Os efeitos secundários da redução da maioridade, por Janio de Freitas

Da Folha

O projeto previsto

Janio de Freitas

Um efeito secundário que nada tem de secundário, na quase certa redução da maioridade penal para 16 anos, ficou perdido como uma observação passageira que os deputados nem perceberam ou não quiseram perceber. Foi feita pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, em audiência anteontem na Câmara.

Com a redução da maioridade, caem duas autorizações legais hoje restritas aos maiores de 18 anos: os adolescentes de 16 anos poderão dirigir automóveis e consumir bebidas alcoólicas.

O aumento persistente do consumo de álcool por jovens, mesmo com a limitação atual, está considerado como um problema social e urbano inquietante. Não só pela comprovada propensão a gerar vício e suas sequelas, como pela crescente estatística de incidentes de violência praticados por jovens alcoolizados. O problema é comum a muitos países, mas facilitado no Brasil pela ausência total de providências a respeito.

Àqueles dois efeitos pessoais e sociais da maioridade em 16 anos, Cardozo soma o custo jurídico alto da redução. O ministro está entre os que consideram a maioridade penal de 18 anos imutável pelo Congresso, sendo uma das chamadas cláusulas pétreas da Constituição. Logo, a nova maioridade seria motivo de batalha a decidir-se no Supremo Tribunal Federal.

Este aspecto jurídico já está bastante mencionado, porém em vão. A proximidade do PSDB da Câmara com Eduardo Cunha levou ao acordo fácil entre eles e com o PMDB, o que vale, salvo imprevisto, por uma aprovação antecipada de redução da maioridade.

O projeto aprovado nesse acordo é o do senador peessedebista Aloysio Nunes Ferreira, com uma ou outra modificação decidida por Eduardo Cunha e, como sempre, aceita por PSDB e PMDB. Mas permanece um caroço: as prisões dos autores de crimes graves e com 16 ou mais anos serão providenciadas pela União e pelos Estados. Logo, primeiro virá a falta de verba para criar os estabelecimentos, e até que isso se resolva a lei será burlada de um jeito ou de outro. Depois, virá a falta de verba para evitar que as novas prisões sejam masmorras especializadas no aperfeiçoamento criminal de adolescentes e jovens.

E falta algo também central no tema. Os adolescentes condenados não poderão ficar na companhia de criminosos adultos, determina o projeto. Mas haverá condenações de 10 anos, logo, com os tais adolescentes fazendo-se adultos. Isso não está previsto no projeto de Aloysio Nunes Ferreira e nos desejos de Eduardo Cunha.

Continuam os presos todos juntos, contrariando a separação obrigatória? Isso não está previsto.

Se não, em que idades e em que condições dão-se as separações? Isso não está previsto.

Se separados os recém-adultos, vão para as cadeias onde se perderiam em tais escolas de crime, ou o que será feito deles? Isso não está previsto.

Como não estava previsto, mas passa a estar, que a redução da maioridade penal permitirá que adolescentes de 16 anos possam dirigir e consumir bebida alcoólica. 

Redação

20 Comentários

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  1. Cardozo, meu amigo, não ferra

    Cardozo, meu amigo, não ferra com a vida dos jovens: talvez isso seja um dos únicos bons efeitos da redução da maioridade. Aliás, se é para reduzir a maioridade penal, porque não chutar o pau da barraca e estender seus efeitos à maioridade civil? Casar, realizar negócios sem necessidade de emancipação, ter conta corrente …

    1. Me parece justo,

      porque se assim não for estaremos criando uma “classe” de seres humanos com as mesmas obrigações, mas com menos direitos que os outros! 

