Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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Curta da Semana: “Don’t Hug Me, I’M Scared” – o mundo é o inferno das boas intenções

Fenômeno viral na Internet, a série de curtas “Don’t Hug Me, I’M Scared” (2011-2015) de um coletivo de artistas ingleses misturam fantoches, animações 3D e artistas fantasiados de animais, num assustador mix de Vila Sésamo e Backyardigans com o último pesadelo de David Lynch. Para mostrar às crianças que o mundo é um inferno de boas intenções. Os curtas começam com a linguagem dos tradicionais vídeos educativos cheios de boas intenções e saudáveis lições de moral: os temas são abstratos e existenciais (Tempo, Amor, Criatividade) e práticos (comida saudável e computadores). Mas as boas intenções se convertem em momentos sangrentos e de surreal humor negro, mostrando às crianças uma lição sobre o mundo dos adultos as espera: boas intenções amigáveis e altruístas se transforam em infernos autoritários. Curta sugerido pelo nosso leitor Francisco Narde.

Os vídeos educativos atuais fazem um trabalho razoável de ensinar a crianças e jovens habilidades básicas como matemática, linguagem e outros diversos conteúdos escolares. Mas ainda não conseguem tratar de certos temas que, apesar de intangíveis, farão parte do cotidiano no futuro: medos existenciais, a religião, o tempo, a morte, a disciplina e a obediência.

Felizmente esse vazio parece estar sendo preenchido com um série de curtas virais que parecem ter saído de um cruzamento entre Vila Sésamo, Muppet Show, Backyardigans e alguma bizarrice mais recente de David Lynch. É a série Don’t Hug Me, I’M Scared (DHMIS) – “Não Me Abrace, Estou Assustado”. Iniciada em 2011 é composto por cinco episódios com os seguintes temas: Criatividade, Tempo, Amor, Computadores e Comida Saudável.

Atores fantasiados, animações em 3D e fantoches cantando letras que parecem querer ensinar algum tipo de lição ou moral, mas invariavelmente os episódios terminam com alguma forma de terrível mutilação corporal e sequências de surreal humor negro.

A série a princípio foi voltada para o público adulto, mas viralizou através do YouTube entre o público infantil e adolescente.

Os temas dos curtas parecem ser aleatórios, mas há uma abordagem comum em todos os vídeos: a contradição entre as lições morais que a sociedade nos ensina e os resultados catastróficos no dia-a-dia. A teoria, na prática é outra! Os vídeos são verdadeiras lições do que as crianças devem esperar quando chegarem no maravilhoso mundo dos adultos, repleto de prescrições, regras, ordem e disciplina. Mas tudo embalado e florido com uma linguagem politicamente correta e amigável.

DHMIS foi criado por um coletivo audiovisual inglês chamado This Is It formado por 12 artistas entre animadores, desenhistas, diretores que escrevem, produzem e dirigem suas obras independentes. Becky Sloan e Joseph Pelling são os fundadores do coletivo e os principais diretores de DHMIS que ganhou bastante reconhecimento no mundo dos curtas metragens, ganhando diferentes prêmios em festivais.

 

Há algo de doentio e perturbador na atmosfera dos curtas – um estranho mix do tatibitati infantil com desfechos sangrentos e metalinguísticos. Mas, não vamos matar o mensageiro por causa da mensagem: os curtas apenas refletem muito a cultura midiática esquizofrênica que promete um mundo cheio de amor, criatividade e boa vontade e nos entrega dor, paranoia, medo e desespero.

A viralidade dos curtas está na estranheza e ambiguidade: os vídeos parecem conter mensagens simbólicas e subliminares por todos os lados, o que faz os espectadores criarem as mais bizarras teorias e interpretações sobre os personagens e os desfechos das narrativas – há leituras e releituras dos curtas em sites, blogs e em vídeos no YouTube que tentam desmontar as histórias frame a frame.

Os Curtas

O primeiro curta é sobre Criatividade: um bloco de notas ganha vida e começa a ensinar os personagens como ser criativo – ver o mundo de forma menos chata, mais poética, incentivando a procurar dentro de cada um novas ideias, cores e diferentes formas de expressão artística e emocional. 

Mas tudo acaba mal: o bloco de notas revela-se autoritário. Seja criativo, desde que obedeça critérios arbitrários. Quando os fantoches tentam ser realmente criativos, libertando-se do arbítrio do bloco de notas, tudo termina em um terrível caos.

Moral da história: criatividade é perigosa! Veja abaixo:

O segundo curta ensina sobre o Tempo. Dessa vez é um relógio que ganha vida e ensina para os nossos heróis fantoches as noções metafísicas e filosóficas sobre o tempo. Até que o Tempo mostra sua face terrível e autoritária: a entropia, o envelhecimento, a morte. 

 

Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

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