As diferenças entre o Parlamento em Portugal e no Brasil, por Fernando Reis

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
[email protected]

O poder do Parlamento, por Fernando Reis, especial para o GGN

Numa ocasião em que se celebram os 42 anos da Revolução de Abril e em que o Brasil está a atravessar um período de grande turbulência política, gostaríamos de sublinhar o nosso orgulho numa das nossas grandes conquistas democráticas; o poder do Parlamento como factor nuclear da nossa democracia, em contraste com a triste realidade que representa a Câmara dos Deputados brasileira.

Sabemos que ainda há muito para fazer no plano económico e social, que o nosso país tem graves problemas estruturais e que continuam a existir gritantes desigualdades, que estamos longe de irradicar a miséria e a pobreza e que o fenómeno da corrupção tem vindo a alastrar. No entanto, há um valor, simbolizado pela Assembleia da Repúlica, eleita por sufrágio directo e universal, que nos é muito querido e marca toda a diferença entre uma democracia e qualquer outro poder autocrático que não emane directamente do voto popular. Esta é, sem dúvida, uma das grandes conquistas do 25 de Abril.

Vem isto a propósito, por um lado da celebração da nossa Revolução e, por outro, do triste espectáculo a que tivemos oportunidade de assistir, em directo, via TV, na Câmara dos Deputados do Brasil, a propósito do pedido de impeachment de Dilma Roussef.

A Câmara que devia ser a casa da democracia brasileira, mais parecia um circo, onde se exibiam cartazes, se intimidavam os deputados da minoria que estavam contra o impeachment, onde choviam os insultos e os apupos, numa manifestação de baixo nível político, onde a esmagadora maioria das declarações de voto assentava na triologia, Deus, Pátria e Família e onde um tal Bolsonaro teve mesmo a ousadia de fazer a apologia da ditadura, dedicando o seu voto ao torturador de Dilma.

E o mais lamentável é que quase não ouvimos um argumento válido para justificar o processo de afastamento da presidente, pelo simples facto de que ela, efectivamente, não cometeu nenhum crime de responsabilidade, mas tão só uma manobra contabilística, como fazem muitos governos de outros Estados brasileiros e até mesmo muitos executivos, em Portugal e na União Europeia, transitando resultados e operações financeiras de um ano para o outro, para iludir o déficit. E sem crime, este afastamento de Dilma, à luz da constituição brasileira e aos olhos da comunidade internacional, não passa, de facto, de um golpe de Estado. Mas o surrealismo deste processo é de tal ordem, que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha e Michel Temer, que se perfila para tomar o lugar de Dilma, estão eles, sim, indiciados por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro e várias dezenas dos deputados que votaram a favor do impeachment estão também acusados de crimes de corrupção. Até parece anedota mas não é. Uma deputada que declarou votar em nome da competência e honestidade do marido, um governante de Minas Gerais, tomou depois conhecimento, que o marido tinha sido detido, no dia seguinte, por alegados crimes de corrupção.

Não é por acaso, que sendo a única saída legítima e constitucional para o grande impasse que vive actualmente o Brasil, quase dividido ao meio, eleições presidenciais antecipadas, pouquíssimas são as vozes que as defendem.

Entristece-nos que um país com quase 200 milhões de habitantes, com enormes recursos naturais, onde temos muitos e bons amigos, corra o risco de voltar a viver uma nova ditadura, depois de mais de três décadas de democracia.

O que não falta são Bolsonaros à espreita de uma oportunidade.

Fernando Reis – Director do Jornal do Algarve

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

25 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Nassif
    Bom dia 
    Toda essa

    Nassif

    Bom dia 

    Toda essa bagunça institucional que se tornou o país tem um culpado, Lula, pois por ser um grande politico, acreditou num republicanismo que não existe no Brasil. 

    E agora um povo que não possuem a menor ideia do que estamos falando, vai pagar um preço alto pelo retrocesso que se vislumbra!

    Seria ingenuidade? o tempo nos mostrará!

    1. O tamanho da orelha do

      O tamanho da orelha do principe Charles, o Lula tambem é culpado ???? . . . . . amanhece o dia e não se ve tudo, affff . . .

  2. E depois…

    Ainda tem brasileiros que acham que somos os “inteligentes” nessa relação lusófona.

    Muito mais que um circo, muito mais que deprimente. A atuação da câmara baixa (a mais baixa do mundo) passou de todos os limites do aceitável, do ridículo, do mesquinho.

    A desculpa era que não se julgaria o mérito, mas, a admissibilidade do julgamento. Poderiam ter escrito seus nomes na história como democratas. Preferiram entrar para a história como traidores, ratos, canalhas, desleais, mentirosos. Até o palhaço preferiu manter sua profissão original e ajudar no picadeiro fazendo palhaçadas e traquinagens. Nisso, entretanto, não conseguiu o brilho que lhe seria devido num picadeiro original, já que teve muitos concorrentes e, também, por que o palhaço é ladrão de mulher, não da democracia, nem da confiança, nem da esperança de um povo que ainda carece de muita atenção do Estado, até que possa, sorrir ao suplantar as mazelas que a vida lhe acometeu.

    Vamos tocando o barco. Já há reações de alguns que embora inclusos nos grupos dos traidores levantam suas vozes para dizer que há sim um mar de lama a envolver os patrões do golpe.

    Nada como um dia atrás do outro. São dias tenebrosos e ainda o serão por um bom tempo, mas, o projeto dos traidores e golpistas não se susterá por muito tempo. A festa que fizeram se transformará em juízo brevemente e aí, como todo o sentimento cristão que nos aflora, não lhes será destinado o perdão, pois, não o merecem.

     

  3. Entendem agora quando falo que o Brasil é terra virgem…

    Nem saímos da colonização e já voltaremos a plena.

    Menos de 1/3 dos deputados foram eleitos por voto direto, isto é a prova da colonização na veia. Democracia nem chega perto.

    Como foi bom para o país o circo dos horrores de domingo.

  4. Todo mundo falando em

    Todo mundo falando em eleições presidenciais por este ou aquele motivo.

    Eleições presidenciais meuzovo.

    Ou eleições gerais ou deixa estar pra ver como é que fica.

    Com esse congresso, Requião querido, quem consegue governar?

     

     

  5. Parece piada, mas não é.

    Longe de querer rir com a “piada” brasileira, o que o Fernando Reis nos mostra, é que mesmo num dos menores e mais fracos(economicamente falando) países da Europa, eles têm o respaldo de um Legislativo forte, e de um Judiciário apartidário, além de uma imprensa, cuja função é apenas informar e formar opiniões, e jamais partidarizar, nem formar manadas comandáveis, e manipuláveis.

    Estivéssemos no século passado, no início da República, quando não existiam as redes sociais nem a internet, tudo ficava entre nós, não permitindo que as imágens deprimentes daquele espetáculo circense da pior categoria, estivesse sendo visto “in time”por mundo todos os povos, que interessam-se pelo Brasil e pelo rumo que estamos querendo seguir. Entretanto, eles os “primos pobres” dos europeus, e simpatizantes das coisas brasileiras, não riram da nossa “piada” na votação da admissibilidade do impeachment, pela Câmara, e sim, choraram pela fragilidade da nossa ridícula republiqueta de bananas, e assim como em toda a imprensa mundial, somos motivos de chacotas e piadas se não de mau gôsto.

    1. Nada a ver. Os legislativos

      Nada a ver. Os legislativos europeus nunca foram “bonzinhos” e a midia é COMPLETAMENTE partidarizada, ate mais que aqui.

      1. não é o tamanho do pais

        Desculpe discordar.

        Não é o tamanho do pais que interessa e mas a qualidade de suas instituições.

        Não falo do Uruguai, mas de Portugal posso falar pois ja lá morei e conheço muito bem sua Historia.

        Os politicos de lá são mediocres ( geralmente), mas os nossos são muito piores em tudo.

        Enquanto a nossa grande imprensa é completamente manipuladora ( fora Carta Capital e pouco mais) a imprensa é pluralista. Mesma a conservadora da para ler sem passar raiva. 

        Um jornal Semanal  como Expresso não tem nada parecido por aqui.

        Gostaria que tivessemos e não essas revistas-esgoto.

  6.    Eu desisti do Brasil.

       Eu desisti do Brasil. Sabia que o nosso Congresso era baixo, mas mesmo assim fiquei surpreso com o nível.

       Uma dica que eu deixo é a situação do nosso vizinho, o glorioso Uruguai. O índice de Gini já tá na casa dos 0,38 (próximo a de alguns países europeus) e a renda per capita em torno dos 20000 dólares.

       E antes que digam qualquer coisa, não é mais considerado paraíso fiscal, nem pela nossa Receita nem pela OCDE. Fizeram também este tipo de reforma e consertaram o problema.

       É praticamente um país desenvolvido, mas a imprensa aqui não gosta muito de repercutir isto porque a Frente Ampla é responsável por boa parte desses números. Partido de esquerda bem sucedido não vale…

       Mas corram, porque eles querem suspender a gente (com toda a razão) do Mercosul. Aí a residência fica mais difícil.

       

     

  7. E ele nem analisou o nosso
    E ele nem analisou o nosso judiciário que é todo formado por doutores com doutorado aqui, ali e acolá. Quando eles souberem a merda que é o nosso judiciário sentirão pena do Brasil.

  8. Desilusão…

    Antes da infame votação, conversando com meu irmão, este me disse: “Se esse golpe passar eu nunca mais irei a uma urna de votação”…Perguntei porque, e ele me disse: ”  meu voto só serve pra legitimar o processo eleitoral, posso tudo, menos ganhar”

    Faz sentido.

  9. Diferenças? Absolutamente

    Diferenças? Absolutamente nada a ver. Paises completamente diferentes, um é presidencialista, outro parlamentarista, Portugal cabe na grande São Paulo, costumes e tradição politico totalmente distintas, só pode ter diferenças.

  10. Sr Ministro ….

    Ao Sr Ministro Celso de Melo,
    Venho respeitosamente me manifestar sobre a declaração de hoje (20/04/2016) do Sr Ministro, a respeito das falas da Sra Presidenta da República, sobre o processo a que está sendo submetida.
    Respeitosamente devo discordar do Sr Ministro, pois entendo que não está se questionando o instrumento de impedimento e sim as alegações para tal processo.
    Teria plena razão, o Sr Ministro, se estivessemos sob a égide de uma Constituição Parlamentarista, onde um chefe de governo eleito indiretamente pelo Parlamento e este, em uma ação essencialmente política poderia dar um voto de desconfiança e afasta-lo.
    Como estamos em um regime Presidencialista , onde o voto popular é sagrado, o Eleito só pode ser afastado após INQUESTIONÁVEL CRIME DE RESPONSABILIDADE, o que claramente não é o caso que estamos vivendo. Pelo mérito dos argumentos utililizados, se temos quem concorda, igualmente temos ilustres juristas de não menos respeitabilidade que não concordam.
    Assim, sob a égide do voto popular, o processo EMINENTEMENTE POLÍTICO fere claramente a CONSTITUIÇÃO QUE JUROU DEFENDER.
    Neste caso só se pode nominar tal processo de GOLPE PARLAMENTAR, pois a CONSTITUIÇÃO é cristalina em exigir fundamentação jurídica que CLARAMENTE CARACTERIZE O CRIME DE RESPONSABILIDADE, DEVIDAMENTE JULGADO OU FUNDAMENTADO.
    Sem de forma alguma questionar seu saber jurídico, longe disso Sr Ministro, a fragilização e a banalização de argumentos para o afastamento de um governante eleito, fere sim nossa democracia presidencialista e passará a ser foco constante de instabilidades futuras, sempre que o Eleito perder maioria parlamentar, em um flagrante desrespeito à vontade do Constituinte original.
    Obrigado pela atenção.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador