Para entender a crise da China

Historicamente, o desenvolvimento de economias emergentes sempre sofre problemas de descontinuidade.

No início, crescem rapidamente em cima de uma base pequena, devido à incorporação do chamado exército industrial de reserva, em geral proveniente do campo. No início atraem investimentos externos, devido aos baixos salários. Na medida em que cresce o emprego e a renda, forma-se um mercado de consumo, garantindo novos investimentos voltados para o mercado interno.

Os altos índices de crescimento iniciais atraem mais investimentos. Até que a economia atinge um patamar maior e as taxas de crescimento tendem a se estabilizar em níveis de economias maduras.

Há o breque da economia, mas o trem dos investimentos continua a toda, projetando as taxas de crescimento do passado para o futuro.

É nesses momentos que a economia estanca, travada pelos superinvestimentos da fase anterior.

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O desafio chinês é desacelerar de 10% para 7% ao ano de forma controlada.

Aí surgem os problemas apontados por Martin Wolff, do Financial Times, em artigo recente.

1. Dependência do investimento como fonte de oferta e demanda.

O que mede a eficácia do investimento é a chamada “produtividade total dos fatores” (que mede a variação da produção por insumo utilizado). E ela está próxima de zero. Só se aumenta a produtividade com investimento novo.

2. A relação capital sobre produção adicional disparou, enquanto os retornos sobre investimentos despencaram.

3. O crédito já não pode puxar a economia chinesa. O “financiamento social total” (um indicador amplo de crédito) saltou de 120% do PIB em 2008 para 193% em 2014. Logo, a parte do investimento dependente de crédito tende a diminuir.

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4. Os problemas não param por aí. A relação capital sobre produção mantém trajetória explosiva. Para se estabilizar nos níveis atuais, e para manter o crescimento da economia em 6%, a parcela de investimentos precisaria cair em cerca de 10% do PIB. Mas aí o impacto sobre a demanda seria fulminante.

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Trata-se de um xadrez complexo, mesmo para uma burocracia que mostrou notável nível de competência ao longo das últimas décadas.

Para Wolf, o melhor caminho seria continuar com as reformas, aumentando a capacidade de gasto dos consumidores, investindo mais no consumo público e em melhorias ambientais

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 Mas há desafios enormes de ordem econômica e política. A descontinuidade poderá se prolongar e haverá a necessidade de replanejar a economia, com todos esses óbices, sem levá-la ao colapso.

E aí entram os dilemas apontados pelos especialistas desde que a China decidiu tornar-se uma economia de mercado. Nas principais cidades chinesas, vários valores ocidentais começam a se impor. A lógica ocidental, seja entre grupos econômicos e cidadãos, exige um grau de autodeterminação que colide com o poder excessivamente concentrado do Partido Comunista.

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 Mais que isso, a legitimidade dos presidentes chineses esteve calçada nos índices de crescimento garantindo a melhoria do bem-estar geral. A incapacidade do sistema chinês de absorver dissidências, de atenuar conflitos é um fator a mais de instabilidade.

 

Luis Nassif

19 Comentários

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  1. DEMÉTRIO MAGNOLI
    A história

    DEMÉTRIO MAGNOLI

    A história que a China conta

    A verdade histórica parece nítida: encerrou-se o ciclo da ‘globalização chinesa’. É tempo de aposentar a lenda

    7% ou 3%? Depois da queda abrupta do mercado acionário, o governo chinês garante que o PIB da segunda maior economia do mundo ainda crescerá 7%, em linha com a hipótese de “aterrissagem suave”. Os céticos, cada vez mais numerosos, ignoram os desacreditados índices oficiais, apontando a anemia de indicadores físicos, como o consumo de eletricidade e o movimento ferroviário de carga, que sinalizariam expansão anual de apenas 3%, numa “aterrissagem forçada”. A verdade estatística está, provavelmente, no meio termo. Já a verdade histórica parece nítida: encerrou-se o ciclo da “globalização chinesa”. É tempo de aposentar uma lenda.

    A lenda diz que o sucesso da China derivou de um modelo assentado na centralização de decisões, no dirigismo estatal, no gerenciamento econômico heterodoxo e no financiamento subsidiado da projeção externa das empresas do país. Difundida no Brasil pelos arautos do capitalismo de Estado e do neonacionalismo, ela é menos uma análise da inserção chinesa na economia mundial que uma plataforma de combate ideológico. Suas mensagens: a) o “modelo chinês” serviria como fonte de inspiração para o Brasil reformar-se a si mesmo; b) a cooperação estratégica da China com os “países emergentes” contrabalançaria a polaridade geopolítica exercida pelos EUA e pela União Europeia. Tudo isso tinha uma película de verossimilhança na hora do crash financeiro global de 2008-2010, mas não resiste à prova da “aterrissagem” chinesa.

    O “modelo chinês” nunca foi um “modelo”, mas unicamente a forma assumida pela economia da China na etapa inicial de sua transição do socialismo para o capitalismo. Nessa etapa, o dirigismo estatal propiciou o crescimento econômico acelerado porque o país dispunha de reservas abundantes de força de trabalho barata e os mercados externos eram capazes de absorver, na forma de importações, a poupança compulsória da população chinesa. Mas tais condições desapareceram. A China em “aterrissagem” só pode prosseguir seu desenvolvimento pela ativação do mercado interno –o que exige a desmontagem das engrenagens do capitalismo de Estado.

    A passagem de uma economia de investimento para uma economia de mercado solicita reformas radicais, que se estendem do direito de propriedade aos direitos civis e políticos, passando por regras capazes de assegurar a concorrência. Os dirigentes chineses resistem às reformas mais profundas, que provocariam fissuras insanáveis no sistema político totalitário. Mesmo eles, porém, reconhecem oficialmente o imperativo de liberar as forças de mercado da teia asfixiante de controles estatais. O capitalismo de Estado não é o futuro, mas o passado, da China –eis uma conclusão inevitável que escapa aos ideólogos brasileiros do “modelo chinês”.

    A tese da “aliança estratégica” antiamericana nunca passou de uma bizarra utopia. O grupo dos Brics, celebrado pelo governo brasileiro como polo geopolítico alternativo, reúne países com interesses fundamentais distintos. Índia e China são potências nucleares rivais. China e EUA são parceiros estratégicos no universo das finanças globais. O Banco dos Brics, exibido no Brasil como instrumento de revolução da ordem financeira global, é um elemento periférico no esforço de internacionalização da economia chinesa.

    A “aterrissagem” da China, suave ou forçada, evidencia a dimensão da fraude analítica. Os “países emergentes” cresceram à sombra da “globalização chinesa”, empurrados pelo vento de cauda da explosão das cotações das commodities e por fluxos inéditos de investimentos estrangeiros. Hoje, todos eles sofrem, em graus diferentes, os impactos da reversão do ciclo econômico –e, enquanto a China desacelera, os capitais escorrem na direção dos EUA. “Modelo chinês”? O admirável mundo novo cantado pelo lulopetismo era só uma metamorfose do mundo velho.

    1. Que autoridade técnica você

      Que autoridade técnica você tem para falar essas baboseiras. Você fala como um visionário idiota sobre a segunda potência (ou primeira?) do mundo.

      1. Eu não falei nada.
          Só

        Eu não falei nada.

          Só reproduzi o que alguém falou.—até porque  não entendo do assunto.

                Fique calmo.

        1. Xará:
            Estou de carro perto

          Xará:

            Estou de carro perto da av. Brigadeiro Luis Antonio, rumo ao calvário,ops, teatro.

               Eu estou falando.

             Mas quem está digitando é a Master.

                    Obrigado pela força.

                      Abração companheiro velho de guerra.

  2. A crise chinesa

    O grande diferencial da China para as economias ocidentais é capacidade de o governo central impor medidas de controle. Havendo apoio continuado dos sistemas de segurança do estado para a travessia, que será muito dura, há boas chances.  Não à toa, recentemente, cabeças do exercito foram cortadas. A cúpula chinesa tem tido condições de atuar preventivamente e trabalha com uma visão estratégica de longo prazo, décadas à frente.

    Vejo um período de turbulência controlada e redirecionamento da economia para políticas de bem estar social, a fronteira a ser explorada.

    É isso ou esfacelamento da China em diversas repúblicas étnicamente formadas.

  3. China

    Caro Nassif,

    dessa vez seu texto não ficou claro. Dados jogados não deixam compreender o que se passa do outro lado do mundo.

    aguardo um texto melhor sobre os amarelos.

     

  4. Referencial equivocado

    Olha-se as mudanças na China com um referencial equivocado.

    O grande processo hora em curso é uma espantosa urbanização do pais.

    Esse processo não necessita de fomento externo. A economia chinesa possui em sua estrutura todos os componentes necessários para promover essa urbanização, que implica a cada incremento no processo do aumento da população que efetivamente passa a participar da inclusão no sistema de consumo de bens e serviços, a economia local se robustece. Essa parcela do exercito industrial de reserva que é absorvida pelo sistema produtivo industrial chines (por que o processo todo se estabelece com uma massiva industrialização, a China não é uma grande fornecedora de serviços, mas esta tentando mudar esta condição) controlando o custo da mão de obra, e calibrando a competitivida da sua produção industrial vis-à-vis seus competidores internacionais.

    Como o aparato urbano necessário esta muitas vezes ocioso por um descompasso entre criação de infraestrutura urbana e efetiva ocupação, o dirigente desse processo , o PCC, por meio dos instrumentos burocráticos que domina, controla a velocidade da urbanização.

    Ai os que fazem a crítica pelos métodos tradicionais vão denunciar que dessa forma a China perde competitividade frente aos outros players do sistema internacional. Porém esquecem que a produtividade chinesa é tão esmagadoramente maior que esta perda se traduz insignificante frente aos objetivos perseguidos.

    O que incomoda realmente é que mais de 50% do consumo de metais do planeta esta hoje sob controle chines,  porém de forma assimétrica o consumo de energia (petróleo) não acompanha essa porporção. ( A leitura desses dados explica, ainda que de forma transversal, o que realmente ocorre com a economia brasileira, mais do que o número de ministérios ou a racionalidade ou falta dela dos agentes internos de mercado). A parte do leão da capacidade de tranformação industrial do mundo esta alocada na China. E não há como transferir espacialmente, pelo menos no curto prazo, essa capacidade, com custos equivalentes.

    Há hoje uma sobreoferta de equipamento urbano disponível, então o PCC altera a velocidade da taxa de conversão de população rural em urbana. É, se podemos falar assim, a crise da exuberancia.

    O contraponto é que marginalmente todos os custos industriais dos consumidores (e dos competidores também) de produtos chineses sobe. Pior ainda, para estes consumidores, mesmo subindo não há competidores que possam fazer frente a esses custos dos chineses, substituindo-os como fábrica do mundo. Ou seja eles ainda tem muita gordura para queimar no seu mecanismo de controle da urbanização.

    E o processo esta longe de terminar, pois apenas 1/4 da população chinesa é urbana.

     

  5. Burocracia chinesa é milenar e bem preparada

    Os burocratas chineses são como os atletas de lá, selecionadas na infância para assumirem suas posições.

    Nada parecido com os companheiros nomeados ou os concurseiros que entram no governo.

    Assim comparar medidas governamentais de uma nação que conta com quadros que são cantados em prosa e verso no mundo todo como a elite das elites,  com o samba do criolo doido comandado pela Dilma é de uma hipocrisia de corar FHC.

    No mais, pelo o que observo nos Chineses que estão emigrando agora para o Brasil, com lojas lá no Brás onde faço negócios toda semana, eles têm de forma clara a máxima que PRIMEIRO SE GANHA, DEPOIS SE GASTA, coisa que muito economista do quilate do Wolf fala como uma tendência excruciante de formar poupanças.

    Assim, pela qualidade da administração chinesa e pelo espírito que perpassa seus empreendedores penso que a crise chinesa será enfrentada de forma totalmente diferente da crise brasileira.

    O que têm causada um pouco de turbulência por lá é a bolsa de valores, que foi importada do ocidente com os picaretas que as operam por aqui e vendo a ingenuidade dos aplicadores locais trataram de separa-los de seus investimenos na velocidade da luz.

    Agora manobrar uma nação com população no globo todo e mais de um bilhão e trezentos milhões de habitandes é um pouco mais complexo do que lidar com 200 ou 300 milhões em amplas áreas a serem desbradas ou conquistadas com o auxílio da tecnologia.

    Aqui no Brasil a saída para a crise é muito mais simples, basta a Dilma dar Rumo, Norte e Estrela para o Brasil, até os senadores da oposição estão implorando por isto, para que possam dar apoio  ao governo e fornecerem esperança para seus eleitores.

    Acorda, Dilma!

  6. Opinião do Magnuoli

    Esse cara entrou no lugar errado com essa ideologia tacanha, ultrapassada, fugindo do debate técnico para agreeões de ordem política. 

  7. É o câmbio

    Os chineses têm controle sobre o próprio câmbio. Não precisam gastar todas as suas reservas para baixar o valor relativo da própria moeda, como aqui e em todas as economias satélites à americana.

    Portanto, zelar pela competitividade do seu produto não é tarefa tão difícil.

  8. Santo de Pinda Faz Milagre!

    Na birosca intelectual do Magnoli é proibida a entrada de cachorros e chineses, o que é emblemático: enquanto os chineses constroem um aqueduto de 900 km até Beijing, o Cantareira secou por causa da gestão tucana que privilegiou o lucro neoliberal (admirado pelos ex libelus) dos acionistas da SABESP e da reeleição do frei Galvão de Pindamonhangaba, que fez o mar virar sertão. Os sábios e bravos maoístas chineses souberam utilizar a capacidade de sinalizar preços que as relações monetário e mercantis deram a socialismo de mercado, até porque seu estrato social, o campesinato, aprendeu a ser pragmático ante as imprevisíveis e milenares forças da natureza.

  9. Mais ou menos

    Se a China não conseguir gerar demanda interna, como bem diz o Magnoli, vai sucumbir. Um grande exemplo é o mercado imobiliário planejado pelo governo central, que simplesmente não funciona porque os chineses não querem trocar seu apê comunista de 10m2 pelos que o governo construiu, mesmo que tenham dinheiro para isso.

    Também não frequentam os shoppings para consumir marcas ocidentais. As mesmas marcas para as quais eles fabricam os produtos.

    Resumindo, ao contrário do que diz o texto sobre valores ocidentais, se o governo chinês não conseguir fazer o povo torrar dinheiro como fazem os americanos, incorporando o valor ocidental que move a economia mundial hoje, o consumismo, estão ferrados.

    http://www.bbc.com/news/magazine-19049254

     

  10. Não se deixem enganar pelo

    Não se deixem enganar pelo nevoeiro do contratempo. Se a Europa se recuperar, a China continua a competição mundial nos patamares anteriores.

    Os EUA vê a China do mesmo modo que a Inglaterra via o crescimento do Brasil antes da mídia encontrar forças para preparar a crise: juntando os demonios da inveja e o seu tom oposto.

    O grande problema da sobrecarga que faz a economia entrar em colapso é negligenciar o poder do mau conselho.

    Gostamos dos noticiários que minam e jogam para baixo o que se faz certo; e evitamos aqueles que corrigem e dão direção para acelerar o passo.

    O Brasil foi atacado consigo mesmo no seu sucesso, tolerou e não se cuidou, foi abatido com Tombini e Levy; a China que anda no trem da frente, se fizer mudanças erradas vai sair dos trilhos para andar no mesmo terreno movediço do capitalismo.

  11. Reserva em dólares da China


    Quatro trilhões de dólares.

    E a China anda medrosa com a situação mundial e, de repente, haver uma grande desvalorização do dólar.

    Agora, acredito que irá adquirir ativos no mundo todo, com dólares de sua reserva.

    O PIB chinês poderá ser engrossado externamente.

    O Brasil irá ter – com certeza – investimentos chineses e até podem acontecer compras de ativos por aqui. A final, nosso País é um dos mais ricos do mundo em reservas naturais, queiram ou não os analistas.

    Tenho fé em nosso País.

    E a China irá nos ajudar.

     

  12. Só sei de uma coisa:

    Faz mais de vinte anos que escuto de economistas de todos os matizes ideológicos que a China vai se arrebentar logo ali, depois da esquina…
    Nada acontece, mas os economistas ocidentais continuam pontificando…

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