Será preciso Galeanizar o mundo de Trump, por Fábio de Oliveira Ribeiro

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Ok. Michael Moore pode ter previsto a vitória de Donald Trump. Mas foi Eduardo Galeano que falou de um mundo de pernas pro ar já em 1999.

A julgar pelas palavras de Galeano, o crescimento do fascismo não pode ser considerado um fenômeno novo. A única novidade, creio, é que o fascismo começou a ser notado tardiamente.

O fim do ciclo globalizante no país que se considerava dono da gobalização é apenas uma consequencia necessária de uma realidade que havia sido congelada. Enquanto os sofredores eram latinos e africanos, os norte-americanos e seus sabujos riam. Agora que eles também começaram a choramingar e protestar nas urnas, a imprensa ficou espantada.

É fato, os espantalhos do neoliberalismo não conseguiam ou não queriam ver o que ele estava provocando. Galeano viu e foi ignorado. Creio que agora ele se tornará leitura obrigatória dos que o consideravam um inimigo da civilização (ou melhor, da barbárie que eles chamavam de civilização).

A barbárie, porém, seguirá seu curso. Medo, fascismo, repressão, guerra civil e guerra externa são parceiras inseparáveis. Pequena perda, direi, quando os norte-americanos começarem a fazer em casa o que eles vinham fazendo nos outros países. 

 

Fábio de Oliveira Ribeiro

6 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Engrenagem podre

    A globalização e a sua filha dileta, a financeirização do mundo, com seus paradigmas de eficiência e rentismo acima de tudo, com as leis impondo a todos nós, seres humanos, o dever de alta produtividade e consumismo insano, levou-nos a solidão, não a solidão introspectiva às vezes necessária, mas a solidão do abandono de nós mesmos, do abandono do outro, abandono da solidariedade, do sentimento de pertencimento no mundo. Hoje nós estamos contra o mundo, não fazemos mais parte dele e o mundo real não faz parte de nós. O mundo em que estamos é do lucro acima de tudo, é um por si e todos por nenhum. A máquina da ganância financeira nos trasformou em peças supérfluas, supérfluas nos relacionamentos, nos sentimentos, no dia a dia. Ela tirou tudo de nós, nossa humanidade, nossa fraternidade, nossa solidariedade, nos suga por completo e candidamente aceitamos isso acreditando que essa é a forma de viver. Uma forma de viver que nos faz ver no outro apenas como um objeto também de consumo e o outro tem que estar de acordo com as regras e normas que temos enraizadas da máquina que nos controla, a arrogância, o desprezo ao que é diferente desse pequeno eu viciado e podre que habita dentro de nos. Mundo, mundo, que se exploda por que não me chamo Raimundo. É assimque agimos esquecendo-se de que na verdade somos o mundo.

  2. Medo ou terror?

    Terror impulsiona a economia, induz o surgimento de fissuras morais e doenças mentais. Terror é bom não para a saúde e para o bem estar mas para os negócios.

    Como disse o Tom Zé, “o medo [sem terror, acrescento eu] é um bom conselheiro quando bem observado”.

    1. O medo de Temer, Cunha, Renan
      O medo de Temer, Cunha, Renan e seus 420 deputados e senadores bandidos de serem presos pelos crimes que cometeram resultou no golpe que afunda a economia real brasileira. O medo fez deles fez bem apenas para os banqueiros. Você é banqueiro ou sabujo de banqueiros?

      1. Em princípio considero que você não entendeu Renato Lazzari

         

        Fábio de Oliveira Ribeiro (sexta-feira, 11/11/2016 às 11:38),

        Não faço aqui a defesa do belo comentário de Renato Lazzari porque ele não precisa. Faço mais a crítica a sua interpretação do que ele disse.

        Sua ideologia é muitas vezes refratária a questionamentos de ideias. O que não é bom siso pois dificilmente uma ideia é perfeita. Afinal quando uma idéia é perfeita ela deixa de ser uma mera ideia para se tornar uma teoria. Saber perceber as falhas nas nossas ideias é necessário para as aperfeiçoá-las. Eu não tenho dúvida de que o medo é a mola mestra do fascismo. Agora, é preciso compreender mais o medo e mais o fascismo para ver como os dois se interagem. E em que os dois se diferem.

        O fascismo tem, em meu entendimento, muito de irracionalidade e o medo é um bom conselheiro da lógica, ou seja, o medo também é adversário do fascismo. E esse é o entendimento da frase de Tom Zé transcrita por Renato Lazzari. A coragem por sua vez tão decantada na história dos nossos heróis é mais das vezes a manifestação da irracionalidade. E o fascismo é cheio de irracionalidade.

        Posso, entretanto, retorcer essa argumentação. Assim dou como exemplo de uma manifestação de coragem, que é por sinal a única que eu levo em consideração, a frase do Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon: “morrer se preciso for, matar nunca”. A ela, eu gosto de contrapor a frase do general George S. Patton: “o importante não é morrer pela pátria, mas fazer o idiota do outro lado morrer pela pátria dele”. Parece-me uma frase de quem sabe mais bem avaliar a realidade, sendo, portanto, uma frase mais inteligente, mais racional, pois defende o bem mais valioso que é a vida.

        A frase do general George S. Patton de um lado é a conclusão lógica da realidade da guerra ou uma advertência sobre a dura realidade da guerra onde quem vai destemidamente, com coragem enfrentar o adversário, acaba se expondo mais e sucumbindo, enquanto quem medrosamente se esconde e foge do combate pode pegar o inimigo no instante de arroubo. Forçando no uso dos termos coragem e medo eu posso escrever a frase de George S. Patton, que como eu disse parece-me mais inteligente, da seguinte forma: “o importante é que o medo nos impeça de morrer pela nossa pátria ao mesmo tempo que a coragem do outro lado leve o inimigo a morrer pela pátria dele”.

        A frase do Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon é de um anti-fascismo expresso enquanto a frase do general George S. Patton é o mais puro fascismo. Visto assim alguém pode concluir que o fascismo é sabedoria e o anti-fascismo é ingenuidade.

        Uma observação, pelo Quote Investigator, um site que confere a autoria de frases famosas, a frase do general George S. Patton, pelas palavras do Lt General James M Gavin no livro de 1958 “War and Peace in the Space Age”, é a seguinte:

        “No dumb bastard ever won a war by going out and dying for his country. He won it by making some other dumb bastard die for his country.” (Traduzindo com a ajuda do Google: “Nenhum estúpido bastardo jamais ganhou uma guerra saindo e morrendo por seu país. Ganhou-o fazendo um outro estúpido bastardo morrer para seu país.”).

        As várias versões dessa frase podem ser vistas no seguinte endereço no site do Quote Investigator:

        http://quoteinvestigator.com/2015/04/24/war/

        Então, creio que o alerta de Renato Lazzari, utilizando para o alerta a frase de Tom Zé, foi, em meu entendimento, bem apropriado. E a sua reação foi de quem não teve o devido cuidado tanto na leitura da afirmação do outro como naquilo que você se propõe a dizer.

        Refiro-me ao que você propõe a dizer porque não tenho dúvida que os “Temer, Cunha, Renan e seus 420 deputados e senadores” agiram acossados pelo medo e até ai concordo com você. Só que ao agirem acossados pelo medo em vez de ficar paralisados, eles se mostraram inteligentes, ainda mais que como vitoriosos não morreram pelos interesses dele. Foram e são golpistas sob o aspecto político. Agora afirmar que são “bandidos de serem presos” é uma afirmação um tanto irracional – e ai se pode dizer que é fascista – pois não há contra eles uma sentença transitada em julgado.

        Clever Mendes de Oliveira

        BH, 11/11/2016

  3. Galeano gênio

    Notável lembrar do Galeano nosso Voltaire sulamericano. Atentem para a história. Estamos vivendo clima parecido ao de fim de mundo que a França vivia em 1789 quando uma classe jovem e despossuída derrubou outra velha e possuidora de tudo e da vida de todos. O Ancien Regime, cruel e espoliador, até então intocável, de repente caiu como folha seca das árvores. Esses fatos influenciaram mudanças em boa parte do mundio, inclusive, no então jovem Estados Unidos.

  4. Muito bom trazer esse texto do Eduardo Galeano

     

    Fábio de Oliveira Ribeiro,

    Excelente este seu post. Não teria nada a acrescentar além do elogio. E espero que você não tenha pelo elogio aquela sensação que o elogio dá de que quem elogia parece dizer: eu elogio porque sei mais que você, ou seja, o elogio é uma espécie de argumento da autoridade. De todo modo vou completar esse meu comentário deixando aqui uns três links que eu penso serem muitos pertinentes a esse assunto. Não vi o texto de Michael Moore em português, embora certamente já deve haver o texto traduzido e o link para ele, mas deixo aqui o link para o texto em inglês feito há quatro meses e com o seguinte título “5 Reason Trump Why Trump Will Win”:

    http://michaelmoore.com/trumpwillwin/

    A previsão de Michael Moore é mais relacionada com estratégia eleitoral. Não diz tanto quanto o texto de Eduardo Galeano.

    Outro link é para o post “Umberto Eco: 14 lições para identificar o neofascismo e o fascismo eterno” de sábado, 29/10/2016 às 14:45. Publicado aqui no blog de Luis Nassif e consistindo da conferência proferida por Umberto Eco na Universidade Columbia, em abril de 1995, portanto, há mais de vinte anos. O endereço do post “Umberto Eco: 14 lições para identificar o neofascismo e o fascismo eterno” é:

    https://jornalggn.com.br/noticia/umberto-eco-14-licoes-para-identificar-o-neofascismo-e-o-fascismo-eterno

    O texto de Umberto Eco, cujo título seria “Ur Fascismo” ou “Fascismo Eterno” já havia sido reproduzido em outro post aqui no blog de Luis Nassif e eu aproveitei um comentário que havia enviado ao post anterior e o reproduzir junto ao post “Umberto Eco: 14 lições para identificar o neofascismo e o fascismo eterno”.

    Em meu comentário original transcrito já havia alguns links interessantes e eu acrescentei mais dois que dão acesso a artigos acadêmicos mostrando, mediante levantamentos de dados eleitorais, o crescimento da direita em tempo de crise econômica. Como tenho ficado espantado com o fato de os analistas da realidade brasileira não fazerem menção aos artigos, eu os venho indicado com certa frequência em meus comentários mais recentes, disponibilizando os links para os artigos. Aliás, não vejo menção a esses dois artigos mesmo no estrangeiro tanto comentando a vitória de Brexit como agora no caso da vitória de Donald Trump.

    O meu comentário para o post “Umberto Eco: 14 lições para identificar o neofascismo e o fascismo eterno” e que eu enviei domingo, 30/10/2016 às 18:32, é extenso à maneira do texto de Umberto Eco, embora reconheço que não tem a qualidade do texto dele, mas vale também ser lido tanto pelo comentário em si como principalmente pelos links que eu deixo, em especial para os dois artigos abordando o crescimento da direita no mundo em períodos de crise econômica. Para uma consulta posterior eu penso que vale bem deixar aqui o link para os dois artigos.

    Os dois artigos são “Economic growth and the rise of political extremism: theory and evidence” e “The political aftermath of financial crises: Going to extremes”. O primeiro artigo, “Economic growth and the rise of political extremism: theory and evidence”, escrito por Markus Brückner e Hans Peter Grüner, é um artigo de 2010 e cujo link transcrevo a seguir:

    https://www.uni-kassel.de/fb07/fileadmin/datas/fb07/5-Institute/IVWL/Forschungskolloquium/WS10/growth-extremism.pdf

    E o segundo artigo “The political aftermath of financial crises: Going to extremes”, de autoria de Manuel Funke, Moritz Schularick e Christoph Trebesch, e publicado em 21/11/2015, no site do VOX – CEPR’s Policy Portal, pode ser visto no seguinte endereço:

    http://voxeu.org/article/political-aftermath-financial-crises-going-extremes

    No meu comentário lá no post “Umberto Eco: 14 lições para identificar o neofascismo e o fascismo eterno” eu também deixo os links que levam a artigos onde vim a tomar conhecimento desses dois artigos.

    E o terceiro link a que eu queria fazer menção é para um artigo de Edward Luttwak que eu só vim a conhecer na quarta-feira, 09/11/2016, sapeando no blog de Brad de Long. Trata-se do artigo “Why Fascism is the Wave of the Future” que pode ser visto no seguinte endereço:

    http://www.lrb.co.uk/v16/n07/edward-luttwak/why-fascism-is-the-wave-of-the-future

    O Edward Luttwak, um judeu romeno, é uma espécie de polímata e que por ter muito interesse na área militar, parece-me que não seja bem visto pela esquerda, mas o texto dele que é ainda anterior ao de Eduardo Galeano e o de Umberto Eco, pois é de abril de 1994, é bem consistente e expressa de modo analítico o que Eduardo Galeano expressou sinteticamente.

    Agora, avalio que se deva fazer uma análise diferenciada dos eleitores de Donald Trump e do próprio Donald Trump. Donald Trump é um ególatra, mas não me parece que ele seja fascista, ainda que ele tenha algumas das características do fascismo, mas são características mais culturais, como o machismo. Ele pode ser também racista, mas parece-me de um racismo peculiar dele. Para ele todas as outras raças que não sejam a pura raça do Donald Trump são raças inferiores. Ele também não é xenófobo. Em suma ele não é fascista. Ele apenas foi eleito pelos fascistas.

    E aqui faço um adendo divisionista. A vitória dele deve servir também para a esquerda avaliar a vitória de Fernando Collor de Mello. Não foi a Globo que elegeu o Fernando Collor de Mello. É saber conquistar o eleitor que se precisa para ser eleito. Foi isso que Fernando Collor de Mello fez ao tempo dele e foi isso que Donald Trump fez agora. Talvez por não ser americano nem falar inglês eu não vejo Donald Trump com o carisma que tinha Fernando Collor de Mello. Antes de passar por mentiroso Fernando Collor de Mello tinha carisma e conseguia convencer as pessoas. Donal Trump soube usar os meios de comunicação de forma mais histriônica e na exata medida necessária para convencer e conquistar os eleitores.

    Clever Mendes de Oliveira

    BH, 11/16/2016

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador