Para entender Eduardo Cunha, por Victor Hugo Agudo Romão

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Por Victor Hugo Agudo Romão

Para entender Eduardo Cunha

A vitória acachapante de Eduardo Cunha para Presidente da Câmara explicitou um processo que ocorre desde o início do 1º governo de Dilma Rousseff: o de fortalecimento do lobby empresarial no legislativo brasileiro.

Dilma buscou enfraquecer a velha política. As emendas parlamentares foram distribuídas a conta gotas, os ministros tinham a tutela de secretários-executivos da confiança da presidenta e pouco podiam se manifestar, feudos importantes nas estatais foram desfeitos. O PAC reduziu a importância dos parlamentares na negociação de grandes obras, pelo menos para a maioria do congresso. O RDC (Regime Diferenciado de Contratação) reduziu a discricionariedade do gestor especialmente em pequenas e médias obras.

Nem mesmo a arte de simular influência, tão comum na política, foi permitida aos congressistas. Não havia carona no avião presidencial e a sonhada foto do parlamentar descendo do avião em sua base ao lado de um presidente da república. Dilma pouco recebia os congressistas no Palácio do Planalto e eram raras as fotos ao seu lado.

Ao mesmo tempo que Dilma enfraquecia os instrumentos tradicionais de política, não houve um esforço para estabelecer uma nova forma de se fazer política no legislativo. Poucas foram as vezes que um parlamentar progressista pôde discutir com a opinião pública um tema relevante, com a rara exceção de Alessandro Molon (PT-RJ) no debate sobre o Marco Civil da Internet.

Pauta positiva não faltou: endurecimento da legislação de lavagem de dinheiro, reforma da previdência do setor público, punição para empresas corruptoras, PEC das Domésticas e cotas em universidades públicas e no serviço público são apenas alguns exemplos. E qual foi a exposição de parlamentares nesses debates?

Como na política não há vácuo, o espaço foi preenchido pelos lobbies empresariais articulados por grandes escritórios de advocacia. Hoje, muito mais que atuar no judiciário, esses escritórios oferecem soluções jurídicas a seus clientes, estejam elas no Poder Judiciário, no Legislativo ou no Executivo.

Eduardo Cunha, aliado a esses grandes escritórios, ofereceu a saída política e financeira ao congresso, especialmente no financiamento de campanhas eleitorais que chegaram a custar de R$ 10 milhões a 15 milhões na disputa para a Câmara dos Deputados.

Não houve tema de relevância econômica que Eduardo Cunha não tenha participado das negociações: desonerações da folha de pagamentos e dos investimentos, novo prazo para o Refis da Crise, perdão das multas aplicadas pela ANS, tributação de empresas coligadas no exterior entre outras.

Na articulação sobre as desonerações que chegaram a R$ 100 bilhões por ano, Cunha deu um verdadeiro baile no Governo. Desorganizado, o Governo não montou um modelo lógico de negociação com o Congresso. As MPs eram enviadas sem que os parlamentares fizessem sugestões de setores a serem incluídos nas desonerações dentro de critérios estabelecidos pelo Governo. As demandas dos parlamentares eram acatadas no Congresso sem contraponto do Governo, mas posteriormente vetadas. Na apreciação dos vetos, os setores com maior poder de pressão política eram incluídos na MP seguinte.

Se fosse um Delfim Netto negociando uma quantidade tão grande de desonerações, teria saído Presidente da República. Contudo, como grande parte das desonerações havia sido obtidas “na marra”, não houve ganho legislativos para o Governo e o Ministro Mantega foi demitido durante o processo eleitoral, sem o apoio de um único setor digno de nome.

O resultado das eleições legislativas foi fruto desse processo. O PT perdeu 30% de sua base parlamentar na Câmara, houve uma enorme fragmentação política e o domínio do PSB se deslocou para lideranças de direita.

O cenário já era adverso e a articulação política colecionou tropeços.

Dilma nomeou para a articulação política o deputado Pepe Vargas (PT-RS), da minoritária tendência petista Democracia Socialista. Esta tendência também emplacou os nomes de Henrique Fontana (PT-RS) como líder do governo na Câmara e Miguel Rossetto (PT-RS) como Secretário-geral da Presidência da República. Estes são nomes de primeira grandeza, com boa capacidade de discursar e interesses republicanos. No entanto, não possuem a capacidade de articulação necessária para estes cargos.

Na Casa Civil, foi mantido Aloizio Mercadante que é uma espécie de Serra do PT, com incrível poder de desagregação. Mercadante busca o monopólio da interlocução com a presidenta, buscando desgastar eventuais concorrentes. Contudo, foi o responsável pela articulação nas maiores derrotas dos governos petistas: a queda da CPMF quando era líder do Governo e agora na eleição da mesa diretora da Câmara dos Deputados.

Mesmo distribuindo uma enorme quantidade de cargos a figuras pouco recomendáveis, a articulação política encabeçada por Mercadante não evitou a humilhante derrota Câmara.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

6 Comentários

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  1. Já deram entrada na

    Já deram entrada na beatificação do Eduardo Cunha?

    Pois é……Basta se apresentar como opositor ferrenho, ou até mesmo suave ao governo, seu partido e hierarcas que qualquer escroque, tal esse atual presidente da Câmara, de ficha mais suja que pau-de-galinheiro com os galináceos sofrendo de diarreia, passa a ser tratado com mesuras dignas de um herói. 

    O Ricardo Noblat hoje se derrama, ou se derrete em elogios ao danado. 

    Mais um que entra – gloriosamente – para o panteão do cinismo dessa imprensa…Deixa para lá.

    1. Vale a pena entender mais os políticos e a política

       

      JB Costa (quarta-feira, 04/02/2015 às 11:00),

      Eu creio que precisamos entender os outros com ideologia diferente da nossa. Não precisamos admirar a ideologia do outro para o admirar ou o respeitar ou o considerar como capaz.

      O Eduardo Cunha não pode ser tratado pela ficha suja dele. A ficha suja de alguém deve ser vista como a anomalia e a anormalia da política brasileira. Ninguém deveria ser considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença. Talvez a reversão da atual realidade com a existência da legislação da Ficha Limpa demore a acontecer, mas a realidade do império da justiça que existe em todo país democrático voltará a acontecer no Brasil e a ficha limpa deixará de existir. Talvez com mais decisões como a do ministro Dias Toffoli no caso de Maluf esse erro possa ser vagorosamente corrigido e vai cair a ficha de quem defendeu o Ficha Limpa e reconhecer o erro em transformar meia justiça (Decisão não transitado em julgado) em justiça inteira.

      Se Eduardo Cunha cometeu algum crime ele deve ser julgado por isso. Se ele apenas tem uma ideologia diferente da sua você pode fazer propaganda contra ele, mas não o acusar de ficha suja. Você vai defender a sua ideologia e mostrar como a ideologia de Eduardo Cunha por ser uma ideologia de direita representa o atraso.

      Agora, é preciso entender também porque Dilma Rousseff é a presidenta do Brasil. Ela está lá porque Lula quis. E Lula quis transformar Dilma Rousseff em presidenta para que ela pudesse fazer exatamente o contrário do que ele fez. Lula negociou bastante. A presidenta Dilma Rousseff é contrária a negociação. Vai ser assim os próximos quatro anos do governo dela. A menor negociação possível.

      O texto de Victor Hugo Agudo Romão deixa bastante claro. Com o PT enfraquecido, a presidenta Dilma Rousseff não foi para a negociação, mas sim para o enfrentamento e utilizando pessoas qualificadas para esse enfrentamento. E pessoas com a mesma ideologia. É uma ideologia que só não atingiu o Ministério da Fazenda. Só que quem foi para o Ministério da Fazenda, embora de ideologia diferente não é alguém capaz de negociação, ou seja, é alguém escolhido para compor o grupo do enfrentamento. É assim que se vai desenrolar todo o segundo governo da presidenta Dilma Rousseff. É claro que ela não vai ao desabrigo para o enfrentamento. Ela tem Lula e tem de certo modo o Senado e o STF.

      O que a eleição de Eduardo Cunha revelou é que o PT é um partido minoritário no Congresso Nacional. Sendo assim, deve ser visto como um absurdo o PT como partido que não elege 15% dos deputados esteja ha 12 anos ocupando a presidência da República. Vamos reconhecer que é preciso muita competência para isso. E olha que se trata de uma competência de um partido que, salvo o Lula, praticamente não tem um político com carisma. Em sistemas presidencialistas, em uma democracia representativa com eleições presidenciais majoritárias diretas em dois turnos, permanecer na governança do país por tão longo tempo significa realizar uma obra de arte nunca alcançada em nenhum lugar do mundo. Talvez outro caso semelhante seja o de Putin na Rússia. Lá, entretanto, tem-se um conservador que representa muito bem a ideologia média do povo russo. Há casos isolados como na Bolívia, mas se trata de um país pequeno e muito pobre. Aqui no Brasil, o presidente além de ser do partido minoritário é também de uma ideologia de esquerda, como na Bolívia, mas com a diferença do grau de desenvolvimento e do tamanho e da população. E a ideologia de esquerda tem se mostrado minoritária na maioria dos países democráticos do mundo.

      Clever Mendes de Oliveira

      BH, 04/02/2015 (Em Pedra Azul – MG)

  2. A NENHUM ponto dos ultimos

    A NENHUM ponto dos ultimos anos eu ja ouvi falar de Mercadante como “desagregador” nem no blog e muito menos no resto da media brasileira, e nao existe literatura nenhuma sobre o assunto.

    Quanto a isso:

    “Não houve tema de relevância econômica que Eduardo Cunha não tenha participado das negociações: desonerações da folha de pagamentos e dos investimentos, novo prazo para o Refis da Crise, perdão das multas aplicadas pela ANS, tributação de empresas coligadas no exterior entre outras”:

    “Participar” nao eh “sabotar”, e de acordo com tudo que ja se discutiu antes aqui, ele sabota planos de governo exceto se eles sabotam a sociedade, isso eh, ele so vota favoravel em planos tucanos.  O historico de votos dele mostraria muitissimo bem isso, mas eu nao sei nem procurar, mas…  mas nao preciso.

  3. O que ressalta no texto é a

    O que ressalta no texto é a radiografia  do medíocre Mercadante. Com tanto talento político a seguir, o cara escolheu o modelo Serra. Francamente!  Quanto a Cunha, deixem que o coloquem nas nuvens, que lhes dem asas. O voo será curto e rasteiro. Tem cacique demais no congresso e o Cunha, serve para o momento. Será defenestrado no devido tempo.

  4. dilma lutou para enfraquecer

    dilma lutou para enfraquecer esse fisiologismo histórico,

    que acabou vencendo a disputa.

    valeu pela dignidade e a tentativa de minorar essa chaga histórica.

    portanto, o jogo foi jogado e os lados são conhecidos.

    optar por um ou por outro tb é uma questão de dignidade

    e defesa de transformações politicas importantes….

    reforma política já, com participação popular,

    especialmente dos movimentos sndicais e sociais!

    ou então é entregar o ouro pro bandido!!!

  5. Integridade

    Quem poderia explicar a reeleição de Dilma? O PT, velho, não aguenta ela, José Dirceu, Marina, Suplicy, dá pra encher um rosário. Como se explica que pessoas como Luciana Genro, ex-PT, tenha, de certa forma, demonstrado na última eleição certo apreço pela Dilma? Quem são os eleitores de Dilma? Aqueles do Lula? Eu votei na Dilma, mas nunca associando a Lula. Votei numa pessoa que talvez não seja a mais brilhante do mundo, talvez seja uma pessoa que tenha dificuldade de se comunicar, talvez não seja uma pessoa empática. Mas então porque as “zelites” utilizando todos os meios não derrotaram ela?

    Quem quiser encontrar a resposta poderá ir à capa da última Veja antes da eleição. Por que como presidenta, ex Ministra de Minas e Energia, ex-presidente da do Conselho da Petrobrás, a Veja não conseguiu colocar Dilma, corrupta, sozinha na capa? Por que Serra e Aécio não a derrotaram? Integridade!

    Queira ou não o Nassif, Paulo Henrique Amorim ou kotscho vão ter que engolir mais uma. Ou talvez eles ainda vão concluir que ela ganhou por falta de articulação política.

    Ela vai limpar varrer, os larápios da Petrobras, quem faria isto se não fosse ela e Foster? Alguém vai pagar o Pato, será Foster, fez em nome da honestidade. O Lula faria esta limpa? Ou seremos 50 milhões de bovinos?

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