Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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Em Observação a lista dos 10 filmes mais estranhos de 2015

Um samurai travesti em uma floresta na Alemanha persegue um policial; o ar pode acabar num submarino porque as massas das panquecas servidas à bordo criam bolhas de ar; uma sociedade secreta japonesa agencia mulheres ninjas dominatrix para atacarem em público homens de negócios que querem ter prazeres sadomasoquistas. Esqueça os blockbusters e os filmes “oscarizáveis”. Estamos no universo dos filmes mais “estranhos” de 2015. Uma lista de dez filmes que mostram até onde o cinema pode chegar ao explorar o excêntrico, o estranho e o incomum.

Mais um ano de cinema se foi. Mas se o leitor cavar mais fundo para além da superfície cheia de remakes de grandes sucessos como Mad Max e Star Wars ou dramas conservadores que aparecem a cada final de ano para tentar abocanhar um Oscar, vai encontrar algumas criaturas estranhas se mexendo no porão da indústria do cinema.

O ano de 2015 foi marcado pela movimentação dessas estranhas criaturas do cinema independente: o campeão do cinema pós-moderno Guy Maddin (a quem o Cinegnose dará mais atenção nesse ano) lançou mais um filme; também foi lançado o aguardado terceiro filme da trilogia “Sobre o Ser Humano” de Roy Andersson, diretor sueco bem conhecido por esse blog.

Além de algumas estreias inclassificáveis de diretores arrivistas do cinema estranho.

O que é um “Filme Estranho”?

Convém relembrar aos leitores o conceito de “Filme Estranho” – “Weird Movie”. palavra inglesa “weird” (estranho) deriva da palavra germânica “wyrd”, que significa “destino”. Essa palavra encontrou o seu significado atual de “estranho, surreal” através de Shakeapeare com as “Weird Sisters” que prediziam o destino de Macbeth, ao mesmo tempo “weird” (“estranhas”) nos sentido moderno quanto “wyrd” no sentido pagão.

Portanto, “weird movie” é muito mais do que um filme “estranho” no sentido dado em português (do latim “extraneum” – o que é de fora, estrangeiro), mas a combinação das ideias do maravilhoso e do fantástico com aquilo que é excêntrico, estranho ou incomum.

Dessa maneira, esse conceito aproxima-se do “gnostic movie” ou filme gnóstico: narrativas cinematográficas onde mostram protagonistas em situações onde a familiaridade usual se reverte em algo não-familiar, “estranho”, acontecimentos que fazem a realidade repentinamente fugir à conformidade cotidiana.

Essa categoria de filmes englobariam também os filmes “mal feitos”, trashs e produções B do passado ou atuais que imediatamente se tornam cults.

10. The Forbidden Room

Uma experiência “telescópica” do diretor canadense Guy Maddin: histórias que se desenrolam dentro de outras histórias, à maneira aquelas bonequinhas russas encaixadas uma dentro da outra. Cenários improváveis como a tripulação de um submarino cujo estoque de ar está acabando porque todos comem furiosamente panquecas – e a massa das panquecas possui pequenas bolhas de ar;  lenhadores aprendizes que tentam resgatar uma mulher que ama bandidos; um bigode do homem que morreu tenta confortar a viúva etc. Tudo começa e termina com um personagem ensinando, para iniciantes da higiene, como tomar um banho.

Por que está “Em Observação”? – Guy Maddin é conhecido por suas experiências estéticas e narrativas – é comum tentar recriar em seus filmes a estética dos filmes mudos, colorização dos antigos filmes em sépia e a estética do expressionismo alemão dos anos 20. The Forbidden Room é o resultado de um projeto de instalações artísticas interativas (Haunting e Seances) onde aleatoriamente foram combinados 100 filmes de curta metragem. Resultando em “conexões paranormais e um todo coerente semi-assustador”, nas palavras de Maddin… estranho!

