300 ocorreram na periferia e apenas 3,5% nos dez distritos mais ricos da capital. Estes dados, fornecidos pelo Departamento de Inteligência da Polícia Civil de São Paulo (Dipol), foram cruzados com informações do PRO-AIM (Programa de Aprimoramento das Informações de Mortalidade) e analisados pela Agência Pública. E os índices, apesar de assustadores, infelizmente não surpreendem.

Recentemente, outro caso chamou atenção nos noticiários: cinco jovens negros foram brutalmente assassinados por policiais em Costa Barros, no Rio de Janeiro, enquanto voltavam de uma festa dentro de um carro. Episódios como estes não são tragédias isoladas. Nascer preto e pobre no Brasil é um precedente para ser tratado como suspeito e confundido com bandido, invertendo a máxima de ser inocente até que se prove o contrário. Ou seja, já faz parte da abordagem “padrão” ao negro ser prejulgado e humilhado antes de qualquer averiguação.

O sistema, que supostamente deveria proteger a todos, é balizado pelas relações de desigualdades que permeiam a nossa sociedade. Parece haver uma certa apatia do Estado e conivência da opinião pública quando as vítimas não são brancas ou moradoras de áreas nobres da cidade. É como se a injustiça e a crueldade fossem minimizadas por tratar-se de um enredo corriqueiro, tornando as mortes brutais de tantos jovens negros em apenas mais um número para a estatística.

As retrospectivas comuns nesse período abordarão os acontecimentos mais marcantes do ano, como o lamaçal que encobriu uma cidade em Minas e foi uma das maiores catástrofes ambientais de nossa história. Falarão também da tragédia parisiense, do estado islâmico e dos refugiados sírios na Europa e, com certeza, se esquecerão de uma das maiores tragédias brasileiras, que é morte de jovens negros e pobres da periferia. Uma tragédia assustadoramente silenciosa.

*Secretário Municipal de Promoção da Igualdade Racial (SP)

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

11 Comentários

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  1. esse tipo de barbárie

    esse tipo de barbárie  denunciada nesse post

    é o espelho embaçado do racismo impune

    e da desigualdade social brasileira…

  2. Eles segregam tanto a figura

    Eles segregam tanto a figura do negro e pobre na mídia, que os negros e pobres acabam por ficarem estigmatizados. Entendo que os donos de jornais estigmatizem os pobres, negros ou não; afinal, não são para eles as políticas egoistas que defendem. A estigmatização dos negros e pobres pela mída é uma forma deles se protegerem da deseigualdade que estão a criar através dos indicadores cada vez mais degradantes. Quantas vezes vi no Datena uma sensacionalização de casos superfluos e questionáveis. O foco do programa era encontrar por problemas, por minimo que estes fossem, e utilizar destes problemas para banditizar os desfavorecidos. Com uma campanha desta, não há auto-estima que se segure. Há um poder corrosivo por trás desta ideologia da segregação e policiamento que só benefícia aqueles que atemorizam a população com uma sensação de fragilidade, que é exatamente aquilo que sente aqueles que estão cercados pelos muros de suas riquezas diante de uma desigualdade imensa. Podemos entender assim, que a mídia tendenciosa não é um reflexo da população, mas um reflexo daqueles que têm o poder e querem prolongaram este poder a todo custo; mesmo que para isso, tenham que manipular a opinião pública para defender seus interesses e temores diante de uma desigualdade sem igual, que estão a criar para o seu próprio benefício egoista.

  3. Revolução Negra

    Até quando negros e negras, pardos e pardas e suas lideranças vão ficar sem agir, objetiva e efetivamente, para eliminar o racismo e o holocausto de jovens de nossa raça ?

    Os apartheides racial e social, aí incluindo os brancos pobres, não podem prosseguir. Precisam ser extirpados logo, antes que um tsunami social imploda o país, afetando seriamente sua economia e o seu desenvolvimento, prejudicando toda a sociedade brasileira

    Avançamos nos últimos 13 anos, mas este avanço é claramente insuficiente para evitar a explosão social que virá, inevitavelmente.

    O empoderamento do negro e do pardo não vai se realizar através do atual sistema político-eleitoral que privilegia os ricos, os brancos e os homens.

    Também, não poderá surgir em decorrência de manifestações violentas, de ações de guerrilha e similares pois se deslegitimará imediatamente perante a própria opinião pública negra e parda e a opinião pública branca esclarecida, progressista e, obviamente, antiracista.

    O que fazer, então ?

    Recentemente, tivemos em Brasília uma manifestação de mulheres negras e pardas, reunindo 20.000 pessoas, comemorando o Dia da Consciência Negra.

    A imprensa oligárquica televisiva, auditiva, escrita e digital praticamente a ignorou. Mas, foi um passo adiante, não há dúvida.

    Mas, isto não basta e, de novo, é claramente insuficiente.

    Somemte imensas e repetidas manifestações pacíficas de massas, de negros e negras, pardos e pardas conseguirão dar visibilidade e empoderamento políticos a negros e pardos.

    Temos que colocar 2 milhões de negros e negras, pardos e pardas, na Av. Atlântica e descer até o Leblon, passando por Ipanema

    + 1 milhão na av. Paulista

    + 3 milhões no Farol da Barra em Salvador

    + 1 milhão nas pontes do Recife

    + 1 milhão no centro de Belo Horizonte

    + 1 milhão na av. Beira Mar em Fortaleza +++++++ e, assim, por todo o país.

    E tantas vezes quantas forem necessárias.

    A primeira manifestação Alckimin vai tentar impedir, da segunda em diante, Pezão, Alckmin, Rui, Câmara, Pimentel, Camilo, etc vão liberar as catracas dos metrôs e dos ônibus.

    Somos 54% da população brasileira: 108 milhões de habitantes negros e negras, pardos e pardas.

    Não temos toda a fôrça, mas temos um pouco mais da metade dela..

    O racismo no Brasil e o assassinato massivo de jovens negros, pardos e brancos pobres tornaram-se intoleráveis, Filhos, irmãos, tios, primos, pais, amigos são as vítimas diárias do racismo contra negros e negras, pardos e pardas.

    Essa história de preconceito é uma falácia. O racismo é um método de dominação de classe utilizado pelos que detém o poder econômico para manter os negros e negras, pardos e pardas como mão-de-obra submissa e barata.

    Assim como o machismo. Por que a mulher tem que ganhar em média 70% do que ganha um homem, quando ambos desempenham a mesma função ? E ainda mais quando a mulher tem a dupla jornada em casa e no trabalho ? E ainda tendo que aguentar assédio sexual no trabalho, nas ruas e no transporte coletivo ?.Ora, o machismo, óbvio, é um método para diminuir a mulher, dominá-la e explorar sua mão-de-obra mais barata.

    Negros e negras, pardos e pardas: temos que sair às ruas pacíficos mas coléricos como as últimas manifestações de mulheres contra o corrupto Eduardo Cunha.

    Não adianta posarmos de vítimas do racismo, pois é exatamente isto que o poder econômico e o seu corolário político querem: a vitimização que leva a inação, a paralisação.

    Não pensem que o Congresso e o Judiciário brancos vão ceder espaço para os negros e negras, pardos e pardas sem luta, muita luta

    É preciso fazer uma Revolução Negra no Brasil. As nossas reivindicações são:

    – 50% das cadeiras em todos os parlamentos municipais, estaduais e federal para negros e negras, pardos e pardas;

    – 50% dos assentos nas Universidades Públicas;

    – 50% das vagas em concursos públicos para novos postos no serviço público, municipal, estadual e federal, no Executivo, Legislativo e Judiciário.

    Isto só para começar. Se começarmos já, temos condições de colocar um Presidente da República negro ou negra ou pardo ou parda em 2018 e empoderar, definitivamente, os negros e negras, pardos e pardas..

    Nós temos que pensar grande e alto e agir com a energia necessária para impor a vontade do povo negro e pardo.

    Quem sabe faz a hora, não espera acontecer.

    Antes que o pior aconteça e a História se imponha.

    1. Evolução Negra (para polemizar um pouco)

      Caro Jorge. Como não sou negro, tenho algumas dificuldades para entender em plenitude o sentimento que aqui nos expressa. Respeito ele e torço muito para que todos os brasileiros possam caminhar a um encontro fraterno de vida em comunidade. Mas, o tema aqui exposto nos toca a todos.

      Gostaria que se perguntasse sobre o que podemos fazer pela nossa conta, que não seja apenas esperar que o Governo resolvesse os nossos problemas?

      Por exemplo, agir, objetiva e efetivamente, para evitar que as crianças e os jovens pobres fujam da escola e se resistam a adquirir os valores cívicos nacionais e familiares? Quando iremos tomar conta das nossas crianças e fizer delas brasileiros de bem e melhor inseridos dentro da sociedade?

      Avançamos nos últimos 13 anos, mas este avanço não foi aproveitado integralmente por nós, e ainda é claramente insuficiente. Nossos filhos já possuem um pouco mais de educação e chances de entrar na Universidade, falta agora convencer outras famílias pobres para também aproveitar estas iniciativas do Governo. Devemos apoiar então essas iniciativas e fazer a nossa parte para que essas iniciativas funcionem. Esperar tudo do Governo nos faz, inadvertidamente, passar a imagem que não temos capacidade própria.

      O empoderamento do negro e do pardo não vai se realizar através do atual sistema político-eleitoral que privilegia os ricos, os brancos e os homens.

      Mas, vai se realizar quando comecemos, pelo menos, a aprender a votar corretamente. Em parte, por nossa culpa, recentemente quase colocamos um Playboy na Presidência deste país.

