Professoras e professores contra a cultura do estupro, por Maria Izabel Noronha

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Professoras e professores contra a cultura do estupro

por Maria Izabel Azevedo Noronha

O estupro coletivo de 33 homens contra um menor de 16 anos no Rio de Janeiro reacendeu na sociedade um debate que deveria ser permanente, pois a cultura do estupro está presente no cotidiano e provoca, em média, um caso a cada 11 minutos no Brasil, de acordo com levantamento realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Dados oficiais das secretarias estaduais da Segurança Pública indicam a ocorrência de pelo menos 47.646 estupros em 2014. Em 2015 foram 51.090 ocorrências, incluindo crimes cometidos contra menores de 14 anos.

A luta contra a cultura do estupro, a misoginia, o machismo e contra toda forma de opressão é nossa, de professoras e professores. Nossa categoria é composta por uma maioria de 84% de mulheres. Mesmo assim, prepondera entre nós o machismo, que oprime e desqualifica a nós, mulheres.

O crime ocorrido no Rio de Janeiro chamou a atenção e provocou ampla cobertura da mídia por ter sido cometido contra uma menor, por envolver um número assustador de criminosos e pelo fato de terem os próprios criminosos publicado imagens do fato nas redes sociais, movidos pela convicção da impunidade. Isto vem permitindo, inclusive, a identificação de vários suspeitos. O estupro praticado por um homem contra um único ser humano já constitui crime hediondo. Imaginem 33 marmanjos se aproveitando de uma única mulher!!!

Os números mostram com clareza que a situação é gravíssima. Dados do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro indicam que o estado teve média de 13 estupros por dia entre janeiro e abril deste ano. Todos os dias, 13 mulheres são estupradas no Estado do Rio de Janeiro – e, como vimos, a realidade de outros estados não é muito diferente. Uma rotina alarmante que, entretanto, não parece mobilizar a sociedade em busca de soluções.

Depois de sofrer tal violência, o drama das vítimas não cessa. A menor violentada no Rio de Janeiro relata os constrangimentos a que foi submetida na delegacia, onde três policiais, homens, buscavam descaracterizar o crime, tentando retirar-lhe a condição de vítima, como se ela tivesse provocado a situação por livre e espontânea vontade. O delegado Alessandro Thiers, inicialmente responsável pelas investigações, foi afastado pelas declarações que fez aos meios de comunicação sobre este caso. A nova delegada, Cristiana Bento, declarou que o crime está provado e já determinou a prisão de diversos suspeitos.

Podemos ver com clareza o tratamento que o Estado dispensa às mulheres vítimas de estupro. O delegado Alessandro Thiers é titular da Delegacia Especializada em Crimes de Informática, enquanto que a delegada Cristiana Bento pertence à Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (DCAV). A troca só ocorreu devido às desastrosas declarações do delegado e à extensa cobertura da mídia. A realidade cotidiana, porém, é a de mulheres que têm que relatar seus casos a policiais homens (mesmo nas delegacias da mulher), são pressionadas e muitas vezes veem seus depoimentos serem descaracterizados e desqualificados.

Somos professores e professoras, não podemos nos calar. Não podemos nos omitir. A versão da vítima tem que ter crédito e deve, para além da punição do criminoso ou criminosos, ser levada em conta na elaboração de políticas que possam criar condições para a prevenção deste tipo de crime e redução progressiva, porém urgente, do número de casos de estupro e violência contra a mulher.

Nós, professoras e professores, temos muito a contribuir neste sentido. É preciso que essa questão seja objeto de aulas para nossos estudantes. Obviamente, a questão tem que ser abordada de forma adequada a cada faixa etária. O que não podemos é fazer de conta que o problema não existe, empurrar para baixo do tapete, nos omitir perante uma realidade dolorosa que pode vitimar qualquer mulher, a qualquer momento.

É função da família ensinar às crianças e aos adolescentes o respeito à mulher e o respeito mútuo que deve existir entre todas as pessoas, mas também é algo que precisa ser, sim, ensinado nas escolas. Não para substituir o papel da mãe e do pai, mas porque são questões que estão presentes no convívio social e cuja ausência tem provocado tragédias como a da menina do Rio de Janeiro e de milhares e milhares de outras vítimas anônimas. As consequências? Não sabemos, porque não existe um acompanhamento sistemático. Quantas meninas e mulheres puseram fim à própria vida ou sofrem de depressão e outras decorrências da violência que sofreram? A questão é social e assim deve ser tratada.

Infelizmente, o governo interino golpista de Michel Temer caminha na direção oposta. Primeiro, desmantelou a Secretaria Especial de Políticas para Mulheres da Presidência da República, que possuía status de Ministério, reduzindo-a a uma secretaria “pendurada” no Ministério da Justiça. Depois, para deixar clara a pouca importância que dá aos direitos e necessidades das mulheres, que constituem mais da metade da população brasileira, nomeou a senhora Fátima Pelaes, uma mulher conservadora que se opõe à realização de aborto mesmo nos casos de estupro, para chefiar aquela secretaria. Uma tragédia sem fim.

Esta luta é nossa. Basta de estupro, machismo, misogenia e toda forma de opressão contra nós, mulheres. Não vamos nos calar. Todos juntos, contra cultura do estupro! Visitem nossa comunidade no facebook: Professoras e professores na luta contra a cultura do estupro.

Maria Izabel Azevedo Noronha
Presidenta da APEOESP

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

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