Os liberais cúmplices da criminalização da educação, por Luis Felipe Miguel

Os liberais cúmplices da criminalização da educação

por Luis Felipe Miguel

Tentando se equilibrar na posição de “liberal esclarecido”, Joel Pinheiro da Fonseca tem que se colocar contra o famigerado Escola Sem Partido (sic) [leia aqui]. Mas não consegue abrir mão do discurso de que existe “um viés ideológico na educação brasileira”. E continua: “Quem nunca teve um professor de esquerda?”

Essa abertura já denuncia a falácia que funda seu pensamento. Por que ele não pergunta quem teve um professor de direita? Porque o que conta como “viés ideológico” é só a reflexão crítica sobre a realidade. A naturalização do mundo social tal como ele é e a aceitação da ideologia dominante como não-ideológica aparecem, então, como a própria “neutralidade”. Fonseca e o Escola Sem Partido (sic) partem da mesma posição.

O jornalista responde em seguida à própria pergunta: “Eu tive vários [professores de esquerda], e dos que traziam suas convicções políticas para a sala de aula”. Fica claro que, no mundo ideal, se você carrega esse defeito, ter convicção política (de esquerda), cabe disfarçá-lo antes de entrar em sala de aula. Como se convicção política representasse um tipo de desonestidade intelectual. Ele continua sintonizado com o Escola Sem Partido (sic).

Em seguida, a pílula é um dourada um pouco, mas, um pouquinho depois, a má fé se escancara: “Há todo um espectro de práticas que podem entrar na conta [da doutrinação]: desde um caso de abuso claro como o professor obrigar os alunos a fazer manifestação partidária para passar de ano, até práticas mais corriqueiras como usar um livro de autor ‘de esquerda'”.

Eu queria um exemplo deste mítico doutrinador que obriga os alunos a fazer manifestação partidária, a bête noire do Escola Sem Partido (sic). Confesso que nunca vi um. O mais perto disso são escolas que obrigam os estudantes a frequentar cultos religiosos, mas aí a doutrinação certamente não está à esquerda.

E chega a ser bizarro que o ingresso de autores de esquerda no ambiente escolar cause frisson. A maior parte do conhecimento nas ciências humanas foi produzida por autores à esquerda. Ou a quase totalidade, eu diria, se adotarmos a categorização de “esquerda” do Escola Sem Partido (sic) – também de Fonseca? – para quem Weber, Keynes ou Rawls são perigosos comunistas.

Ao fim do texto, o autor manifesta seu desagrado com “um projeto mal formulado, ineficaz, paranoico e obscurantista como o Escola Sem Partido [sic]”. Mas é pouco. Ao manter a ficção do “viés esquerdista” e projetar o ideal do professor “neutro” diante do mundo e suas injustiças, liberais como Fonseca traem seu próprio liberalismo e são cúmplices da criminalização da educação.

Luis Felipe Miguel – Doutor em Ciências Sociais pela Unicamp, Professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília, onde coordena o Grupo de Pesquisa sobre Democracia e Desigualdades. Pesquisador do CNPq. Autor de diversos livros, entre eles Democracia e representação: territórios em disputa (Editora Unesp, 2014), Feminismo e política: uma introdução (com Flávia Biroli; Boitempo, 2014).

Luis Felipe Miguel

2 Comentários

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  1. Sieg Heil Führer Bolsonaro é

    Sieg Heil Führer B é movido por uma ideia obsessiva paranoica: transformar o Estado num instrumento de opressão política, econômica, social, sexual e religiosa. Mas ele só conseguirá fazer isso desestabilizando e destruindo o sistema educacional. Quase todo o resto (o sistema partidário, a economia e o futuro do país) já foi distruído, inclusive o sistema constitucional.

  2. Em 2017 meu filho estudava no

    Em 2017 meu filho estudava no IFES aqui da cidade e tinha uma professora neoliberal. Ela é de família de classe média e metia o pau no PT, nos setor público, nos impostos, etc etc

    A curiosidade é que ela trabalhava em uma faculdade privada aqui na cidade e saiu para trabalhar no IFES, que é público. Vai entender.

    Este ano ele foi esutdar na UFES e encontrou lá outro professor neoliberal até mais agressivo do que a tal professora do IFES.

    Até o ano passado ele se dizia ateu.

    Ele tirou o titulo de eleitor em 2016 e se filiou ao PT. Ainda está filiado.

    Em 2018 virou bolsominion fanático e totalmente aloprado. Votou no bozo vestido de verde e amarelo.

    Acredita em todas as fake news do bozo que recebeu pelo wattshapp e todas as verdades sobre realizações do PT enquanto foi governo são mentiras e o Lula é o maior ladrão do Brasil. Está até falando em cristo, cristianismo, etc etc

    Estas escolas agiram como “escola sem partido”?

    E não adianta eu falar que ele está sendo enganado. Não adianta eu falar para ouvir o outro lado. São todos comunistas que mamavam nas tetas dos governos petistas.

    Para meu desgosto ele prefere dar ouvidos a um velho gagá como o tal olavo de carvalho, que ele não sabe quem é e nunca viu, e a vários “youtubers” a soldo do que a mim que sou pai dele.

    Vou confessar: isto me dá uma enorme frustração.

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