Um país onde o curto prazo mata o futuro

O Brasil não é para principiantes, dizia Tom Jobim.

Nos últimos anos houve uma justa celebração dos avanços obtidos nas últimas duas décadas, passando pela estabilização da inflação, com o Plano Real, pela criação de um mercado de consumo robusto. Louvou-se a continuidade dos governos FHC-Lula-Dilma, divididos muitos mais pela retórica política do que pelas práticas.

Manteve-se a continuidade, com alguns ajustes aqui e ali.

Mas os três governos padeceram e padecem da falta de uma visão estratégica que lhes será cobrada pela história. A principal delas, é a de não ter desarmado a armadilha do câmbio apreciado.

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O período militar legou um país cheio de vícios, sem sociedade civil, amarrado a uma estatocracia sufocante. E uma gigantesca concentração de renda que impedia o deslanche do mercado interno de consumo; a deterioração dos serviços públicos; a incompetência para lidar com a massificação da saúde e da educação. Todos esses vícios decorrentes exclusivamente da falta de democracia, de pressão popular.

Por outro lado, legou uma base industrial sólida, que se completou com os Planos Nacionais de Desenvolvimento.

O segundo tempo do jogo consistiria na montagem da segunda perna – o do fortalecimento dos fatores internos – sem descuidar da primeira – o fortalecimento da produção.

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De lá para cá, uma privatização mal feita tirou a pujança dos setores químico, siderúrgico, de telecomunicações. Permitiu-se que o custo da energia saltasse para patamares elevados. Não se cuidou de resolver os graves problemas da infraestrutura. Aceitou-se a cartelização da economia e não se deu a devida prioridade às pequenas e micro empresas e ao empreendedorismo.

Nesse período, desenvolveu-se um mercado de capitais moderno, um mercado de consumo robusto, uma indústria de fundos que permitiu a formação de uma boa base de poupança interna. Ou seja, todas as peças no tabuleiro para que um grande mestre completasse o ciclo da redemocratização.

Mas dia após dia, ano após ano, mandato após mandato, esses trunfos foram sendo desperdiçados, atropelados pelo dia a dia e pela ausência de um pensamento estratégico.

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Desde a redemocratização, o trabalho da oposição – fosse o PT ou o PSDB – jamais foi o de construir uma alternativa democrática ao governo em questão.

A falta de programas partidários nítidos, de clareza da opinião pública sobre os caminhos do país, não permitiu a montagem de coalizões duradouras. Cada governante montou sua base em cima de troca de favores. E cada oposição montou sua resistência em cima da escandalização mais primária.

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Sem as linhas indicativas do pensamento estratégico, cada um dos presidentes foi conduzindo dentro do mesmo estilo, de matar um leão por dia, resolver a pressão imediata, celebrar um feito ou outro, mas deixando o futuro ao Deus-dará.

Substituiu-se o período de fechamento, de proteção descabida à produção interna por vinte anos de apreciação cambial, de abertura financeira indiscriminada que pouco a pouco está matando as chances de uma economia industrial.

Tenho a ligeira desconfiança que a história não será condescendente com os três presidentes desse período.

Luis Nassif

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