O meteoro Eduardo Cunha, por Alberto Dines

O meteoro Eduardo Cunha

Por Alberto Dines

Do Observatório da Imprensa

Bastaram duas semanas de atuação para que o novo presidente da Câmara dos Deputados exibisse o seu arsenal de atributos como caudilho, oligarca e cacique. Junto, mostrou como funciona uma blitzkrieg política em ambientes dominados pela inércia. Exemplo perfeito das virtudes do voluntarismo onde campeia a apatia. A supremacia da onipotência sobre a impotência, do mandonismo escancarado sobre desmandos sussurrados.

Führer típico, determinado, ídolo dos medíocres, aliado predileto dos pusilânimes. No mostruário de lideranças fornecido pela Revolução Francesa, situa-se entre Georges Danton, o demagogo audacioso e Joseph Fouché, o conspirador-manipulador, eterno sobrevivente, sacerdote capaz de fingir-se ateu para ganhar mais poder. Comparado com antigos parceiros como Collor e Garotinho, é um profissional padrão “intocável”, tal como Daniel Dantas e outros ex-associados.

Eduardo Cunha é, neste exato momento, o político mais poderoso do país. Muito mais eficaz do que o partido que elegeu e reelegeu os dois últimos presidentes, mais safo e esperto do que o presidente honorário da sua agremiação e vice-presidente da República – com uma só cartada converteu Michel Temer em volume-morto e a presidente reeleita, a durona Dilma Rousseff, em figura decorativa.

Mão na boca

Quando operava na esfera estadual metia-se em constantes trapalhadas, chegou a sofrer um atentado e foi acusado de fazer negócios com famoso narcotraficante. Carioca que joga pesado, não brinca em serviço, foi quem descobriu um erro na documentação eleitoral do animador Sílvio Santos e assim tirou-o da corrida presidencial.

Ao ingressar na esfera federal (2003), percebeu o alcance dos novos holofotes, mudou o estilo, guardou a metralhadora, passou a servir-se de fuzis de precisão – não errou um tiro. Em apenas 12 anos, foi alçado ao Olimpo. O ex-presidente Lula não ousa desafiá-lo: recomendou publicamente à sucessora uma reconciliação.

Forte candidato a converter-se no primeiro déspota parlamentar, símbolo das deformadas democracias representativas do século 21 que fundiram o corporativismo de Mussolini com um bolchevismo de direita, messiânico. Preside a Casa do Povo, mas não consegue esconder a forte vocação autoritária e o gosto pelo exercício do poder absoluto. Já passou por três partidos – PRN, PPB-PP e PMDB, este o mais “progressista”. Na verdade é um espécime legítimo da era pós-ideológica, conservador, populista que poderá até proclamar-se parlamentarista para mais rapidamente tomar o poder.

Sua adesão ao ideário evangélico e a obsessão em implementá-lo a qualquer preço faz dele um exemplar calvinista. Como operador, porém, prefere a lógica do capitalismo.

A promessa de impedir qualquer tentativa de regulação da mídia (como deseja parte do PT) nada tem de devoção à liberdade de imprensa. Qualquer projeto que corrija distorções no sistema midiático, por mais leve que seja, passaria obrigatoriamente pela anulação de concessões de rádio e TV a parlamentares e pela proibição de cultos religiosos nas emissoras de TV aberta – largamente utilizados por confissões religiosas, especialmente evangélicas. Na última semana criou um comissariado para unificar a orientação dos diversos veículos da Câmara dos Deputados (jornal diário, rádio, portal e TV).

Além das obsessões e preparo físico, ostenta um desembaraço verbal de radialista, suficiente para não cometer gafes grosseiras. Engravatado, certinho, sem barba nem bigode, óculos leves, passa a imagem de confiável, protetor, bom vizinho, bom burguês, capaz de sonhar com rupturas, mas não com o caos. Numa coleção de dez fotos tomadas já na presidência da Câmara, cinco delas mostravam-no com a mão na boca, truque que até jogar de futebol apreendeu para não ser surpreendido por experts em linguagem labial.

Meteoro fascinante para acompanhar, preocupante como dono do poder.

Redação

10 Comentários

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  1. Tomara que seja mesmo só um meteoro

    Que desapareça tao rapidamente quanto se apoderou do poder do Congresso. Que a Lava Jato sirva ao menos para isso. 

    1. Pois é Anarquista! Há
      Pois é Anarquista! Há algumas semanas trocávamos opiniões sobre o fato de ter a Idade Média acabado há muito… Ledo engano. Eis aí um legítimo representante; não somente pelo que defende e pautará, como também pelo que pode movimentar e causar.
      Quanto à Lava Jato, creio ter sido um erro contar com seus desdobramentos para tira-lo do jogo. Só com a base “aliada” que amealhou no Congresso em duas semanas, cassação de mandato me parece um “sonho de uma noite de verão”. Além disso, depois de fazer o estrago desejado, creio que esta operação não vai resultar em ações concretas de combate à corrupção e nem em revelação e prisão de envolvidos. Prestou-se a dois objetivos – conquistados: governo e Petrobras – e vai virar fumaça pois se aproxima perigosamente dos intocáveis de sempre. Já vi este filme antes. Oxalá eu esteja errada e você, certa!

      1. Concordo com vc mas, provocando…

        Vê que falta faz aqui um humor no estilo Charlie? Nós já tivemos parecido, com O Pasquim. Agora é só mediocridade. 

          1. O momento está difícil, mas espero que melhore

            Nao sou muito do tipo otimista, mas nao é possível que as pessoas realmente queiram o retrocesso. 

          2. O problema é que, por
            O problema é que, por oposição à posição do Governo, a imagem vendida deste Sr. é a de “defensor” dos que o governo está negligenciando.

            Esta imagem não é massificada como de retrocesso e sim como de “retomada de direitos e valores” que o governo – na versão mais branda – não está priorizando.

            Na verdade, “o que” ele esta defendendo vai muito além…

    2. Queimando até virar subnitrato, de pó de merda

      É um meteoro mas com massa CÍNICA, insuficiente para chegar ao solo e fazer algum estrago, vai queimar completamente na atmosfera progressista brasileira, que quer se ver livre de figuras tragicôminas e sujas, como essa CUnha. 

  2. Cunha envolveu-se em

    Cunha envolveu-se em um escândalo de superfaturamento, quando foi descoberto que ele havia assinado um aditivo de US$ 92 milhões a um contrato da Telerj com a fornecedora de equipamentos telefônicos NEC do Brasil (então controlada pelo empresárioRoberto Marinho), em vez de abrir nova licitação.

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