Combustíveis: contra subordinação ao capital estrangeiro, use a ciência nacional, por Aracy Balbani

Combustíveis: contra subordinação ao capital estrangeiro, use a ciência nacional

por Aracy Balbani

É cada vez mais difícil encontrar notícias verdadeiras e boas para compartilhar. Geralmente elas vêm da divulgação científica.

Entre as conquistas nacionais recentes está a descoberta de uma enzima existente em microrganismos do lago Poraquê, na Amazônia. A enzima pode contribuir para maior eficiência da produção do etanol de segunda geração, aquele obtido não do caldo, mas da palha e do bagaço da cana-de-açúcar. Com o uso dessa tecnologia, muito do que acabaria como resíduo da indústria sucroalcooleira seria transformado em biocombustível, aumentando em até 50% a produção nacional de etanol.

Participam desse trabalho cientistas do Laboratório de Biologia Molecular da Universidade Federal de São Carlos, do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (Campinas, SP), do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello, da Petrobras (Rio de Janeiro), e do Instituto de Química da USP. São eles: Danyelle Toyama, Mariana Abrahão Bueno de Moraes, Felipe Cardoso Ramos, Letícia Maria Zanphorlin, Celisa Caldana Costa Tonoli, Augusto Furio Balula, Fernando Pellon de Miranda, Vítor Medeiros Almeida, Sandro Roberto Marana, Roberto Ruller, Mario Tyago Murakami e Flávio Henrique-Silva.

Na mesma linha, um artigo de Sheila Tiemi Nagamatsu, doutoranda em Genética e Biologia Molecular na UNICAMP, explica de forma didática as maneiras pelas quais a pesquisa científica pode melhorar a competitividade dos biocombustíveis e diminuir nossa dependência do petróleo.

Parabéns aos nossos pesquisadores e pesquisadoras. Eles nos motivam a lutar com mais força ainda para barrar as tentativas de sucateamento da Petrobras e dos centros nacionais de pesquisa.

Da Agência FAPESP

http://agencia.fapesp.br/descoberta_na_amazonia_enzimachave_para_obtencao_do_etanol_de_segunda_geracao/27778/

Descoberta na Amazônia enzima-chave para obtenção do etanol de segunda geração

 

José Tadeu Arantes | Agência FAPESP – A produção do etanol de segunda geração ou etanol celulósico, obtido a partir da palha e do bagaço da cana-de-açúcar, pode aumentar em até 50% a produção brasileira de álcool. Desnecessário enfatizar a importância econômica e ambiental dessa possibilidade, que transforma resíduo em recurso.

Para tanto, o país possui a melhor biomassa do planeta, a capacidade industrial instalada, a engenharia especializada e a levedura adequada. Só falta completar a composição do coquetel enzimático capaz de viabilizar o processo de sacarificação, por meio do qual os açúcares complexos (polissacarídeos) são despolimerizados e decompostos em açúcares simples. Compor uma plataforma microbiana industrial para a produção do conjunto de enzimas necessárias é o alvo de pesquisas avançadas na área.

Um importante resultado acaba de ser alcançado, com a descoberta, no lago Poraquê, na Amazônia, de microrganismos capazes de produzir uma enzima crítica para o êxito do empreendimento.

Isolada, caracterizada e produzida, a enzima mostrou-se compatível com duas fases essenciais da produção do etanol de segunda geração: a fermentação e a sacarificação. A realização simultânea dessas duas etapas oferece a perspectiva de uma grande redução de custos para a indústria sucroalcooleira, uma vez que as reações podem ocorrer em um único reator e há economia de reagentes.

O estudo mobilizou pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), da Petrobras, da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), e contou com apoio da FAPESP. Artigo assinado pela equipe de pesquisadores foi publicado na Biochimica et Biophysica Acta (BBA) – Proteins and Proteomics.

“A sacarificação é a etapa mais cara do processo. De 30% a 50% do custo do etanol celulósico é despendido com as enzimas necessárias para transformar os açúcares complexos em açúcares simples. E, atualmente, a eficiência da conversão realizada por essas enzimas está entre 50% e 65%. Isso significa que de 50% a 35% do açúcar disponível na biomassa é ‘perdido’ durante a sacarificação. O grande propósito do nosso estudo foi encontrar biocatalisadores capazes de contribuir para o aumento da eficiência”, disse Mario Tyago Murakami do CNPEM, um dos coordenadores da pesquisa, à Agência FAPESP.

Segundo o pesquisador, no arsenal de enzimas necessárias, atuando de maneira sinérgica, as beta-glucosidases têm importância fundamental, porque respondem pela última fase da cascata de sacarificação da celulose.