  2. Enfim, o tiro de misericórdia

    Enfim, o tiro de misericórdia do sistema penitenciário foi dado. Não há espaço físico para receber essa nova leva. E, pelo que vi, entre os crimes que podem levar alguém entre 16 e 17 anos a ir para a cadeia está o tráfico de drogas. Então, só nesse nicho, já se implodirá de vez as cadeias do Brasil. Fora que haverá um aumento da barbárie do trânsito, já que, por lógica, a carteira de habilitação terá que ser dada aos 16 anos. Enfim, no Brasil a política sempre pode piorar o que já é o pior dos mundos. 

    1. Vamos com calma…

      Gente, vamos nos informar antes de criticar: a PEC estabelece que menores entre 16 e 18 anos cumprirão pena em estabelecimento separado: 

      http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/DIREITO-E-JUSTICA/490534-COMISSAO-ESPECIAL-DA-CAMARA-APROVA-REDUCAO-DA-MAIORIDADE-PENAL-EM-CRIMES-HEDIONDOS.html.

      Se começarmos a criticar sem ter informação vamos acabar abrindo o flanco para os autores e defensores dessa proposta.

  3. Tem mais. Se os menos de 16 e

    Tem mais. Se os menos de 16 e 17 anos se tornam maiores, cai também os crimes em que eles são vitimas, como pedofilia por exemplo… Alguém já pensou nisso?????

    1. Não…

      A PEC propõe alterar algumas situações em que o adolescente entre 16 e 18 anos é autor, e não vítima.

      Ponham esse número na cabeça: 16 a 18 anos. Qualquer outra situação acima ou abaixo disso não mudará. E lembrem que o que mudará serve para casos específicos: crimes hediondos, homicídio doloso, lesão corporal grave, lesão corporal seguida de morte e roubo qualificado.

  4. Essa lei só vai produzir mais

    Essa lei só vai produzir mais violência. No trânsito inclusive, como muito bem mostrou o Zé Cardoso, que finalmente faz algo além de repetir placitudes. 

    A tal reforma da constituição que muitos pediam, só tem nos levado para trás no tempo. Estamos assitindo a um verdadeiro filme de horror. “A Constituinte segundo Eduardo Cunha”. Esse cara é a pior coisa que aconteceu ao Brasil nos últimos anos. Pior que isso só se o Aécio tivesse sido eleito junto. Vade retro! 

  5. Pedofilia só será

    Pedofilia só será caracterizada com crianças menores de 16 anos?

    Aos 16 anos, crianças poderão frquentar bares, casa noturnas, boates, prostíbulos, (como prestadores de serviço ou clientes). Poderão dirigir, beber…..  Tudo legal!

    Enfim nossa bancada da bala e da bíblia só nos enche de orgulho!

    Só Jesus Salva!!!!

    1. Vamos com calma…

      A proibição de frequentar esses locais está no ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente. No ECA não foi alterado o conceito de criança e adolescente. O que a PEC alterou foi o limite de imputabilidade para adolescente entre 16 e 18 anos, e em casos específicos (crimes hediondos, homicídio doloso, lesão corporal grave, lesão corporal seguida de morte e roubo qualificado).

      1. O que o Janio diz é que está

        O que o Janio diz é que está aberto o caminho par achegarmos nas situações descritas.

         

        Além disso, sobram bem poucos crimes fora das definições incluídas. Xingar alguém de bobo, por exemplo, está fora, mas acima disso, qualquer crime pode ser classificado dentro das categorias previstas.

         

        1. Então tá…

          Se você acha que dá pra enquadrar furto como roubo qualificado, ou então vias de fato como lesão corporal grave, então tá…

      2. Prezado Alan,

        concordo que a alteração na Constituição não provoca mudanças automáticas nas Leis Ordinárias e Complementares, mas me parece que na sequência virão as alterações nessas leis, até por questão de lógica, se é que se pode esperar alguma lógica desse nosso Congresso. 

        1. Concordo com você


          Mas então esperemos esse momento. Nesse momento precisamos mostrar que temos entendimento da situação, o que a Oposição não tem.

    2. Besteira, venha para o

      Besteira, venha para o nordeste e v. vai ver crianças de 12 às 16 anos já bebendo em bares, fumando cigarros e maconha. Não vai ser a redução da maioridade que vai fazer isso.

  6. Quero ver quando um jovem

    Quero ver quando um jovem branco filho de rico fizer merda, se vai cair na vala comun como os filhos dos pobres, ou se os doutores irão aliviar a barra, por ex. o caso do Indio Galdino.

    1. Mas aí nem precisa ter dúvida…

       Minha resposta é acaciana:  filho de rico é rico, logo será tratado como rico também – as manchetes falarão em adolescente…

      O filho do pobre é pobre e vai ser chamado de bandido mesmo.

  7. Vamos com calma…

    1) Redução da idade pra dirigir: pode ocorrer sim, mas depende de alguma interpretação. A PEC como foi aprovada ontem altera o art. 228 da Constituição Federal, que é o que estabelece atualmente a idade de imputabilidade penal em 18 anos. O que foi aprovado é que essa imputabilidade será reduzida para crimes hediondos, homicídio doloso, lesão corporal grave, lesão corporal seguida de morte e roubo agravado.

    O que define a idade para dirigir, entretanto, é o Código de Trânsito Brasileiro (Lei n° 9.503/1997). Em seu art. 140, I, o Código exige para a pessoa ter habilitação que ela possa ser penalmente imputável. Aí é que entra a interpretação: se eu considerar que a PEC alterou a imputabilidade apenas no caso de cometer aqueles determinados crimes, então o menor entre 16 e 18 anos continua inimputável para os efeitos dos crimes de trânsito – e essa é a razão do Código de Trânsito exigir imputabilidade ao portador de carteira de motorista: poder ser responsabilizado pelos crimes de trânsito. O Judiciário, entretanto, pode vir a pensar de forma contrária e achar que a redução da imputabilidade permitirá ao menor entre 16 e 18 anos possuir habilitação – cabeça de juiz e cartola de mágico, nunca se sabe o que vai sair de dentro…

    2) Redução da idade para consumir alcool: aí eu acho difícil, se não impossível. Até onde vi a PEC altera o conceito de imputabilidade penal, para determinados crimes, mas não altera o conceito de criança e adolescente expresso no Estatuto da Criança e do Adolescente, (Lei n° 8.069/1990), em seu art. 2°, que define criança como a pessoa de até doze anos incompletos e adolescente aquele entre doze e dezoito anos de idade. Digo que não altera esse conceito legal porque a própria PEC trata o criminoso entre 16 e 18 anos como “adolescente” e por prever que ele cumprirá pena em ambiente separado dos maiores de dezoito anos.

    O que define a idade legal para consumir alcool é o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 81, II, que proíbe a venda de bebida alcoolica a criança ou adolescente, combinado com o art. 243 da mesma lei, que estabelece pena de 2 a 4 anos de detenção a quem vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar ainda que gratuitamente bebida alcoolica a criança ou adolescente.

    Assim, como a PEC não altera o conceito legal de adolescente, penso que não vai reduzir a idade pra consumir alcool dos atuais 18 anos para 16. E tal como no caso da carteira de motorista, o Judiciário pode muito bem achar o contrário, se analisar o caso, e liberar bebida alcoolica pra adolescente entre 16 e 18 anos;

    3) Extinção do crime de pedofilia: eu acho essa impossível. A PEC só alterou a imputabilidade entre 16 e 18 anos para alguns crimes, não alterou o crime de estupro de vulnerável previsto no Código Penal, e nem as disposições sobre maior de 14 e menor de 18 anos do mesmo Código Penal. Ou seja, alterou a situação do adolescente como autor (em determinados casos), e não como vítima.

  8. maioridade

    kkkkkkkk. Como se jovem de 16 anos já não ingerisse bebida alcóolica. Tem que responsabilizar mesmo. Qualquer país sério é assim. 

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