O estranho mundo crepuscular que envolve os vivos em “O Fantasma da Sicília”, por Wilson Ferreira

“O Fantasma da Sicília” abre para o espectador um estranho mundo crepuscular que envolve o mundo dos vivos: onde o mundo onírico se encontra com o plano astral. 

por Wilson Ferreira

Em 1993 um jovem de 14 anos foi sequestrado pela Máfia siciliana como resposta ao seu pai, ex-membro da organização criminosa, que passou a delatar companheiros para a polícia. “O Fantasma da Sicília” (“Sicilian Ghost Story”, 2017) traz ao cinema essa história de uma forma inusitada, misturando a realidade brutal com fantasia onírica: elementos de romance adolescente, psicodrama gótico, fantástico e suspense político. A namorada do jovem estranha porque todos naquele vilarejo (da polícia local aos colegas de escola) são complacentes com o sequestro. Então ela passa a procura-lo não só no mundo físico, mas também com os olhos da mente. “O Fantasma da Sicília” abre para o espectador um estranho mundo crepuscular que envolve o mundo dos vivos: onde o mundo onírico se encontra com o plano astral. 

Há um mundo crepuscular no qual o mundo físico se encontra com o psíquico e com o astral ou espiritual – pós morte, como queiram. Dada uma conjunção de predisposição psíquica, personalidade e adversidades, qualquer um pode contatar essa dimensão repleta de sincronicidades, arquétipos, formas pensamento além de, claro, humanos mortos ou em projeção astral.

Este Cinegnose já analisou vários filmes ambientados nesse mundo crepuscular: Donnie Darko (2001), Sonhando Acordado (2006), Ink (2009), Branded (2012), a série American Gods (2017-), The Frame (2014), entre outros – veja links ao final dessa postagem.

Mas nada parecido como o filme italiano O Fantasma da Sicília (Sicilian Ghost Story, 2017), uma narrativa que combina elementos de romance adolescente, psicodrama gótico, fantástico e suspense político.

Uma estória vagamente baseada no caso real ocorrido em 1993 sobre um jovem chamado Giuseppe Di Matteo, cujo pai ex-membro da máfia siciliana, começou a delatar seus antigos colegas à polícia. A Máfia reagiu sequestrando Giuseppe e mantendo-o em cativeiro por quase 800 dias.

Os diretores e roteiristas Fabio Grassadonia e Antonio Piazza contam o drama de Giuseppe sob a perspectiva de uma adolescente, colega do jovem e apaixonada por ele. Ela tem dons artísticos com uma imaginação vívida, um comportamento disfuncional e contestador e uma incorrigível tendência de sonhar acordada.

Em outros termos, O Fantasma de Sicília é o encontro de um Conto Fantástico sobre um primeiro amor com um caso real de crime. Um mix de natural e sobrenatural, fantasia e realidade.

Tudo se passa num bucólico e aparentemente pacífico vilarejo siciliano, Sul da Itália: florestas com árvores frondosas, pacíficos lagos e a presença de animais, como uma onipresente coruja que parece observar a todas atribulações humanas.

Há uma realidade mágica circundante, um crime cometido pela Máfia. Mas também um sombrio pacto tanto da polícia local quando dos moradores com a Máfia – tentam ignorar o sequestro, enquanto a jovem apaixonada pelo seu primeiro amor tenta encontra-lo a todo custo.

Também uma estória de inconformismo tanto político como familiar – o próprio preconceito da sua mãe com o Sul italiano.

O Fantasma da Sicília consegue amarrar todos esses diferentes temas, do plano físico ao plano astral.

O Filme

Luna (Julia Jedilowska) é obcecada pelo seu bonito namorado, o jovem Giuseppe (Gaetano Fernandez) da maneira como todos os adolescentes tendem a ficar obcecados. Ela é atraída pela sua aparência arrojada, hipnotizada pelo seu comportamento encantador.

Os pais de Luna, e principalmente a mãe Loredana (Corinne Musallari), mandam ela se afastar de Giuseppe – há algum problema com a família dele envolvendo violência e assassinatos, embora seja uma família rica e com influência local.

Nas cenas iniciais juntos, Giuseppe parece algo intocável, entre um serafim ou uma fada, ao mesmo tempo perto e inacessível. Diferente da visão tradicional, Sicília no filme é mostrada mística, fria e fabulesca: borboletas voam para as mãos de Giuseppe, animais circundam o jovem casal na floresta. Um interlúdio lírico para algo terrível que está por vir.

Está claro que se criou uma relação onde o amor transcendeu para o espiritual. Por isso, para Luna pouco importa quem Giuseppe realmente é.

De um dia para outro, Giuseppe deixa de frequentar a escola. Preocupada, Luna não recebe respostas satisfatórias da família sobre seu paradeiro. Aos poucos, Luna vai percebendo que há algum tipo de cumplicidade de todo aquele vilarejo – simplesmente os professores, polícia e outros colegas da escola estão pouco preocupados com o sumiço de Giuseppe.

Sem a realidade dar uma resposta satisfatória do desaparecimento, a imaginação de Luna começa a assumir totalmente o controle e ela mergulha em um mundo onírico que mistura a realidade com a fantasia que atormenta mas, ao mesmo tempo, mantém a esperança viva.

Luna percebe que as pessoas criam obstáculos e estratagemas e se vê como a única no local a se importar se Giuseppe está vivo ou morto, a única que ousa entrar na escuridão em busca da mais tênue luz.

Símbolos crepusculares: a Lua e a coruja

 

O que segue na estória é menos um encadeamento lógico de eventos do que encontros evocativos em algum lugar entre os sonhos e um plano astral – em muitos momentos, Giuseppe no cativeiro vê-se a si próprio, como se o espírito apaixonado ainda tivesse esperanças, enquanto seu corpo enfraquecido jaz inerte na cama do cativeiro.

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Redação

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