“Sabemos que, à medida que aumenta o percentual do produto da sacarificação, a taxa do processo de sacarificação cai. Porque a presença do produto inibe a atuação das enzimas. Isso é uma espécie de regra geral. No caso específico, a glicose gerada restringe a atuação das beta-glucosidases. Esse gargalo tecnológico tem sido objeto de estudos exaustivos. Para aumentar a eficiência da sacarificação, é preciso que as beta-glucosidases sejam altamente tolerantes à presença da glicose”, disse Murakami.

Devido a especificidades genéticas, decorrentes de diferenças no processo evolutivo, enzimas homólogas podem apresentar variados graus de resistência à inibição pelo produto. E o alvo dos pesquisadores no estudo em pauta foi encontrar as beta-glucosidases mais adaptadas à biomassa existente no território brasileiro. Para isso, foram investigados os processos naturais que ocorrem em diferentes biomas do país, tanto na Floresta Amazônica como no Cerrado.

Flavio Henrique da Silva, da UFSCar, outro coordenador do estudo, foi o responsável por esse processo de bioprospecção. E o achado mais promissor ocorreu no lago Poraquê, na Amazônia, onde amostras da comunidade microbiana não cultivável local apresentaram genes codificadores de beta-glucosidases com o potencial industrial procurado.

“Em um habitat como o lago Poraquê os microrganismos adaptaram-se a uma alimentação muito rica em polissacarídeos, constituída por resíduos de madeira, folhas de plantas etc. A enzima beta-glucosidase presente nesses microrganismos é distinta de enzimas homólogas resultantes de pressões evolutivas diferentes”, disse Murakami.

Sacarificação simultânea à fermentação

Em seus estudos enzimológicos, Silva verificou que a beta-glucosidase codificada pelos microrganismos do lago Poraquê apresentava eficiência catalítica para a sacarificação do bagaço de cana-de-açúcar e tolerância expressiva à inibição pela glicose. O passo seguinte foi dado pela equipe de Murakami, especializada em biologia estrutural mecanística, que elucidou, em nível molecular e atômico, as bases do funcionamento dessa enzima.

“Foi um bom exemplo de trabalho em equipe, juntando grupos de prospecção, grupos de enzimologia, grupos de estudos mecanísticos, grupos de bioinformática etc. Utilizamos equipamentos do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron e de outros laboratórios nacionais”, disse Murakami.

Em relação à estrutura molecular, o estudo oligomérico evidenciou uma proteína diferente das demais de sua categoria, com uma arquitetura quaternária única.

“Esse estudo corroborou pesquisas anteriores do grupo a respeito dos determinantes estruturais para a tolerância da enzima ao produto, validando nosso modelo mecanístico. Além disso, verificamos que essa beta-glucosidase atua em condições de temperatura e pH compatíveis com o processo de hidrólise”, disse Murakami.

Essa informação é muito relevante, porque indica que a enzima encontrada pode vir a compor um processo chamado de SSF: sacarificação simultânea à fermentação. Pelo fato de poder atuar em condições de temperatura compatíveis com o crescimento da levedura, essa beta-glucosidase propicia que a disponibilização do carboidrato resultante da sacarificação e sua fermentação pela levedura possam ocorrer ao mesmo tempo. Tal estratégia ajuda a mitigar o efeito de inibição pelo produto, porque, à medida que o açúcar é produzido, ele também vai sendo consumido pela levedura, o que alivia a enzima da inibição por uma quantidade excessiva de glicose.

O passo seguinte é fazer estudos de combinação dessa enzima com os coquetéis enzimáticos fúngicos já existentes, visando o ganho de eficiência no aumento da sacarificação.

“Uma vez extraído o gene de interesse, a partir de bibliotecas gênicas de microrganismos não cultiváveis e de possíveis modificações racionais baseadas no conhecimento da estrutura para aumento de termoestabilidade, ele é transferido para outros hospedeiros por meio de técnicas de biologia molecular. O hospedeiro em questão é o trichoderma, um fungo filamentoso que já possui um arsenal de enzimas ativas sobre carboidratos. Com a adição da beta-glucosidase amazônica, ele terá seu potencial aumentado. Trata-se de potencializar uma plataforma microbiana industrial já existente”, disse Murakami. O objetivo da equipe é patentear o fungo engenheirado com a enzima. 
Do Blog Terabytes of Life

Pesquisa no combate à greve?

Pesquisa no combate à greve?

 

Segundo um estudo publicado em 2015 o preço do diesel é composto por: 2% de frete, 5% de biodiesel, 20% das margens, 20% de tributos e 50% do diesel; enquanto a gasolina: 2% de frete, 11% do álcool anidro, 18% das margens, 34% de tributos e 35% da gasolina. O que poderia ser reduzido? Tributos, que incluem Imposto sobre Circulação de Mercadorias e serviços (ICMS), PIS/PASEP, COFINS e o CIDE; preço do diesel e gasolina que estão diretamente relacionados ao dólar; e talvez o frete, que entra exatamente no foco do protesto. E se for considerar os fatores que podem alterar a cotação do dólar, então, isso vira um ciclo sem fim!

E se tudo está um caos, por que, não considerar outras alternativas? Para a gasolina é fácil, visto que já existe uma alternativa implantada, o etanol, um biocombustível produzido principalmente a partir do caldo da cana-de-açúcar no Brasil e que tem dois tipos de produção: primeira geração e segunda geração. Se você nunca escutou falar sobre isso, fique tranquilo(a), pois eu também só tive conhecimento desses jargões ao entrar para área. E de uma forma bem simplificada, a primeira geração utiliza o caldo da cana, que pra quem já provou sente a quantidade de açúcar disponível ali; enquanto a segunda geração utiliza o que sobra depois da extração do caldo, o bagaço, ambas com muitas etapas a serem melhoradas para aumentar a produtividade do processo, barateando custos para o consumidor.

Quanto ao diesel, já existe o biodiesel que atualmente é adicionado ao combustível comercializado, produzido principalmente a partir de óleos vegetais, como soja e algodão. Porém, para que ele possa ser um substituto do diesel ainda há a necessidade de pesquisas para adaptação dos motores atuais, além de um aumento na produtividade do processo, como no caso do etanol.

Além dos combustíveis citados, também podemos listar o gás para abastecimento de automóveis e o querosene na aviação (que assim como o diesel apresenta uma pequena porcentagem de bioquerosene). Porém, há diversos outros combustíveis explorados até o momento: água, metanol e madeira, na lista dos renováveis; e xisto betuminoso, carvão e gás liquefeito de petróleo (GLP), como combustíveis fósseis.

E como a pesquisa pode ser utilizada para alterar esse cenário? Aumentando os esforços para tornar biocombustíveis competitivos e quebrar a dependência ao petróleo. Aqui entramos em inúmeras possibilidades de estudos: melhoramento de plantas para aumentar a produtividade (e considerando o distanciamento do ramo alimentício, transgênicos se tornam muito atraentes!), melhoramento de condições de plantio e solo, equipamentos para o campo e para usinas, estudos de eficiência de processos, e, para a segunda geração, o tratamento do bagaço para liberação dos açúcares.

Nesse contexto está inserida a linha de pesquisa do meu projeto de doutorado, que utiliza a bioinformática como ferramenta para identificar potenciais alvos para melhoramento de leveduras (organismos utilizados para converter açúcar em etanol) utilizadas na produção de bioetanol de segunda geração. Só para exemplificar, durante o meu doutorado estudamos uma levedura que pudesse ser utilizada para produção de etanol de segunda geração, que como já foi apresentado, utiliza o bagaço como matéria-prima. Para isso, ela foi modificada e passou por um processo de adaptação ao ambiente que seria inserida para que se tornar mais eficiente. Após essas etapas, ela teve seu genoma* sequenciado e analisado (por bioinformática) para identificar o que a tornava melhor, para que, no futuro, essas modificações pudessem ser inseridas em outro organismo.

Fazendo um comparativo, imagine que você tem dois carros, A e B. O carro A, por alguma razão física é mais rápido que o B, e para identificar o que causa esse efeito é necessário desmontar ambos e identificar quais peças são diferentes. Dessa forma, é possível substituir as peças do carro A no B e observar se ele apresenta alteração de velocidade. E é basicamente o que fazemos, inclusive correndo os riscos de que a “peça” não seja adaptável.

Dá pra ter uma ideia do quanto podemos ganhar investindo em pesquisas? Talvez realmente esteja na hora de reclamar, mas buscando soluções, buscando formas de contribuirmos para um mundo melhor, porque a responsabilidade não é só desses caminhoneiros que estão nas ruas, muito menos dos governantes, ela também é minha e sua. A única diferença entre nós e eles, é a quantidade de pessoas que conseguimos atingir com nossas ações.

 

*Material genético, código inserido em nossas células que definem tudo que somos fisicamente.

 

Referências:

  1. Impactos da contenção dos preços de combustíveis no Brasil e opções de mecanismos de precificação
  2. Em SP, etanol já está 44% mais barato que a gasolina
  3. Quem são e o que querem os caminhoneiros que estão parando o país?
  4. O aumento da produtividade e a busca pela excelência na produção do etanol brasileiro
  5. Substituição de combustíveis fósseis por etanol e biodiesel no Brasil e seus impactos econômicos
  6. Produção de biodiesel atinge recorde de 351 mil metros cúbicos
  7. Biodiesel: Vantagens e desvantagens numa comparação com o diesel convencional
  8.  
Redação

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