Exclusivo: As suspeitas desapropriações da Linha 5 do Metrô pelo governo Serra

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Nem só de formação de cartel e fraude em licitação vive a Linha 5 do Metrô paulista. Quando anunciado por José Serra, o projeto de expansão previa a construção de 4 poços de ventilação e saída de emergência em bairros ricos de São Paulo. Após despender milhões em desapropriação, o Metrô decidiu não construir nada nesses espaços e entregá-los à iniciativa privada

Foto: Divulgação

Jornal GGN – No governo de José Serra (PSDB), o Metrô de São Paulo desapropriou, em caráter de emergência, 4 lotes de terrenos em bairros nobres da capital para construir postos de ventilação e saída de emergência, os chamados VSEs, previstos no projeto básico da expansão da famigerada Linha 5. Porém, anos depois de gastar milhões com as desapropriações, a companhia decidiu não utilizar os espaços para sua finalidade original, com a desculpa de que esses postos não eram mais necessários. 

Uma fonte ligada às obras da Linha 5 revelou ao GGN, em condição de anonimato, que o episódio pode esconder um esquema para desviar recursos públicos ou mesmo beneficiar antigos proprietários das áreas desapropriadas, que ficam nos bairros de Moema e Vila Mariana, e cujas identidades não foram informadas à redação pelo Metrô.

Suspeitas do tipo não são nenhuma novidade na gestão Serra. Em 2016, por exemplo, o Ministério Público denunciou o ex-diretor da Dersa, Paulo Preto, por ter participado de desvios envolvendo as desapropriações necessárias à construção do Rodoanel, que custaram algo em torno de R$ 90 milhões. Pessoas que nada tinham a ver com as áreas tomadas pelo Estado teriam sido beneficiadas com os repasses ilícitos.

Com obras se arrastando há mais de sete anos, a própria Linha 5 do Metrô já foi motivo de escândalo em 2010, quando a Folha revelou formação de cartel e fraude nas licitações envolvendo empreiteiras que, posteriormente, caíram na operação Lava Jato.

No caso atual, o Metrô não quis informar os valores despendidos nas desapropriações que serviriam à construção de cada um dos quatro VSEs retirados do projeto final, e tampouco apontou se os processos foram amigáveis ou litigiosos.

O GGN apurou que cada saída de ventilação pode custar à companhia algo em torno de R$ 100 milhões, isso sem contar o valor empregado nas desapropriações. Isso significa que o Metrô inseriu no projeto básico a construção de estruturas que somariam quase meio bilhão de reais e que acabaram sendo descartadas sem que isso reduzisse o custo total da obra. Pelo contrário: ao longo dos anos, o orçamento da Linha 5 saltou dos iniciais R$ 4 bilhões para R$ 9 bilhões, e a fatura ainda está em aberto. A previsão é de que um trecho seja inaugurado parcialmente nos próximos meses. “Pelo padrão, cerca de 30% do total do valor de uma obra como essa corresponde às indenizações”, comentou a fonte. 

Foto: Divulgação

OS DETALHES DA TRAMA

Os quatro VSEs projetados e depois descartados pelo Metrô foram chamados de Iraúna, Jandira, Chibarás e Maurício Klabin. Eles foram desenhados entre as estações Água Espraiada-Ibirapuera, Ibirapuera-Moema, Moema-Estação Servidor e Santa Cruz-Chácara Klabin, respectivamente. Todos nos baladados bairros de Moema e Vila Mariana. 

“A lógica é a mesma. São áreas supervalorizadas, onde foram desapropriados imóveis relativamente grandes e que, posteriormente, foram descartados com a mesma justificativa, de que os planos mudaram”, disse a fonte.

Para se ter ideia, três VSEs – Iraúna, Jandira e Chibarás – tomariam parte da Avenida Ibirapuera, uma das mais conhecidas na capital. Os lotes têm, em média, 1,2 mil m² cada.

Em 2010, Folha publicou uma reportagem mostrando que, naquelas regiões, Serra desapropriou um total de 70 mil metros quadrados. A metragem inclui não só a construção dos poços, mas também os espaços tomados pelas estações no entorno. Uma grande parte dos imóveis era de uso residencial. 

O Metrô explicou que, quando o projeto básico foi finalizado, em 2009, no final do governo Serra, uma norma internacional exigia a construção de 1 saída de ventilação e emergência a cada 381 metros. Em 2010, houve uma revisão nessa regra e “ficou esclarecido que a distância máxima entre saídas de emergência tem de ser de 762 metros e a maior distância na rota de fuga a ser percorrida é a partir do ponto médio entre duas saídas, ou seja, 381 metros. Dessa forma, os VSEs Iraúna, Jandira, Chibarás e Maurício Klabin inicialmente projetados não necessitaram ser construídos.”

Porém, pelo critério usado pelo Metrô à época, outras regiões além de Moema e Vila Mariana também estariam aptas a receber mais de 1 VSE.

Entre as estações Brooklin-Campo Belo e Água Espraiada, por exemplo, só foi construído o VSE Roque Petrella, mas a distância percorrida entre os dois extremos era de 1,021 metros. Entre Alto da Boa Vista e Borba Gato há uma distância de 998 metros, mas só 1 VSE foi projetado. A distância entre as estações Ibirapuera e Moema (923 metros) é inferior aos outros dois casos e, ainda assim, 2 VSEs foram desenhados nessa área. Veja o diagrama* abaixo, extraído do plano básico ambiental da Linha 5:

O GGN procurou a assessoria do Metrô de São Paulo em busca de respostas para as seguintes perguntas:

1) Quanto o Metrô despendeu com o total de desapropriações para a Linha 5?

2) Quanto o Metrô despendeu em desapropriação para cada uma das 4 áreas onde pretendia construir os 4 VSEs indicados acima?

3) Essas 4 desapropriações foram amigáveis, ou seja, houve acordo entre o Metrô e o proprietário, ou houve litígio?

4) O Metrô poderia informar quem eram os antigos proprietários dos terrenos e em que ano as desapropriações foram feitas?

5) Quanto custa, em média, a construção de um VSE?

6) Por que o Metrô decidiu não construir VSE nessas áreas desapropriadas, se o projeto inicial previa isso?

7) Qual a finalidade que será dada aos espaços não utilizados para construção dos VSEs?

8) Há previsão de quando será concluída a linha 5?

9) Qual o custo da obra toda até o momento?

OUTRO LADO

Em nota, o Metrô informou apenas que o projeto básico da linha 5 do Metrô sofreu alterações em virtude de mudanças em normas internacionais e que os quatros espaços desapropriados e não utilizados serão entregues à iniciativa privada. Metroviários já fizeram greve contra a privatização da linha.

Abaixo, a nota completa.

O Metrô de São Paulo segue normas internacionais de engenharia para implantação de suas linhas.

O projeto básico do prolongamento da Linha 5-Lilás do Largo Treze até Chácara Klabin foi concluído em 2009 e utilizou a Norma para Sistemas de Trânsito em Trilho Fixo e Ferroviário de Passageiros, NFPA 130 (versão 2007), norma internacional para definição de saídas de emergência em túneis.

Com base na redação vigente naquela época, a maior distância para se alcançar uma saída de emergência era de 381 metros. Com a posterior alteração na redação da NFPA 130 realizada pela Standard Fixed Guideway Transit and Passenger Rail Systems em 2010 – e mantida na nova revisão de 2014 –, a distribuição das saídas de emergência da Linha 5 foi alterada.

Pela nova redação ficou esclarecido que a distância máxima entre saídas de emergência tem de ser de 762 metros e a maior distância na rota de fuga a ser percorrida é a partir do ponto médio entre duas saídas, ou seja, 381 metros. Dessa forma, os VSEs Iraúna, Jandira, Chibarás e Maurício Klabin inicialmente projetados não necessitaram ser construídos.

Os imóveis relacionados aos poços previstos no projeto básico estão sendo atualmente utilizados para dar suporte às obras de implantação da Linha 5–Lilás e serão destinados às necessidades da futura concessionária privada que irá operar o ramal, que poderá usá-los conforme previsão contratual da Parceria Público Privada.

 

 

* O diagrama publicado nesta reportagem corresponde à fase preliminar da expansão da Linha 5. Alguns pontos e estações tiveram os nomes alterados desde então. Vila Clementino deu lugar a Hospital São Paulo. O VSE Marselhesa foi trocado por Botucatu. A estação Água-Espraiada, por Campo Belo. Brooklin-Campo Belo ficou só Brooklin. O VSE Professora Carolina Ribeiro, ao lado da estação Chácara Klabin, não chegou a ser desapropriado.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

6 Comentários

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  1. Que golpe mais

    Que golpe mais óbvio…

    Empreiteira desonesta diz que vai desapropriar um certo terreno que por coincidência é propriedade de um indivíduo desonesto, aonde o indivíduo é envolvido com a empreiteira oficialmente ou de forma oculta;

    Empreiteira paga uma indenização milionária para o dono do terreno;

    Empreiteira depois de pagar a desapropriação então decide que não precisa mais do terreno;

    Empreiteira então vende o terreno, que coincidência, para o indivíduo desonesto por bem menos do que pagou de indenização para a desapropriação (uma possível variação é pagar o mesmo preço para recomprar que foi usado na desapropriação mas aonde a propriedade foi supervalorizada no início);

    Indivíduo desonesto continua dono do terreno e embolsa a diferença entre o que recebeu de desapropriação e o que pagou para comprá-lo novamente (ou a diferença entre o valor real do terreno e o valor supervalorizado que foi usado), provavelmente dando uma participação para o funcionário da empreiteira que ajudou o negócio a acontecer.

     

    1. E o governo Alckmin, Serra, Lembo, Goldman etc.?

      Ué… empreiteira, sujeito desonesto. Livrar a cara de funcionários públicos do PSDB porque?Além de Alckmin e Serra, Claudio Lembo e Alberto Goldman, que também governaram durante o período PSDB, podem ter prevaricado? Nem souberam do que faziam Alckmin e Serra? Ambos já eram da turma antes mas mantém-se até hoje em confiança da turma, é isso? E isso falando apenas do primeiro escalão, hein? Sem citar as muitas diretorias de Sabesp, Metrô, Fundação Padre Anchieta, reitores de universidades paulistas…

      Acho que sem citar o governo PSDB, falando apenas de empreiteiras e donos privados de imóveis, fica um buraco no meio, né não?

  2. Mudança de Norma pode ser usada para encobrir a corrupção.

    Essa desculpa de “Mudança na Norma” não faz sentido algum, ainda mais em um projeto desse tamanho.

    Essas mudanças em normas de segurança são feitas através de consultas e discutidas abertamente entre as empresas do setor. As normas são usadas na elaboração do projeto e os contratos exigem que se siga a norma desejada já na documentação.

    As empresas que executam as obras pagam fortunas para terem cópias autorizadas das Normas e recebem atualizações frequentes além de treinamento. Qualquer mudança ou discussão seria óbviamente alertada meses antes. Provavelmente existem especialistas dentro de cada empresa que fizeram cursos específicos sobre essas normas.

    Além disso, Normas não mudam “de supetão” pegando todo um setor com projetos que custam bilhões de surpresa… se alguma Norma relevantes está sendo discutida o projeto deveria até ser interrompido até que se decidisse quais seriam os novos parâmetros.

    Muito suspeito o governo desapropriar uma área logo antes da mudança de uma norma.

    A mudança de Norma pode ter sido usada para encobrir a corrupção… nada menos criativo.

  3. Boa!

    E como sugestão ao GGN, e o monotrilho? Quanto custou cada coluna das muitas que há nas imediações do aeroporto e no trajeto todo? Porque o projeto foi interrompido? Quanto custou até agora? Houve desapropriações? Há alguma previsão de terminar aquela obra?

    Outra: e a venda de ações da Sabesp na bolsa de valores de Nova Iorque? Quem são os acionistas brasileiros? Mora nos Brasil ou nos EUA? Quando compraram ações da Sabesp já operavam naquela cidade estadunidense, ja tinham ações compradas naquela bolsa? Têm, esses acionistas, outros negócios no Brasil Nos EUA? Como e quando souberam que a Sabesp ia vender ações nos EUA? E os acionistas estadunidenses, quem são? Não foi levado em consideração o fato de que água é recurso natural? E sobre investimentos na rede de distribuição da Sabesp? Aliás como está essa rede, como tem sido mantida?

    É óbvio que as respostas apuradas pelo jornal devem ser confrontadas com as mentir… ops! com as declarações que a turma do Alckmin eventualmente fizer.

    Por fim: e o projeto de esconder do público os documentos sobre Sabesp, Metrô, monotrilho etc. por 25 anos? Tem, o governo Alckmin, a intenção de enviar para Itu e depois deixar tais documentos queimarem sem querer, como aconteceu em 2012? ( http://sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,incendio-criminoso-destruiu-papeis-do-metro-imp-,968856 ) E o mais importante: como o governo Alckmin pretende impedir funcionários cônscios da necessidade de transparência quanto ao que é público de darem depoimentos e mostrarem documentos de forma anônima à imprensa?

    P.S.: A ONG Transparência Internacional Brasil está de olho em Geraldo Alckmin? Tem, essa ONG, alguma fonte além das mentir… ops! declarações oficiais da turma de Alckmin? Como é o envolvimento de José Serra nesse imbrogli… ops! casos? E familiares como filhas, filhos, genros etc.? E a Fundação Padre Anchieta, para além das mentir… ops! declarações oficiais, como vai? Siemens? Alstom? Rodoanel? Isso para ficar só naquilo que já é de conhecimento público, embora censurado no OESP, Folha, Globo, Abril e em outras firmas que-tais ajuntadas no Instituto Millenium.

    1. boa….

      Trensalão Tucano? A morte daquelas pessoas soterradas? Merensão? Mensalão Tucano? O silêncio do Judiciário mostra a evolução deste país. 

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