Relato da invasão a hospitais estimulada por Bolsonaro

Presidente Jair Bolsonaro incentivou pessoas a invadirem hospitais para filmar e compartilhar vídeos sobre leitos. Enfermeira faz relato

Hospital de Campanha do Anhembi, em São Paulo, tem capacidade para 1,8 mil leitos – Foto Reuters

‘Ele está incentivando a baderna’: o desabafo de enfermeira após Bolsonaro pedir que seguidores invadam hospitais

Na tarde de 4 de junho, a enfermeira Carla*, que trabalha no Hospital de Campanha do Anhembi, em São Paulo, notou uma movimentação estranha enquanto voltava do horário de almoço.

“Havia muitas pessoas na porta. Observei muita gente entrando no hospital sem colocar a roupa própria para proteção”, relata a profissional de saúde à BBC News Brasil.

Pouco depois, ela descobriu que se tratava de uma “invasão” de deputados estaduais de São Paulo ao hospital. Mesmo sem autorização, eles tentavam entrar no local para, segundo os parlamentares, “fiscalizar” e “apurar possível má utilização de recursos públicos”.

“Eles agiram como se os profissionais de saúde fossem criminosos. Nos sentimos desrespeitados. Foi uma situação vexatória. Não poderiam fazer aquilo. É importante fiscalizar o uso de dinheiro público, mas aquela não era a forma correta para fazer isso”, declara Carla.

A profissional de 45 anos, sendo 22 deles atuando na enfermagem, classifica o momento como a situação mais vergonhosa e desrespeitosa que viveu na linha de frente do combate ao novo coronavírus.

Ela confessa que teme passar por situação semelhante nos próximos dias, após ler uma declaração que o presidente Jair Bolsonaro deu na noite da quinta-feira (11). Durante uma live, ele incentivou seus seguidores a invadirem hospitais e filmarem o que encontrarem no interior.

“Tem hospital de campanha perto de você, hospital público, arranja uma maneira de entrar e filmar. Muita gente está fazendo isso e mais gente tem que fazer para mostrar se os leitos estão ocupados ou não. Se os gastos são compatíveis ou não”, disse Bolsonaro, sem acrescentar qualquer prova de que os recursos tenham sido mal utilizados.

Também sem apresentar qualquer prova, o presidente insinuou que os números da covid-19 estão sendo manipulados por prefeitos e governadores para “ganho político”.

Em nota, a Associação Paulista de Medicina criticou o incentivo de Bolsonaro para que as pessoas invadam e filmem unidades de saúde. “Hospitais são áreas de circulação restrita, com fluxo de pessoas orientadas para garantir rapidez, eficiência, segurança e privacidade dos pacientes assistidos. Todas as informações necessárias ao acompanhamento dos casos internados é sempre imediatamente disponível às autoridades de saúde”, diz a entidade.

A invasão em SP

Jair BolsonaroREUTERS/ADRIANO MACHADO

Carla considera que a declaração de Bolsonaro pode dificultar ainda mais a batalha contra o novo coronavírus no Brasil, que tem mais de 41 mil mortes. “Ele está incentivando a baderna, o desrespeito ao próximo e ao profissional de saúde”, diz.

Ela afirma que as apurações sobre supostas fraudes nas gestões de hospitais devem ser feitas por autoridades responsáveis, como a Polícia Federal. “As pessoas não podem invadir um hospital, sem qualquer permissão para filmar o local e os pacientes”, declara a enfermeira, que ressalta que não é permitida a entrada de pessoas sem autorização em hospitais.

“Um dos grandes problemas é que muitas pessoas podem, como no caso dos deputados, filmar e mostrar apenas o que lhes interessa. Eles filmaram os rostos dos pacientes e causaram muito constrangimento. Depois, foram para áreas desabilitadas e compartilharam como se o hospital estivesse vazio”, diz.

A invasão ao hospital foi feita pelos deputados Marcio Nakashima (PDT), Adriana Borgo (Pros), Coronel Telhada (PP), Leticia Aguiar (PSL) e Sargento Neri (Avante) — os quatro últimos são apoiadores do presidente. Pessoas ligadas a eles também participaram da ação.

“Estávamos trabalhando normalmente e, de repente, chegaram essas pessoas como se estivesse acontecendo uma guerra mundial. Eles invadiram, falaram alto e desrespeitaram a todos. Foi uma situação muito ruim. Eles pensam que podem fazer isso por conta dos cargos que possuem. É assustador isso”, afirma.

Os parlamentares afirmavam que o hospital estaria “vazio” e disseram que precisavam fiscalizar supostas irregularidades. A unidade de saúde é administrada pela Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM) e pelo Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (IABAS).

O IABAS é investigado por supostas irregularidades em contratos para administrar hospitais em São Paulo e no Rio de Janeiro, onde também era responsável por hospitais de campanha. A Organização Social (OS) é um dos alvos de uma apuração sobre desvio de dinheiro da saúde, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os representantes do instituto negam qualquer irregularidade.

Continue a leitura na BBC News.

 

Redação

5 Comentários

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  1. É o apelo ao vale-tudo. São negadas a doença, as mortes, os números. O presidente tem dificuldade de lidar com a realidade, por isso tem que submetê-la.

  2. Lembrando que o irresponsável já começou a pandemia de modo péssimo. Fez parte da comitiva que ajudou a implantar uma cepa de vírus no DF, com sua comitiva dos infectados. Inclusive o irresponsável, na live desta quinta também falou que pode até ser que tenha sido contaminado na viagem (o que põe sob suspeição seus supostos exames com nome falso). Lembrando também que uma das distrações do irresponsável durante a viagem. para mudar de assunto (de que um dos objetivos da viagem era que o filho fizesse contatos com fabricantes de armas), foi dizer que a eleição de 2018 havia sido fraudada.

  3. Incitação a desordem pelo presidente da Republica?…
    Mais um da já polpuda lista de crimes comuns e/ou de responsabilidade.
    Maia, uma pessoa de bom senso, mas um politico conservador, diz que não é o momento.
    será porque está esperando o prazo menor que 2 anos para convocar novas eleições e lograr Mourão (um Bolsonaro sem besteirol) na presidência?
    Ou só julgará os pedidos em setembro de 2022?

    PS: Deixar a avaliação de pedidos de impeachment exclusivamente nas mãos do presidente da Câmara é um disparate, seja para o bem ou para o mal. Né Eduardo Cunha?

  4. a China monta operação de guerra e fecha alguns bairros de Pequim ao constatar 11 casos de covid 19 : por aqui Dona Maria a Louca manda invadir hospitais, stf….

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