Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
[email protected]

Curtas da Semana: ” Restart” e “Einstein-Rosen” – uma sensibilidade gnóstica do Tempo-Espaço, por Wilson Ferreira

por Wilson Ferreira

Uma jovem é sequestrada e levada para um bunker subterrâneo para ser uma cobaia humana em experiência de loop temporal pelo obscuros interesses corporativos de uma empresa. E em 1982, junto com seu irmão, um menino procura um ” buraco de minhoca” no tempo-espaço de uma área do prédio em que mora. Para jogar através da passagem a bola que recuperará 35 anos depois no mesmo local. Esses são os curtas espanhóis “Restart” e ” Einstein-Rosen” de Olga Osorio. Duas produções que mostram como a mitologia gnóstica hoje tornou-se o “espírito do tempo”: uma nova sensibilidade ou olhar para a realidade tanto política quanto existencial.

                Doutora em Humanidades e professora de Montagem na Faculdade de Ciências da Comunicação da UDC (Universidade da Coruña), a espanhola Olga Osorio é fascinada por paradoxos temporais e abordagens quânticas sobre o tempo e o espaço.

Cinegnose apresenta dois curtas recentes de Osorio, interligados por questões temáticas e também familiares: Restart (2015) e Einstein-Rosen (2016). O primeiro, uma versão do filme clássico O Feitiço do Tempo (aka Dia da Marmota, 1993), porém mais violento; e o segundo, retomando o tema sobre loop temporais – um curta com tom mais familiar ao estilo De Volta Para o Futuro. Principalmente, porque foi resultante da discussão com os seus dois filhos sobre curta Restart, que também estrelam no filme. 

Esses dois curtas são pequenos exemplos de um outro tipo de abordagem pós-moderna sobre o Tempo. Em postagens anteriores, discutíamos que enquanto nos filmes clássicos modernistas como a série televisiva O Túnel do Tempo (1966-67) o passado é imutável, por mais que os protagonistas Doug e Phillips tentem, por exemplo, avisar para o capitão que o Titanic vai bater num Iceberg, na sensibilidade pós-moderna o Tempo é moldável – poderíamos alterar o passado, criando exponencialmente múltiplas linhas temporais paralelas, como nos filmes O Efeito Borboleta (2004) ou Sr. Ninguém (2009).

Mas esses dois curtas também apresentam um outro lado dessa sensibilidade pós-moderna: também é figurada a impossibilidade de alterar o passado, porém o protagonista está prisioneiro em um loop criado artificialmente por algum tipo de Demiurgo – uma divindade enlouquecida ou algum gigante corporativo com interesses obscuros. Ao contrário de O Túnel do Tempo, a inevitabilidade da seta do Tempo é uma construção artificial, uma armadilha para aprisionar o protagonista. É a abordagem gnóstica sobre o Tempo.

 

Os Curtas

Em 2015, uma empresa chamada ReStart começa a fazer as primeiras experiências de viagens temporais com humanos. Quatro anos depois o Governo proibiu os experimentos e ordenou a fechamento da empresa. Porém, secretamente, os experimentos continuaram como acompanhamos no curta.

Caminhando por uma linda vista da costa espanhola dominada pela presença de um farol, uma jovem mulher é repentinamente sequestrada por misteriosos assaltantes. Jogam ela em um carro, para leva-la para um bunker subterrâneo. 

A partir daí, ela é forçada a reviver esse dia do sequestro em um loop temporal. Porém, de uma forma especial: a protagonista retorna para esse dia para, à distância, testemunhar seu próprio sequestro. Quando o sequestro termina, ela retorna para o presente. A princípio ela acredita que está sofrendo algum tipo de confusão mental ou delírio por algum tipo de trauma como prisioneira.

Aos poucos perceberá que a situação é real. O tempo é imutável? É possível alterar o passado para conseguir sair daquela prisão? Quais as implicações que o passado tem para o nosso presente? Ou para o futuro? Osorio aborda essas questões em uma narrativa elegante, meditativa, utilizando os temas predominantes na ficção-científica.

 

Ele tentará alterar o passado, porém aqueles misteriosos assaltantes são violentos e farão de tudo para manter o loop temporal.

Já em Einstein-Rosen acompanhamos a estória de dois irmãos em um gap de 35 anos – 1982 e 2017. Pelo título do curta, dá para perceber que a narrativa leva a sério a chamada “ponte Einstein-Rosen”, os chamados “buracos de minhoca” – atalhos hipotéticos pelo tempo-espaço previstos por Albert Einstein e Nathan Rosen em 1935.

Óscar é um garoto de nove anos determinado a encontrar um buraco de minhoca que, segundos seus cálculos, está no pátio do edifício em que moram. Seu irmão Teo não acredita nem um pouco na experiência do irmão, e está mais preocupado com a mãe que chama para o almoço, sob pena de perder a sobremesa.

Teo vira as costas enquanto Óscar olha maravilhado a bola se perder no buraco previsto. Será que as informações do objeto se perdem na travessia, e nada restaria do outro lado?

Trinta e cinco anos depois Óscar tem a resposta. No mesmo local, junto com seu irmão, testemunham a chegada da bola… e de uma série de brinquedos, inclusive a tartaruga do irmão que Óscar usou para o experimento. E que o irmão Teo julgou, em 1982, ter sido atropelada por um carro e desaparecido.

 

A sensibilidade gnóstica

                 A narrativa do primeiro curta parte de dois elementos clássicos da mitologia gnóstica: os obscuros interesses corporativos da ReStart com cobaias humanas nos experimentos em viagens no tempo – a figura do Demiurgo. E a protagonista prisioneira em uma armadilha, o loop temporal, na qual está condenada na observar a si mesma sendo sucessivas vezes raptada.

 

Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador