Políticas educacionais do PSDB em São Paulo agravam desigualdades

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Manifestação de professores em 2016, que na época estavam há dois anos sem aumento de salário / Gisele Brito

Manifestação de professores em 2016, que na época estavam há dois anos sem aumento de salário - Créditos: Gisele Brito

do Brasil de Fato

Políticas educacionais do PSDB em São Paulo agravam desigualdades

Especialistas pontuam problemas na educação paulista causados por mais de 20 anos de governos tucanos

Juliana Gonçalves

A sanção, em 2016, da Proposta de Emenda à Constituição 55 – PEC do Teto de Gastos, conhecida como “PEC do Fim do Mundo” –, pelo presidente ilegítimo Michel Temer (MDB), revela o abismo existente entre o discurso e a prática quando o assunto são prioridades na gestão do País.

A Emenda Constitucional 95 – EC 95, conforme se transformou depois de assinada – coloca limite aos investimentos públicos em setores como educação, saúde e segurança, por 20 anos, atrelando seu aumento à inflação acumulada, conforme o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Na prática, congela por duas décadas os investimentos em políticas sociais, com a justificativa de equilibrar os gastos públicos.

Embora criticada pelo candidato tucano à Presidência Geraldo Alckmin, em maio passado, o ex-governador de São Paulo admitiu que não irá revogar a Emenda Constitucional 95, aprovada com os votos de toda a bancada do PSDB. Por outro lado, o tucano tem dito cantraditoriamente que, caso eleito, o Ministério da Educação (MEC) vai focar na Educação Básica. A mesma que vai sofrer pelo congelamento imposto pela Emenda Constitucional.

Na Educação, a EC 95 entra em cena em terreno já devastado pelas políticas educacionais aplicadas em mais de 20 anos do PSDB no governo do estado.

Fernando Cássio, professor da Universidade Federal do ABC e membro da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, afirma que foram muitas as políticas educacionais aplicadas pelos governos tucanos, no entanto, questiona a qualidade. “De fato eles implementaram um número enorme de políticas educacionais, a questão qual é a  orientação dessas políticas, então você pode priorizar uma área e ao mesmo tempo destruir essa área”. 

A tentativa de reorganização das escolas e de privatização do ensino, a reforma do Ensino Médio e as escolas integrais entram nesta conta. 

Reforma do Ensino Médio

Aprovada em fevereiro de 2017, a reforma do Ensino Médio criou grande polêmica entre especialistas e educadores. Embora fosse praticamente consenso a necessidade de uma reforma, críticas foram feitas pelo modo como ocorreu via medida provisória, implicando em pouco tempo de debate público.

A reforma flexibiliza o conteúdo que será ensinado aos estudantes, muda a distribuição do conteúdo das 13 disciplinas tradicionais ao longo dos três anos do ciclo, dá novo peso ao ensino técnico e incentiva a ampliação de escolas de tempo integral. O currículo passa a ser organizado por áreas de conhecimento: linguagens, matemática, ciências da natureza e ciências humanas. Apenas português e matemática são disciplinas obrigatórias nos três anos do Ensino Médio. 

A carga horária será reduzida para 1.800 horas, o que corresponde a 60% da carga atual. O tempo restante deve ser preenchido de forma optativa pelos estudantes em alguma das áreas, caso a escola ofereça mais do que uma.

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) vai definir o conteúdo mínimo e as disciplinas que estarão obrigatoriamente no Ensino Médio. Cássio critica o discurso salvacionista do governo federal, que vende a reforma do Ensino Médio como um elemento que vai melhorar a educação pública.

“Como é possível você propor uma reforma do ensino médio para resolver problemas, se você tem o mesmo partido político e o mesmo projeto educacional no estado há mais de duas décadas? Como se a responsabilidade não fosse justamente de quem está na gestão há tanto tempo”, indaga Cássio.

Além disso, a grade opcional, hoje incluída no conteúdo obrigatório, passa a ser “escolha” ofertada pela escola. Especialistas pontuam que escolas pequenas e precárias não vão oferecer um leque de opções, mas o que é possível.

O resultado disso seria o aprofundamento das desigualdades entre escolas e alunos. Boas escolas, localizadas em áreas urbanas para a classe média, vão oferecer muitas opções. Já as escolas periféricas não terão muito a oferecer.

“Vai ter uma parcela muito pequena de estudante que vai ter acesso a algumas coisas a mais oferecidas e uma massa enorme totalmente alijada daquilo que a escola poderia oferecer e não vai mais ser obrigada a oferecer. A minha posição como é a posição da Campanha é que isso avilta fortemente o que é a garantia do direito à educação”, estima o professor universitário.

Fernando comenta ainda ser questionável o próprio estudante “escolher” tão precocemente qual área quer se aprofundar. Caso mude de ideia, no futuro, sua educação estará defasada.

A reforma pretende também incentivar o aumento da carga horária para cumprir a meta 6 do Plano Nacional de Educação (PNE), que prevê que 50% das escolas e 25% das matrículas na Educação Básica estejam no ensino de tempo integral até 2024.

Educação Integral x Escola Integral

Professor da rede pública estadual há mais de 15 anos, Rogério* (o nome será preservado nesta reportagem) prevê os problemas que esse aumento de carga horário poderá acarretar. “O ensino noturno vai definhar, então para o aluno que trabalha de dia só vai restar o ensino privado, quando tiver, já que a cada dia fica mais difícil encontrar escolas noturnas para esses alunos”, opina.

Hoje a educação pública estadual comporta dois modelos ligados à ideia de integralidade do ensino. Um é a educação integral aplicada no Ensino Médio, e outro é a Escola Integral que tem tempo integral. Anatalina Lourenço, professora nas redes públicas estadual e municipal e integrante da direção estadual do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), classifica os dois modelos como “anomalias” criada pelos governos do PSDB.

Enquanto as escolas de Ensino Médio de Educação Integral oferecem salários diferenciados para os professores, tempo de aula distinto e processo de seleção dos alunos, a Escola Integral tem turmas superlotadas e, muitas vezes, não oferecem uma proposta concisa para os estudantes que passam o dia todo na escola.

“Há pais e professores que colocam que essa escola integral, a de tempo integral, ela nada mais é que um depósito, isso é muito sério. Por outro lado, a Educação Integral é oferecida em lugares que já tem os melhores índices socioeconômicos”, alerta Anatalina. 

Privatização

No início de abril de 2018, o governo do estado recuou com a proposta que entregava escolas para a iniciativa privada. A modalidade de Parceria Público-Privada (PPP) é chamada de Contrato de Impacto Social (CIS). O estado, assim, contrataria empresas para sanar dificuldades de pelo menos 122 escolas com problemas de evasão e reprovação, por exemplo. Sob a justificativa de ampliar o debate com a comunidade escolar, o CIS foi suspenso, mas deve voltar na próxima gestão.

A terceirização de políticas públicas não é algo inédito. Na educação, funcionários da limpeza e da cozinha já são terceirizados na rede estadual, processo que se iniciou em 2008, quando José Serra era governador do estado de São Paulo.

O membro da Campanha Nacional pelo Direito à Educação alerta para o projeto privatista do governo. “Então, no caso desse Contrato de Impacto Social o que você tem é a radicalização do projeto de desumanização da educação que é não apenas comoditizar a escola, transformar a escola num produto vendável, mas comoditizar os estudantes e a vulnerabilidade social”.

Recentemente, o candidato do PSDB à Presidência, defendeu que a pós-graduação fosse paga no Brasil. Em 11 de agosto último, Alckmin mudou o tom e defendeu mestrado e doutorados gratuitos.

Procuradas pelo Brasil de Fato, tanto a assessoria de imprensa da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo quanto a equipe de comunicação do candidato à Presidência Geraldo Alckmin (PSDB) não responderam aos questionamentos até a conclusão da reportagem.

Edição: Cecília Figueiredo

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

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