A bobagem da “escola sem partido” pode ter efeitos positivos, por Marcos Villas-Bôas

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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A bobagem da “escola sem partido” pode ter efeitos positivos

por Marcos de Aguiar Villas-Bôas

A racionalidade humana predominante desde a Grécia Antiga e principalmente a partir do século XVIII está pautada no raciocínio lógico-dedutivo, aquele que constrói por operações lógico-formais conclusões particulares a partir de premissas gerais e que supõe não ser possível existir “a” e “não-a” ao mesmo tempo, regra lógica pinçada da obra de Aristóteles.

Juntamente com essas ideias caminha a noção de que existe uma única resposta correta para as nossas perguntas e de que o objetivo humano é encontrá-la.

A linguagem como instrumento de referência ao mundo e a verdade como correspondência entre o que é dito e o que existe são visões mais atribuídas a Platão.

Os gregos antigos não eram, contudo, muito preocupados com a sistematização das suas ideias. Eram provocadores e refletiam sobre os mais variados assuntos, às vezes, com perspectivas distintas.

Os próprios Platão e Aristóteles tinham visões variadas sobre o conhecimento. O primeiro usou largamente da dialética, apesar da sua visão sobre a verdade, e o segundo escreveu um livro inteiro sobre retórica, no qual defendia a possibilidade de diferentes respostas para um único problema, apesar das suas conclusões sobre lógica formal.

Os seres humanos, em regra, usaram as ideias mais fáceis das obras dos gênios gregos, que eram muito avançados para o seu tempo e até mesmo para os seguintes. É até natural que seja absorvido e difundido aquilo mais acessível em cada tempo.

A verdade por correspondência de Platão e as três regras da lógica formal de Aristóteles influenciaram o Cartesianismo de René Descartes e Isaac Newton.

Para se contrapor à visão dedutiva de Descartes, propôs-se uma indutiva, mais adotada por Francis Bacon e Galileu Galilei. Enquanto aquela parte do geral para chegar a respostas para problemas particulares, a última parte do particular para chegar às conclusões verdadeiras, gerais e abstratas sobre ele, focando mais na experimentação.

Com base nessas noções limitadas, foi construída a educação de boa parte do mundo ocidental, pautada na acumulação de verdades (enciclopedismo e memorização) e na aquisição de aptidão para chegar a elas (raciocínio lógico-formal).

Esse tipo de educação aprisiona a mente, pois leva a uma limitada bidimensionalidade de pensamento. Acreditando que há verdades e escolhas certas, pensa-se que cabe verificar quais são elas dentre as duas hipóteses existentes (dedutivo ou indutivo, PSDB ou PT, Capitalismo ou Socialismo, ovo ou galinha etc.) e, assim, termina-se caindo em limitadas crenças quase religiosas sobre tudo no mundo.

Qualquer argumento pode ser defendido dentro de uma lógica formal, bastando que as conclusões façam sentido para as mentes humanas com base nas premissas que lhe geraram. Essa formalização do discurso neutraliza aspectos como justiça e pragmática, permitindo todo tipo de manipulação, como é a própria proposta atual de “escola sem partido”.

Essa forma de compreender teve sua utilidade do Renascimento em diante, quando se começou um maior desenvolvimento científico e a criação de inúmeras disciplinas, afastando o conhecimento de premissas metafísicas impostas pelas crenças religiosas.

A Modernidade foi (ou tem sido, para quem assim preferir) o período da ciência e do apego ao rigor formal. Inúmeros avanços ocorreram, porém, para que a maioria dos humanos possa viver melhor, ainda é preciso avançar muito mais.

O uso da lógica formal permitiu evitar, por exemplo, contradições internas ao discurso, mas enrijeceu demais o pensamento e está atrasando o progresso, que costuma exsurgir de sistemas de ideias mais dinâmicos e complexos, como o Evolucionismo, a Física Quântica, a Cibernética e a Teoria dos Sistemas Complexos.

Uma das melhores saídas que surgiram até o final do século XIX para o modelo dualista reducionista foi a dialética, que teve Hegel e Marx como expoentes na Modernidade.

A obra de Marx, desde a ideia de luta de classes, está toda pautada na disputa entre dois lados que resultará em algo “novo”, em uma síntese desses dois opostos, que deve continuar fazendo parte de outros raciocínios dialéticos rumo ao progresso constante que teria um dia um fim.

Ao se entender a dialética de Marx e visões mais complexas hoje já disponíveis, percebe-se que a ideia de luta de classes é limitada, especialmente para explicar a sociedade de hoje, muito mais complexa do que aquela da Europa no século XIX.

Por fins ideológicos, muitos querem impedir que Marx seja ensinado nas escolas, quando ele poderia, por exemplo, ser usado como fundamento para uma ideia de “escola sem partido” muito melhor do que aquela hoje em discussão.

Ironicamente, o odiado Marx, cujo trabalho revolucionou a Filosofia, a Sociologia, a Economia e outras disciplinas, indo muito além do Comunismo e do Socialismo, soluciona a discussão da “escola sem partido”, mostrando que não existe pensamento sem ideologia e que há sempre pelo menos duas perspectivas opostas sobre algo.

Com a dialética, ultrapassa-se a bidimensionalidade para se chegar à tridimensionalidade, pois ela conjuga os dois lados que disputam, e não apenas escolhe entre eles. O embate entre dois lados dá origem a uma terceira posição que é uma síntese deles dois e, assim, podem haver novas sínteses adiante decorrentes do embate com outras ideias opostas.

A dialética transgride, portanto, as dualidades reducionistas, representando um avanço no pensamento humano e um caminho para se chegar ao pensamento complexo. Infelizmente, no entanto, a maioria dos humanos ainda nem sequer usa adequadamente a dialética.

Roberto Mangabeira Unger propõe há algumas décadas que todo o ensino deveria ser transmitido com a apresentação de duas ou mais posições contrastantes, permitindo a livre escolha do estudante e um espaço para que ele faça suas sínteses.

Em suas aulas em Harvard, é muito comum Mangabeira convidar professores com visões distintas das suas para oferecer aos alunos novas perspectivas sobre os problemas.

A discussão sobre a bobagem que é a proposta atual da “escola sem partido” pode terminar sendo uma boa oportunidade para o debate sobre as formas de ensino. Não há educação sem ideologia e, portanto, a “escola sem partido” é, em si, um engodo político, até porque o importante é exatamente o contrário: o estudante entender todos os partidos.  

Em vez de tentar neutralizar discussões ideológicas, políticas e afins na escola, deveria haver o oposto: uma preparação dos estudantes para a vida política do seu país por meio de mais discussões desse tipo, porém sempre apresentando as diferentes posições existentes, deixando o aluno livre para decidir por qual escolher e estimulando que ele aceite até mesmo mais de uma perspectiva ao mesmo tempo, seja realizando sínteses, seja abrindo a consciência para diferentes planos de realidade que admitam “a” e “não-a” conjuntamente.

O curso sobre justiça de Michael Sandel em Harvard[1] é uma boa pista de como começar a trabalhar com os alunos questões ideológicas difíceis sem pressioná-los a seguir um caminho específico.

Há, todavia, como desenvolver ainda mais a ideia de dialética. Niklas Luhmann falava numa pós-dialética, acrescentando a noção de autorreflexividade das teses e antíteses. Para ele, teses, antíteses e sínteses se inter-relacionam e modificam umas as outras, como numa interação de sistemas autopoiéticos.

Ao contrapor opostos, termina-se percebendo que há um pouco do outro em cada um, ideia defendida por Nietzsche no século XIX e que está mais bem integrada à racionalidade humana oriental do que à ocidental.

O pensamento humano não evolui de forma linear como sugere a dialética, descendo de teses e antíteses a sínteses sucessivamente. Como propôs Luhmann, elas estão em constante inter-relação. É possível, todavia, avançar ainda mais, pois ele não considerou o fato de que há diferentes níveis de consciência e de realidade, gerando múltiplas perspectivas sobre teses, antíteses e sínteses.

Há, então, entre teses e antíteses, diversas graduações de teses e antíteses, que já são as próprias sínteses delas. Todas essas perspectivas estão em inter-relação e são percebidas pelos indivíduos de acordo com o nível de complexidade da consciência de cada um deles. As sínteses ficam latentes, passam a ser percebidas por poucas mentes, aparecendo em alguns discursos, levando tempo para serem proliferadas amplamente.

Elas não estão em baixo ou em cima umas das outras, não se devendo tentar enxergar o pensamento humano de forma mecânica ou determinista. Eventuais graduações das teses e antíteses poderiam ser realizadas, talvez, de acordo com o nível de complexidade delas e da necessidade de maior capacidade “consciencial” para compreendê-las. O fato é que todas se inter-relacionam por estarem se referindo ao mesmo problema.

Existem partes do conhecimento que apenas são captadas por indivíduos com consciência mais avançada. É por isso que a educação humana deve ser uma preparação para o pensamento complexo, para a elevação do nível de consciência e compreensão dos estudantes, e não a transmissão de meras informações pobres a serem memorizadas.

Ao longo da história, é possível perceber que o ser humano foi lentamente acrescentando novas dimensões ao seu pensamento. Na medida em que eles evoluem e as consciências avançam, é viável progredir ainda mais rapidamente do que antes. Se esse é o caminho do progresso, nossa tarefa é acelerar o seu passo.

A tarefa da educação deve ser funcionar como um catalizador democrático do progresso, difundindo avanços de consciência por meio do desenvolvimento intelectual e moral de todos os indivíduos, independentemente de onde nasçam, de faixa social, cor, sexo etc.

A educação do futuro é transdisciplinar, uma que foque tanto nas partes quanto nas inter-relações, que transgrida dualidades e consiga enxergar temas não apenas em teses, antíteses e sínteses, mas em transdimensionalidade, nos conjuntos delas em inter-relação.

As disciplinas existem com suas fronteiras, mas boa parte do programa deve ser preparado em conjunto pelos professores, para que eles ensinem os temas não somente por perspectivas ideológicas contrastantes, porém com os diferentes focos disciplinares inter-relacionados em sala.

Para preparar indivíduos intelectualmente livres, tolerantes, profundos, deve-se dar mais importância às inter-relações, não somente das ideias e das disciplinas, mas das ideias com os fatos, afastando visões puramente dedutivas ou indutivas.

As ideias compõem um emaranhado, uma rede de diferentes perspectivas fundamentadas sobre problemas, muitas vezes com várias respostas aceitáveis para eles, dependendo dos pesos colocados.

Quanto mais perspectivas o indivíduo tem ao seu dispor, mais condições tem de raciocinar com profundidade. É por isso que pessoas com mais experiências em situações diferentes, como aquelas que viajam bastante para aquisição de conhecimento, conseguem, em regra, enxergar o mundo de forma muito mais complexa do que quem vive preso à sua zona de conforto.

O avanço do ensino intelectual deve ser acompanhado, imprescindivelmente, de avanços no ensino moral. Apenas com maior capacidade de aceitação de ideias contrárias, de comportamentos diferentes e assim por diante é possível não criar barreiras de preconceito ao conhecimento.

A empatia e outras capacidades de cunho moral e emocional são essenciais para desenvolvimentos de consciência que permitirão o aprofundamento intelectual, ajudando a encontrar saídas melhores para os problemas.  

Um aluno que estude, por exemplo, história da religião desde bem jovem, tendo aulas com participação conjunta de um professor de História, um de Sociologia e um de Filosofia, entendendo como cada religião evoluiu, como elas se aproximam e se afastam, tende a crescer mais tolerante, apto a viver como um ser espiritualizado sem se entregar a dogmas e a pessoas que usam a fé para proveito individual.

Há modelos transdisciplinares sendo aplicados nos países nórdicos, sobretudo na Finlândia, e dando certo. Nas melhores universidades do mundo, modelos que lhe são prévios já são um sucesso há muito tempo.

A Transdisciplinaridade busca aproximar os cidadãos do mundo, incentivando maior inter-relação e uma visão de pertencimento humana ao Planeta Terra, não limitada aos nacionalismos, que tantos problemas causam.

Ela se abre para a espiritualidade, trazendo para o cerne do conhecimento problemas metafísicos e buscando um estudo de Ciência Natural do espírito, da reencarnação e de outros assuntos que são compreendidos como religiosos e fantasiosos, tendo se tornado tabus na visão cientificista materialista da Modernidade.

É preciso que propostas avançadas comecem a aparecer no Brasil. Quando não surgem ideias que andam para o lado ou dão passos muito curtos, aparecem bobagens enormes como a “escola sem partido”, que não é só consequência de ignorância, mas de má intenção, pois tem, por ironia, fins extremamente político-ideológicos.

Para que o Brasil possa crescer, necessitamos de uma população com mentes avançadas. A nossa educação não está sequer entre as 50 melhores do planeta, mesmo apesar de termos o 7o maior PIB.

Um dos principais problemas do nosso país é a falta de produtividade e de honestidade, consequências do baixo nível intelectual e moral da nossa população, quando o objetivo maior dos humanos, além de se conectarem por laços de amor, é ascenderem intelectual e moralmente.

Estamos errando, sempre estivemos e a ideia de “escola sem partido” hoje em discussão, aquela de proibir a apresentação de perspectivas ideológicas em sala de aula, é uma bobagem tamanha, mas que pode ser a deixa para solucionarmos alguns problemas gravíssimos. 

Se a “escola sem partido” se tornar uma séria orientação para que professores não defendam ideologias em sala de aula, mas que tentem apresentar aos alunos ao menos as principais perspectivas existentes, ensinando seus pontos positivos e negativos, estimulando-os a inter-relacioná-las e até a chegar a novas perspectivas, isso poderá mudar a educação do país.

Para chegar a esse objetivo, é preciso também preparar os professores para essa nova realidade e, por meio de avaliações constantes e de remuneração mais digna, atrair profissionais melhores, além de qualificar aqueles já existentes.

O Brasil tem problemas demais e suas políticas públicas são muito atrasadas. Se há algo, no entanto, que liga todas elas e que pode melhorar o país drasticamente é a educação. A discussão sobre a “escola sem partido”, se deixar de ser uma guerra político-ideológica e for tratada com seriedade, pode ser o começo de uma estrutural mudança positiva na educação brasileira.

 

Agradecimento: ao amigo David Carneiro pelos comentários sobre o texto.


[1] https://www.youtube.com/watch?v=EC5rEhbH-fI&list=PLzLT0UmFh7xTqkVxTSTy85sgoA-VUy8JC

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

7 Comentários

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  1. Vou jogar meu computador na

    Vou jogar meu computador na fogueira…. O cara é a favor do maxismo, quer a escola partidarizada e ainda defende uma solução que começa com o prefixo “trans”!!!

    *** torço para que o atual momento desague em discussões positivas, inclusivas e tolerantes, e que essa horda com espiritualidade da idade média, slogans do século XIX e preferência por mais policiais e menos escolas passe logo ***

  2. Isso pode e deve ser feito sem o escola sem partido

    “Se a “escola sem partido” se tornar uma séria orientação para que professores não defendam ideologias em sala de aula, mas que tentem apresentar aos alunos ao menos as principais perspectivas existentes, ensinando seus pontos positivos e negativos, estimulando-os a inter-relacioná-las e até a chegar a novas perspectivas, isso poderá mudar a educação do país.”

    A ideia de que o escola sem partido pode ser utilizado para outro fim a não ser que o previsto, é uma baboseira muito grande. 

    A estruturação do ensino brasileiro, das carreiras de professores, dos materiais e métodos de ensino, não são apenas locais em sua materialidade, mas totalmente distonantes mesmo dentro dos espaços municipais. 

    A abordagem de um autor de viés (classificado pela secretaria de educação local), será feita diferentemente, numa OSs de empresários particulares, numa OSss militarizada, num colégio público com “gestão compartilhada”, num colégio público (católico, protestante, bercário da comunidade, supletivo) isso sem falar em todas as questões abordadas pelo autor, desde a preparação do professor, ao salário pago a este. 

    Portanto, as soluções que poderiam transformar este projeto num cavalo de tróia para a emancipação intelectual das crianças e jovens, depende da mudança do ensino dos professores e da valorização da profissão, condições que propiciariam a esse embuste um final feliz, mas a condição que destroi essa concepção é essencial, pois essa transformação se daria apenas e somente se as mudaças fossem efetuadas anteriormente à vigência da lei.

    Num país onde não se tem ideia de quem é Milton Santos, Darcy Ribeiro, Prestes… eu que em toda minha educação, da fundamental à pós graduação, não vi nenhuma das personalidades acima serem citadas, muito menos Marx, nenhuma vez, nem como exemplo do capeta,  nem por engano. Me lembro do ensino médio onde uma vez um professor citou Erasmo de Roterdã e disse que existia uma vanguarda intelectual por trás de Lula, isso em 1998. Me recuso a aceitar que ocorrera qualquer mudança no ensino nestes últimos 16 anos, de forma a tornar corrente à juventude o conhecimento sobre essas pessoas. Não sabem quem são, se sabem aprenderam pela CBN, Veja ou mesmo quem diria, no Facebook.

    Se aprendem na faculdade, num curso de humanas, isso se restringe às federais, com professores pelegos, que não dominam, ou que dominam mas são donos dos autores, amarrando o conhecimento. Daí não é escola sem partido, é curso de graduação em humanas sem bibliografia.

    Marquês de Say, Kant, Kelsen, Hegel (só por cima, muito subversivo), Foucault como desconstrutivismo sem nenhum background de sua vida… E ainda usei para pesquisa os livros de Gilmar e Capez…

    A lei tem cunho fascista, pois é intepretação corrente e propagada que ser conservador é mera manutenção do status quo, ou que é científico, ou que é o que funciona… e portanto não é ideologia, e não dizer o contrário é o motivo central e força motriz para o processo de aprovação desta.

     

    1. resposta ao Des.

      Muito boa, a sua análise.  Também, tenho uma licenciatura na Federal que não me ensinou nada de política, o que sei,  aprendi com minhas leituras posteriores e nos movimentos sociais. 

      1. A única vez que ouvi da boca de um professor, o nome Freire.

        Foi recentemente, de um renomado professor de português local, quando ele disse que o sistema de decoreba utilizado no ensino fundamental era freireano. Pelo menos com o escola sem partido ele não vai mais poder repetir uma asneira dessa, não por ser asneira, mas por estar proibido de citar o nome do capeta. 

  3. Exato! Ao invés de

    Exato! Ao invés de simplesmente cortar todas as ideologias. O estado tem que provocar o estudo de todas a ideologias, para encontrar a melhor ideologia para todos.

  4. É muito para mim o campo filosófico que você adentrou

     

    Marcos de Aguiar Villas-Bôas,

    Recentemente dei uma de sabichão e sentei o pau no texto seu que virou o post “As eleições de 2018 e o “risco Lula”, por Marcos Villas-Bôas” de quinta-feira, 28/07/2016 às 08:19, e que pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/noticia/as-eleicoes-de-2018-e-o-risco-lula-por-marcos-villas-boas

    O comentário meu bem crítico ao que você escrevera fora enviado quinta-feira, 28/07/2016 às 18:21. Achei o conteúdo do post “As eleições de 2018 e o “risco Lula”, por Marcos Villas-Bôas” muito rastaquera. E nele eu observava que a má qualidade dos seus textos não era novidade, pois achara também ruim o post “Populismo: um mal de direita e esquerda, por Marcos Villas-Bôas” de terça-feira, 24/05/2016 às 10:57, aqui no blog de Luis Nassif e com texto também de sua autoria e que pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/noticia/populismo-um-mal-de-direita-e-esquerda-por-marcos-villas-boas

    Aqui, entretanto, eu não posso ir pelo mesmo caminho. Diante de um texto tão profundo, eu tenho que reconhecer que você foi muito além da minha capacidade de compreensão. Tenho que recolher a iminha insignificância. Não bato em retirada porque houve três parágrafos já ali no final do seu texto em que salvo pequenas dúvidas pude mais bem compreender. Transcrevo-os a seguir.

    No primeiro você fala sobre o aumento do conhecimento para os que vivenciam diferentes paragens. Diz você:

    “Quanto mais perspectivas o indivíduo tem ao seu dispor, mais condições tem de raciocinar com profundidade. É por isso que pessoas com mais experiências em situações diferentes, como aquelas que viajam bastante para aquisição de conhecimento, conseguem, em regra, enxergar o mundo de forma muito mais complexa do que quem vive preso à sua zona de conforto”.

    Uma confirmação disso é o que nos ensina Konstantinos Petrou Kavafis no poema “Itaca” e que pode ser visto no post “Ítaca, do Poeta Konstantinos Petrou Kavafis” de domingo, 09/02/2014 às 10:11, aqui no blog de Luis Nassif e oriundo de sugestão de Jns e que pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/noticia/itaca-do-poeta-konstantinos-petrou-kavafis

    Não creio que o aprendizado pela internet possa ter o mesmo grau de sinergia que a vivência in loco dos acontecimentos proporciona. O aprendizado verdadeiro é nas intempéries que no caminhar para as nossas Ítacas nós acabamos por deparar e somos obrigados a transpor. É claro que haverá sempre quem nos mencionará Immanuel Kant sempre retido na sua pequena Königsberg para questionar a importância de nossas Ítacas.

    Há também o problema do paradoxo da informação que nos mostra que muita informação é informação de menos. A ideia é que nós temos um limite de processamento de informação. O acumulo dela em demasia pode gerar uma espécie de desconexão com a realidade e o ser humano acabe se tornando um cabeça oca. Ou na frase de Mary McCarthy: “an open mind about Vietnam has no mind at all” que estendida para tudo pode significar que uma mente sem ideologia é uma cabeça vazia.

    Outro parágrafo que ficou mais ao meu alcance, embora me parecesse com uma argumentação temerária, é o seguinte:

    “Um dos principais problemas do nosso país é a falta de produtividade e de honestidade, consequências do baixo nível intelectual e moral da nossa população, quando o objetivo maior dos humanos, além de se conectarem por laços de amor, é ascenderem intelectual e moralmente”.

    Não sei de onde você tirou que no Brasil há falta de produtividade e há falta de honestidade. Além disso, não ficou claro se você afirma um dado isolado ou faz uma comparação com o resto do mundo. Eu disse que se trata de uma argumentação temerária porque nunca vi um dado estatístico que confirmasse essa sua afirmação. E você foi muito arrojado ao dizer que a falta de produtividade e a falta de honestidade são consequências do baixo nível intelectual e moral da nossa população. Mesmo com dados estatísticos estabelecendo relações, há que se atentar que nem sempre correlações significam nexo de causalidade.

    E por fim há a sua justificativa em que a idéia da “Escola sem partido” que na forma atual é por você considerada uma bobagem pode vir a constituir em uma grande reforma estrutural na educação brasileira. Diz você:

    “Se a “escola sem partido” se tornar uma séria orientação para que professores não defendam ideologias em sala de aula, mas que tentem apresentar aos alunos ao menos as principais perspectivas existentes, ensinando seus pontos positivos e negativos, estimulando-os a inter-relacioná-las e até a chegar a novas perspectivas, isso poderá mudar a educação do país”.

    Pelo menos assim de chofre me parece que você trouxe um bom argumento em defesa da “Escola sem partido”.

    Uma vez eu comentei para um professor que nós os humanos somos ruminantes de idéias. Ele não gostou da minha comparação porque parecia-lhe que ruminar era uma atividade muito bovina. Eu, entretanto, queria só dizer que por mais sintetizado que nos seja apresentada uma ideia nós vamos ruminá-la até a transformar em uma tese para a qual, no nosso ruminar, construímos uma antítese e assim alcançamos uma nova síntese.

    Penso então que você tem razão de que seja apresentado aos jovens todo o conhecimento que o homem amealhou. É claro que nesse processo de ensinamento sempre haverá aqueles que vão debochar de um ou outro argumento. A ideia de que a terra é plana ou de que haveria um geocentrismo dificilmente seria apresentado de forma séria.

    E há também as escolas religiosas. Nelas sempre haverá situações em que padres corolas vão apresentar em longa jornada as provas irrefutáveis da existência de Deus deixando para a última aula a afirmação inquestionável: “os verdadeiramente sábios acreditam na existência de Deus” e nenhum aluno conseguirá apresentar um verdadeiramente sábio que não acredita ou dito de outro modo um que não acredita e que seja verdadeiramente sábio.

    Aliás, imagino que o ensinamento não vai poder ser questionado porque se alegará que o que é duvidoso é a direção do nexo causal, mas a correlação é verdadeira. E haverá os espertinhos que utilizarão esse argumento para outros fins, como dizer que os verdadeiramente sábios sabem que foi golpe ou só sabem que foi golpe os verdadeiramente sábios.

    Clever Mendes de Oliveira

    BH, 18/08/2016

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