09. Lost River

Vaiado no festival de Cannes e trucidado pela crítica, esse filme teve um destino injusto em 2015. Estreia na direção do ator Ryan Gosling, foi descrito como “um conto de fadas sombrio”. Gosling criou uma cidade gótica que lembra Louisiana pós furacão Katrina – crise econômica, ruínas e um mistério que envolve uma parte submersa pela construção de uma represa na fictícia cidade de Lost River. 

Por trás das camadas de estilizações da fotografia, personagens e cenografias (que fizeram a crítica chamar o filme de “um David Lynch de segunda mão”), estão alusões à crise econômica dos EUA pós explosão da bolha especulativa de 2008 combinados com misticismo gnóstico: qual o mistério que torna os protagonistas prisioneiros daquela cidade? Uma bicicleta flamejante sem ciclista passando por uma rua deserta na noite é uma das cenas indeléveis do filme.

Filme já analisado pelo Cinegnose em 2015 – clique aqui.

https://www.youtube.com/watch?time_continue=1&v=gGgXZvyFG5M align:center]

8. R100

Um vendedor de móveis japonês paga a uma sociedade secreta para que agenciem mulheres ninjas dominatrix que irão atacá-lo em momentos aleatórios, em público. Mas as coisas começam a ir longe demais quando as mulheres começam a atacá-lo no seu trabalho e até mesmo na sua residência. O filme começa lento e repetitivo, mas constrói um final bizarro fazendo um inacreditável mix entre Lynch e Mel Brooks.

Por que está “Em Observação”? – “Transgressivo, inclassificável e ridículo”. Com essa palavras a crítica vem definindo o filme japonês R100. Uma narrativa onde um homem de negócios tenta romper a rotina triste e cinzenta através de “Clubes de Gentlemen” que prestam serviços de favores sádicos, sexuais e violentos não é uma novidade desde filmes como O Albergue. Mas em R100 inverte-se: o cliente busca o masoquismo – ele que ser humilhado em público por ataques de mulheres ninjas.

7. Deep Dark

Terror independente que em muitos aspectos assemelha-se a outro filme estranho: Quero Ser John Malkovich (1999) de Spike Jonze. Um artista fracassado e humilhado pelo sucesso de seus pares se tranca em um velho apartamento para o tudo ou nada – ou faz uma obra-prima que mude sua carreira ou vai se matar. Até encontrar um misterioso buraco na parede com uma sexy voz feminina que pedirá carícias e bizarros favores sexuais. Em troca, dará inspiração para ele fazer obras que conquistarão o mercado das artes. No passado artistas como Pollock e Warhol teriam sido ajudados por esse misterioso buraco.

Filme já analisado pelo Cinegnose – clique aqui.

[video:https://www.youtube.com/watch?time_continue=1&v=OKxJ1IkdFjQ align:center

6. Reality

O diretor francês Quentin Dupieux trilha o caminho da comédia nonsense em um filme que mostra uma pretensão irônica já em seu título. Na trama Reality é o nome de uma menina que encontra uma fita VHS. Paralelamente, acompanhamos as histórias de um cinegrafista que deseja realizar o seu primeiro longa-metragem e de um apresentador de TV que começa a sentir uma coceira não justificada pelos dermatologistas.

Os questionamentos sobre o que é realidade, o que é ficção e o que é pura imaginação dentro daquele universo vão avançando à medida que os núcleos principais se cruzam. O cinegrafista trabalha no mesmo programa do apresentador de TV, que é assistido pela menina, que por sua vez aparece em um filme produzido pelo mesmo profissional responsável pela aprovação do projeto de longa-metragem do cinegrafista. 

Por que está “Em Observação”? – A crítica afirma que Dupieux brinca de forma humorística com a lógica de filmes como A Origem – a chamada “narrative em abismo”. O diretor é um velho conhecido do Cinegnose (analisamos dele os filmes Rubber e Wrong). Uma curiosa variação do gnosticismo no cinema, sem dramas ou ficção científica. Apenas o humor non sense.

 

Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

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