Sobreviventes da tragédia em Minas querem reerguer comunidade

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Mariana (MG) - Pessoas foram hospedadas em hotel na cidade de Mariana após rompimento de duas barragens de rejeitos da mineradora Samarco (Antonio Cruz/Agência Brasil)

Por Paula Laboissière

Da Agência Brasil

Praticamente todos os moradores do distrito de Bento Rodrigues, em Mariana (MG), que sobreviveram ao rompimento de duas barragens na semana passada estão hospedados em hotéis e pousadas do município. A maior parte deles pode ser vista do lado de fora dos estabelecimentos, sentada nas calçadas, conversando na rua e tentando manter os costumes.

No centro movimentado de Mariana, quando conversam com a imprensa, eles deixam claro que pouco sabem sobre o futuro, já que a maioria perdeu tudo – casa, carro, móveis, documentos, fotos, memórias. Mas há uma unanimidade na fala de todos os que foram ouvidos pela equipe de reportagem da Agência Brasil: querem reerguer a comunidade num cantinho só deles, como um dia foi o distrito carinhosamente chamado de Bento.

“A saudade é demais. É o que mais incomoda a gente. Não ter pra onde voltar é muito ruim”, desabafou a dona de casa Edna Aparecida Euzébio, 34 anos. Ela, o marido e três filhas moravam numa casa de três quartos no povoado, que foi arrasado pela lama e pelo barro. A família costumava ir até Mariana apenas para pagar contas e cumprir um compromisso ou outro, nada mais.

“Lá era tranquilo demais. A gente dormia com as portas abertas, papeava na porta de casa, jogava truco até mais tarde. Não foi só a casa que perdemos. Perdemos toda uma vida, a nossa história, os nossos costumes. E agora queremos um lar, não um quarto de hotel.”

Sem conseguir evitar de ouvir a conversa, o encarregado José Luiz da Silva, de 44 anos, concorda com tudo o que a dona de casa diz. Depois da tragédia, ele sequer tentou buscar o que poderia ter sobrado de suas coisas em Bento Rodrigues, porque viu pela televisão que só a estrutura da casa permaneceu de pé.

“Não tenho vontade de voltar lá não, mas tenho uma saudade danada de casa. É uma mistura de emoções muito fortes. Do tipo quero voltar, mas não quero”, disse, numa tentativa de explicar o que sente. José destacou ainda o medo, compartilhado por muitos da comunidade, em relação à barragem de Germano, da mesma mineradora, que permanece cheia.

“Há mais coisa lá em cima. E se essa barragem também se romper? Não quero voltar pra lá. Quero uma vida nova, num lugar diferente, mas fora do centro urbano. Já viajei muito, já fiquei em muito hotel, mas meu lugar não é aqui nessa pousada. É lá. Era lá. Agora não sei mais.”

O servente Paulo Madalena Fernandes, 56 anos, morava sozinho em uma casa de quatro quartos em Bento Rodrigues. A casa era da mãe dele, repleta de lembranças e memórias que não vão ser mais recuperadas. Quando as duas barragens de romperam, Paulo estava em casa. Correu como nunca. Passou a noite na mata até que foi resgatado e levado para uma pousada da cidade.

“Dentro de hotel, não aguento ficar. Venho sentar aqui fora, papear. Perdemos muita memória e muita lembrança e isso ninguém consegue dar de volta. É por isso que queremos uma nova vila, longe da cidade, como era antes. Só assim pra conseguir recomeçar a vida.”

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

5 Comentários

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  1. A OAB existe.
    Por isso só podem sonhar em reconstruir sua comunidade.

    Deveriam ir para a Savassi com a indenização.
    Mas nunca vão receber.
    Porque isso aqui é Brasil e existe uma OAB que impôs a tese do ENRIQUECIMENTO INDEVIDO!

    A tese do enriquecimento indevido. Aplicada todo ano, todo mês, sem uma LEI que lhe dê embasamento, só a OAB.

    1. Athos, apenas para lhe dar

      Athos, apenas para lhe dar mais Norte, pessoas que moram e convivem na roça não querem ‘mesmo’ saber de Savassis. Acredite.

  2. Responsabilidades

    E qual a posição do governo do Estado ? Como ficarão as vidas dessas pessoas, que perderam absolutamente tudo. E tem ainda os corpos, parece que não encontraram quase ninguém ainda… Muitos ainda vão realizar as perdas humanas quando encontrarem os corpos. Eh uma loucura a irresponsabilidade da Samarco. E como disse o senhor na reportagem, tem mais uma barragem cheia. Alguém do governo mineiro ja tomou providência de ir ver isso?

  3. Governos preocupados com a

    Governos preocupados com a chegada da lama da Vale

    ao Espírito Santo.. Ela já chegou por aquí há muito tempo

    e não foi atraves do Rio Doce mas através do esbulho

    feito nas terras de Orozimbo Pinto Ribeiro.  Esse caso é do

    conhecimento até dos granitos que cobrem o piso do STF,

    há mais de 50 anos.  Dois personagens não peças chave

    dessa epopéia juridica: Bermudes e Mendes.

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