O que se sabe até agora sobre a Nitazoxanida e os medicamentos para o coronavírus

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
[email protected]

Nitazoxanida apostada por Marcos Pontes ou Cloroquina insistida por Bolsonaro? Saiba as descobertas e últimas pesquisas dos cientistas para tratar o Covid-19

Jornal GGN – Ainda não há estudos clínicos em pacientes sobre a eficácia do medicamento que o ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, quer testar nos brasileiros com coronavírus. Mas a Nitazoxanida, componente do antiviral Annita, já obteve respostas positivas nos testes em laboratório para o combate ao coronavírus e com segurança, obtendo baixos efeitos colaterais.

O GGN revela, nesta reportagem, os últimos estudos sobre os medicamentos e antivirais para enfrentar as infecções do Covid-19 e o que os cientistas estão descobrindo.

Um recente estudo científico de investigadores chineses sobre o uso de medicamentos para tratar o novo coronavírus levantou a possível eficácia de antivirais, e já descartou alguns que não obtiveram resultados, como o Oseltamivir (componente do Tamiflu), Peramivir, Zanamivir, Ganciclovir, Aciclovir e a Ribavirina.

Intitulado “Tratamento Antiviral para o novo coronavírus 2019 está disponível(leia aqui), os investigadores Li Hui, Wang Yeming, Xu Jiuyang e Cao Bin confirmaram alguns medicamentos “que podem ser eficazes”. Entre eles, o Redoxivir e o Lopinavir/ritonavir (vendido como Kaletra), combinados com outros agentes, como o Interferon-β, o plasma convalescente e anticorpos.

A conclusão deste estudo, que foi publicado neste mês na Revista Chinesa de Tuberculose e Doenças Respiratórias, no entanto, foi que “a eficácia e a segurança desses medicamentos em pacientes com pneumonia 2019-nCoV precisam ser confirmadas por mais ensaios clínicos”.

2019 novo tratamento antiviral para coronavírus tem medicamentos disponíveis - Chinese Journal of Tuberculosis and Respiratory Diseases

 

Se o estudo apresentou o resultado de diversos antivirais comumente utilizados em hospitais, estes pesquisadores não consideraram outra gama de medicamentos, entre eles a Nitazoxanida, como fez outro estudo publicado em fevereiro pela Cell Research, por 10 cientistas chineses (acesse aqui).

Apesar de trazer como conclusão que o Remdesivir e a Cloroquina “inibem efetivamente o novo coronavírus recentemente surgido (2019-nCoC)” em pesquisas in vitro, os pesquisadores avaliaram outros medicamentos, como a Nitazoxanida que deve ser testada no Brasil, a Ribavirina, o Penciclovir, o Nafamostat e o antiviral Favipiravir.

E, ao contrário do que trouxe coluna de Monica Bergamo nesta sexta-feira (17), a Nitazoxanida não necessariamente é menos efetiva e mais tóxica do que outros medicamentos testados.

“A Nitazoxanida, um agente antiprotozoário comercial com potencial antiviral contra uma ampla gama de vírus, incluindo o vírus humano e animal, inibiu o 2019-nCoV a uma baixa concentração micromolar”, foi a conclusão do estudo, que ainda recomendou “uma avaliação in vivo adicional deste medicamento contra a infecção 2019-nCoV”.

Em outras palavras, a Nitazoxanida, componente do medicamento Annita, apresentou bons resultados sem uma necessidade de grande dosagem, em testes realizados em laboratório. Entretanto, os pesquisadores chineses recomendaram que testes fossem feitos em pacientes com o novo coronavírus, uma vez que os resultados obtidos podem ser diferentes do laboratório.

O mesmo foi recomendado para o Nafamostat. E em outros três destes medicamentos foi necessária uma alta dosagem para reduzir a infecção provocada pelo coronavírus: o Ribavirina, o Penciclovir e o Favipiravir, o que elimina estes medicamentos das opções confiáveis. Este estudo assegurou que tanto o Remdesivir, quanto a Cloroquina foram “notavelmente” eficientes em baixa dosagem.

s41422-020-0282-0

 

O uso da Nitazoxanida, que hoje é sugerida para aplicação no Brasil, contra outros tipos de vírus e doenças é matéria de análise de revistas acadêmicas há anos. Um artigo de 2016 (leia aqui) mostrou que a substância era apontada, juntamente com mais uma dezena de outros medicamentos, para o tratamento da síndrome respiratória aguda grave (SARS) e da síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS), que são as infecções constatadas em coronavírus anteriores e também no atual.

Interferon e medicamentos que são indutores da produção de interferon no organismo foram testados, assim como a cloroquina e dezenas de outros medicamentos.

nrd.2015.37

 

As observações sobre a Nitazoxanida são que a substância “é um potente indutor de interferon tipo I que tem sido utilizado em humanos para infecções parasitárias”, e que tem boa resposta no combate a diversos vírus, incluindo o “coronavírus canino, o vírus influenza, HBV, HCV, HIV, rotavírus, norovírus e flavivírus”.

Também contrariando a possibilidade de ser um agente altamente tóxico, como informou a coluna de Monica Bergamo, o estudo daquele ano apontou que o medicamento “possui um bom perfil de segurança” em ensaios clínicos para infecções de hepatite C e influenza.

A segurança do medicamento também foi destacada no estudo “Nitazoxanida: Um agente antiviral de amplo espectro de primeira classe”, de 2014, que analisou os efeitos da substância no tratamento de gripes (aqui). A eficácia em vírus como o coronavírus, contudo, não foi comprovada.

“À medida que surgem novas infecções respiratórias virais, como o coronavírus MERS, prevê-se o desenvolvimento de testes animais e talvez de ensaios clínicos para estudar a atividade da nitazoxanida. Estudos pré-clínicos para avaliar a eficácia do medicamento contra o coronavírus MERS estão em andamento.”

1-s2.0-S0166354214002137-main

 

Como ressaltaram as pesquisas de 2014, de 2016 e as mais recentes deste ano, há ainda muitos estudos a serem feitos sobre a eficácia de medicamentos e antivirais no tratamento de infecções do novo coronavírus. São centenas de possibilidades sendo testadas em laboratórios do mundo inteiro nos últimos dias, cujos resultados positivos não garantem a eficácia em pacientes reais do Covid-19.

O mais específico e recente sobre os efeitos da Nitazoxanida, proposta por Marcos Pontes para os contagiados no Brasil, tem a previsão de um resultado concreto somente no dia 30 de dezembro deste ano. É um ensaio clínico que está sendo feito pelo mexicano Hugo Mendieta Zerón, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Autônoma do Estado do México.

Ao contrário do sigilo do nome do medicamento a ser testado – postura de Marcos Pontes amplamente criticada pelo universo científico -, o chefe de investigação do Hospital Materno-Perinatal Mónica Pretelini Sáenz e membro do sistema nacional de pesquisadores (SNI) do país latino-americano iniciou a análise monitorada e devidamente homologada no dia 6 de abril, com pacientes com Covid-19 em quadros graves do Instituto de Saúde do México. Os dados serão coletados até o final de agosto, quando será divulgada a conclusão parcial dos resultados. O estudo só será, finalmente, publicado em dezembro de 2020.

Para justificar o uso da Nitazoxanida, o médico afirmou que enquanto “a utilidade de nenhum esquema de tratamento com COVID-19 pode ser garantida” até agora, “chama a atenção que os países em desenvolvimento não tenham sido incluídos” entre as pesquisas mundiais reconhecidas. Hugo Mendieta Zerón aposta no antiviral como uma alternativa “economicamente acessível”.

 

 

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

1 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador