Noblat e sua bola de cristal cheia de efeitos especiais, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Noblat e sua bola de cristal cheia de efeitos especiais

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Após o STF restabelecer liminarmente de maneira precária a validade e eficácia do princípio constitucional e do dispositivo do CPP que impedem a prisão do réu antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, um oráculo conservador escreveu a seguinte bobagem no Twitter:

Essa gente está provocando os malucos. Eles existem por toda parte e costumam dar tiros quando em sua maluquice não enxergam mais saída. Ou simplesmente não entendem o que se passa. Tomara que jamais o façam por aqui – mas quem garante? 

Noblat se comportou como se fosse capaz de prever o futuro. Mas ao fazer isso a única coisa que ele conseguiu foi demonstrar sua profunda ignorância.

A primeira coisa que um estudante de História aprende é que a inevitabilidade dos fatos passados não existe. Ela é uma ilusão que ocorre quando vemos as coisas em retrospecto desprezando a influência do acaso em qualquer série complexa de eventos incertos enquanto o presente está se consolidando de uma maneira (e não de qualquer uma das outras maneiras que eram igualmente possíveis).

“Os historiadores, cuja profissão consiste em estudar o passado, desconfiam tanto quanto os cientistas da idéia que é possível prever a maneira como decorrerão as coisas. De fato, no estudo da história, a ilusão da inevitabilidade, por ter consequencias tão sérias, é um dos poucos pontos sobre os quais os pesquisadores conservadores e socialistas concordam. O historiador socialista Richard Henry Tawney, por exemplo, afirma que ‘os historiadores geram uma aparência de inevitabilidade… trazendo para o primeiro plano as forças que triunfaram e jogando para o segundo plano as que foram engolidas pelas primeiras”. E a historiadora Roberta Wohlstetter, que recebeu a Medalha Presidencial da Liberdade de Ronald Reagan, afirmou: ‘Depois do evento, naturalmente, um sinal se torna perfeitamente claro; conseguimos ver que desastre ele sinalizava… Mas antes do evento, ele é obscuro e repleto de significados conflitantes.’” (O andar do bêbado, Leonard Mlodinow, Zahar, Rio de Janeiro, 2009, p. 259)

No mesmo erro incorrem os intelectuais que tentam fazer previsões como a que foi feita por Noblat. Como disse Hannah Arendt:

“A falha lógica nessas construções hipotéticas dos eventos futuros é sempre a mesma: aquilo que antes aparece como uma simples hipótese – com ou sem as suas consequentes alternativas, conforme o grau de sofisticação – torna-se imediatamente, em geral após alguns poucos parágrafos, um ‘fato’, o qual, então, origina toda uma corrente de não-fatos similares, daí resultando que o caráter puramente especulativo de toda empreitada é esquecido. Não é preciso dizer que isso não é ciência, mas pseudociência, ‘a desesperada tentativa das ciências sociais e comportamentais’, nas palavras de Noam Chomsky, ‘de imitar as características superficiais das ciências que realmente têm um conteúdo intelectual significativo. E a mais óbvia e ‘mais profunda objeção a esse tipo de teoria estratégica não é sua utilidade limitada, mas o seu perigo, pois ela pode nos levar a acreditar que temos um entendimento a respeito desses eventos e um controle sobre seu fluxo, o que não temos’, como indicou recentemente Richard N. Goodwin em um artigo de revista que tinha a rara virtude de detectar o característico ‘humor inconsciente’ de muitas dessas pomposas teorias pseudocientíficas.” (Sobre a violência, Hannah Arendt, Civilização Brasileira, São Paulo, 2009)

Mas suponhamos que Noblat tem razão. A primeira coisa que devemos perguntar nesse caso é se ele conhece alguém que demonstrou a intenção de praticar violência contra Lula ou contra os Ministros do STF que concederam a liminar que ele referiu.

O jornalista tem direito de manter o sigilo de sua fonte, mas ele não tem o direito de acobertar um crime. Se tem conhecimento de algo, ao invés de espalhar medo, Noblat deveria alertar as autoridades, fornecendo a elas os nomes das pessoas que costumam dar tiros quando não enxergam mais saída. Caso contrário, ele mesmo se tornará suspeito de ter acobertado a ação os criminosos ao não tentar impedi-los de agir.

A segunda coisa que devemos considerar caso Noblat tenha razão é a possibilidade de reação da população e/ou das autoridades à um atentado contra Lula ou contra o STF. O assassinato de Marielle Franco, que ganhou uma dimensão nacional e internacional, demonstra claramente que matar Lula seria a coisa mais idiota que alguém poderia fazer nesse momento. Vivo ele será eleito presidente ou ajudará a eleger um presidente. Morto, a força do ideal que Lula representa (um país desenvolvimentista, politicamente independente e comprometido até a medula com programas de inclusão social) irá se multiplicar ao infinito.

Há alguns anos o assassinato da juíza Patrícia Acioli foi solucionado em 30 dias. Identificados e localizados, os assassinos foram presos, processados, julgados e condenados na forma da Lei. Não me parece que ocorrerá algo diferente se a vítima for um Ministro do STF só porque ele concedeu uma liminar juridicamente plausível a Lula. O temor da repressão judiciária (e das condições dos presídios brasileiros) é suficiente inibir qualquer ato extremo como o que foi sugerido por Noblat.

Resta apenas uma pergunta. Porque Noblat disse aquilo e não algo diferente? Essa pergunta somente ele pode responder. De qualquer maneira não creio que a resposta dele será relevante. Jornalistas que tentam intimidar um Tribunal ou ameaçar um adversário político fariam mais pelo jornalismo se decidissem mudar de profissão.

 

Fábio de Oliveira Ribeiro

20 Comentários

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  1. bom, muito bom!

    Não percamos tempo com propagandistas como o Noblat.

    E concordo com sua conlusão.

    Se ele e os demais coleginhas da globo mudarem de profissão, o jornalismo só tem a ganhar.

  2. Insuflando a violência

    Nunca gostei de Noblat pelo tom ironônico agressivo de sua coluna e por saber que, ao mesmo tempo  que a publicava em O Globo, em certa época também foi produtor de um programa sobre jazz na rádio do Senado Federal. Com dinheiro público fez um programa de  relevante interesse público (estou sendo irônico, claro). Um bico em insitituição onde atuavam pessoas que ele atacava ou elogiava. Agora acrescenta mais um tropeço em sua carreira: o de insuflar a violência. Um comunicador tem que ter responsabilidade. Porém, Noblat prece desdenhá-la quando se alinha a conduta de Aécio e procura incendiar o páis, as reações políticas. Mesmo dizendo que espera que “não façam isso”, o simples fato de destacar a hipotese e o tom de crítica ao STF passam a impressão de que existe um latente desejo para que isso aconteça. Triste ver que eiste esse tipo de jornalismo..

  3. Insuflando a violência

    Nunca gostei de Noblat pelo tom ironônico agressivo de sua coluna e por saber que, ao mesmo tempo  que a publicava em O Globo, em certa época também foi produtor de um programa sobre jazz na rádio do Senado Federal. Com dinheiro público fez um programa de  relevante interesse público (estou sendo irônico, claro). Um bico em insitituição onde atuavam pessoas que ele atacava ou elogiava. Agora acrescenta mais um tropeço em sua carreira: o de insuflar a violência. Um comunicador tem que ter responsabilidade. Porém, Noblat prece desdenhá-la quando se alinha a conduta de Aécio e procura incendiar o páis, as reações políticas. Mesmo dizendo que espera que “não façam isso”, o simples fato de destacar a hipotese e o tom de crítica ao STF passam a impressão de que existe um latente desejo para que isso aconteça. Triste ver que eiste esse tipo de jornalismo..

  4. Não pode passar em branco

    Não pode passar em branco essa incitação à violência. Noblat, diferentemente do mero comentador em fórum, é formador de opinião, só ganha a vida por essa condição, ou seja, a firma de comunicação em massa para a qual trabalha só o remunera por conta do “ibope” que construiu cuidadosamente durante sua carreira.

    De forma alguma deve ser censurado. Pelo contrário, é ótimo que ele expresse suas posições. Mas só com muita desfaçatez é possível tomar essa sua declaração como apenas um comentário. Principalmente a última parte, “quem garante?” aponta claramente para o fato de que não há quem possa conter eventual impulso violento, que pode ser contra o réu a quem se fez justiça ou até contra os que julgaram a causa.

  5. Qualquer tiro com alcance

    Qualquer tiro com alcance politico disparado pela direita pode significar o início de uma instabilidade que pode inviabilizar o objetivo dos golpistas que será governar em pais sem oposição!

    Vão ameaçar, mas não darão o primeiro tiro politico, a menos que algum maluco o faça…

    Aí quem investiu dinheiro no golpe perderá!

    Um conflito seria ruim até para a rede globo, então eles querem apenas difundir o medo sem ultrapassá-lo, mas se sentirem que perderão muito dinheiro com a redemocratização, ai sim é tudo ou nada!

    Então eles jogam para antecipar e criar medo e se perderem para criar uma nova anistia ampla, geral e irrestrita…

  6. Noblat quer que o STF parta

    Noblat quer que o STF parta para o próximo estágio. Aantes, em vez da constituição, o STF deveria “ouvir o clamor das ruas”. Agora é pra “ouvir o clamor dos malucos armados”. Está cada vez melhor…

  7. Porque perdem tempo lendo este camarada?

    Deu diversas provas de que é jornalista tendencioso, geralmente leviano, dá diversos furos… n’água, só ainda tem espaço pois detesta Lula e ama tucanos e Temer da vida. No mais, passamos muito bem sem ele

  8.  O Noblat deveria se

     O Noblat deveria se preocupar é que se for aberta a temporada de caça ele pode ser uma das vítimas. Ninguém vai estar a salvo.

     

  9. Por detrás da ambiguidade,

    Por detrás da ambiguidade, algumas insinuacoes “malucas”. Ou não exatamente malucas. Uma delas: prendam o Lula para que não seja necessário matar o Lula. Outra: pessoal, eles vão soltar o Lula, então vamos soltar nossos malucos para matar o Lula. É o Noblat, oras. Fico me perguntando o seguinte: O Chico Alencar ainda escreve nesse blog? Por que? Não tem mais o que fazer?

  10. Nesse tuweeter do Noblat, eu
    Nesse tuweeter do Noblat, eu respondi que se prenderem o Lula, como ele e a empresa para qual presta serviço querem, da mesma forma, os malucos do lado de cá podem da às caras. E acredito que sejam mais letais.
    Por enquanto estão quietos e calados.

    Pelo grau de ódio que está reinando no país, os togados devem pensar muitos bem antes de tomar qualquer atitude em relação ao Lula. Principalmente, injustamente.

    Na realidade, Noblat e jornalistas do PIG, ficaram desnorteados com a decisão, até agora, do STF.
    Eles acreditavam em 100% que Lula seria degolado .
    Por isso a grande frustração e revolta deles.

  11. É um erro achar isso!

    A direita quer muito algum tipo de violência descontrolada.

    Eles já têm as suas peças colocadas, os militares.

    Mas precisam de motivos fortes e convincentes para dar a partida.

    Por acaso, alguém aqui duvida do que eles seriam capazes…

    O Rio é apenas um test drive.

    Há muitos que afiam as facas há anos e adorariam usá-las.

    Porta-vozes dessa turma não faltam.

  12. Exemplo Mirella

    O que esses imbecis como o Noblat avham que vai acontecer com o Brasil se matarem o Lula???? Essa movimentação toda ficará insignificante e ocorrerá em todo o Brasil. Pergunto ao Noblat: onde você, os Marinhos, os Mervais vão se esconder quando o Brasil virar uma Ruanda? Recomendo deixar uma passagem reservada para Portugal. É apenas um conselho baseado nas suas previsões ou desejos.

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