      O que fazer, então?

      Não parece lógico que 54% do eleitorado queixe-se aqui pela omissão de um Governo (e de todos os outros poderes de cargo eletivo), pois estes dependem em grande medida do nosso próprio voto.

      É preciso fazer um maior esforço pela Evolução Negra no Brasil. As nossas metas poderiam ser:

      – Votar melhor, em representantes e partidos que melhor atendam as nossas expectativas. Existe 54% de esse poder nas próprias mãos de gente como Jorge. Nós temos capacidade de escolher o Governo que queremos;

      – 50% dos assentos nas Universidades Públicas – se acharmos gente que queira mesmo sentar nelas e com preparo suficiente para passar pelo ENEM;

      – 50% das vagas em concursos públicos para novos postos no serviço público, municipal, estadual e federal, no Executivo, Legislativo e Judiciário, se estudarmos muito e passarmos pelas provas pertinentes;

      Isto só para começar. Se começarmos já, temos condições de colocar um Presidente da República negro ou negra ou pardo ou parda em 2018 e mostrar para os nossos filhos, as nossas famílias e à sociedade que somos melhores e que podemos fazer muito pelo Brasil, sem necessidade de esperar que seja o restante da sociedade que o faça por nós. Já colocamos um operário e uma mulher na Presidência, com sucesso em nosso beneficio. Falta ainda mais, principalmente da nossa parte.

      Nós temos que pensar grande e alto e agir com a energia necessária para, no mínimo, impor valores familiares, nacionais e educação completa aos nossos próprios filhos, tirando eles da rua. Isso já seria um bom começo. Acompanhar a vida estudantil dos nossos filhos, participando de reuniões de pais, dando exemplo e, ainda, cuidar para que façam corretamente os deveres de casa.

  4. Nassif. A nossa violência

    Nassif. A nossa violência generalizada em todos os recantos do nosso País, jamais será minorada se utilizando demagogicamente das Instrituições policiais. A Instituição Polícia só pode ou poderá ser utilizada para resolver problemas sociais atinentes ao serviço dela, qual seja , problemas exclusivamente policiais.Quando ela é utilizada como “massa de manobra” poitiqueira como está ocorrendo em todos o nosso páis, e diuturnamente, os resultados são e sempre serão imprevisíveis. Tanto para a Instituição Polícia quanto para toda a sociedade. Todos os Problemas sociais têm que ser enfrentados esolucionados utilizando-se de todas as outras Instituições: Justiça, Ministério Público, Educação, Saúde, Moradia, Saneamento Básco, Poder legislativo et caterva. Todas estas Instituições Governamentais citadas fingem que são Republicanas e, assim,  ficam alheias a esta tragédia social que vivenciamos ininterruptamente. As Mídias oligopolizadas (rádios, jornais, revistas e televisão) funcionam como Meios de Enganação de Massa na busca do lucro financeiro a qualquer custo, e valento tudo, e assim idiotizar todos os brasileiros de maneira generalizada. e cruel. Nelson Rodrigues sempre diz: “…se os fatos provam tudo isso, pior para os fatos”. Obs. ; Como a Instituição Policial além de agir republicanamente tem como missão “Coadjuvar” todas as outras Instituições governamentais citadas acima, mas o ovjetivo é único: -encobrir a realidade brasileira,. É só!

  5. Sem camisa

    De algum modo, seja por higiene ou por educação, a presença de alguém assim, de shortinho e sem camisa, seja branco, negro ou amarelo, levanta suspeitas de não ser uma pessoa de bem. Chamem isso como quiser. Eu, já fico atento e muito preconceituoso. Até nas acadêmias de ginástica (quando frequentava), levava uma toalha para me sentar ou apoiar em locais onde gente sem camisa também o fazia. Uma vez pequei uma infeção brava, justamente pela falta de proteção.

    Não tolero gente sem camisa nem na rua (às vezes em cidades que nem praia tem), muito menos em ônibus ou locais públicos. Isso é preconceito?

    1. Depende, em uma cidade como o

      Depende, em uma cidade como o Rio, aonde o calor é imenso e estão delimitados por praias; ficar sem camiseta é amplamente normal. Projetou uma situação sem analisar as variáveis. A manipulação midiática está justamente aí. Acabou de agir como midiota. hehe

        1. Desculpe pela parte que lhe

          Desculpe pela parte que lhe toca. Mas só procurei te mostrar que a capacidade de manipulação midiática, seja esta intencional ou não, está diretamente relacionado a capacidade das pessoas de relacionar informações. 

    2. Preconceito sim

      Eu também não gosto de ver pessoas sem camisa e admito que seja um preconceito que tenho (um dos que ainda não consegui me livrar). Sendo roupa um artifício, o natural seria andar nu e ninguém estranhar. Andar trajado é apenas uma convenção, e como tal, deve ser revista de tempos me tempos.

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