Foto Obvious Lounge
Desejo e sobrevivência, por Maíra Vasconcelos
Escrever é como desembolar aquilo que se encontra em estado mudo, quieto junto ao escritor, e que deve ser comunicado. Existirá o completo estado de se ter tudo claro passado a escrito? Mas ainda não totalmente. Quero dizer, escrevo um pouco intrincado, como se isso fosse uma mania de nunca se entregar inteiramente, e sempre fingir um pouco. Por gostar do teatro também. Ou como se, ao juntar cacos de tantos espelhos, não fosse possível escrever com menos labirintos. Trabalhando a palavra pelas bordas e anteparos.
Não sei quando passarei a ser absolutamente aberta nessa relação com a palavra escrita. Suponhamos, em onze anos, irei me render à palavra afável que todos querem ler. Sairei do claro-escuro claro-escuro. Ou, talvez, isso nunca aconteça e eu pertença ao reino dos escritores de punho recluso – que redundância. Escritores que ficam no preâmbulo de uma meditação deliciosa e engenhosa. Sem prestar contas ou livros publicados. Ah. Mas sem tais publicações no jornal não consigo me ver.
Mas o que tento agora, com este escrito, é distinguir quando há desejo de comunicação pela escrita e quando essa via é uma questão de absoluta sobrevivência. Ainda que sem desejo não há vida. E o mais certo é que ocorra as duas coisas – mesmo que sobreviver não seja um desejo, quando falamos de escritores e sua típica e clichê autodestruição. Mas, obviamente, desejo me comunicar pela escrita e isso é também uma luta pela sobrevivência.
Sem esperanças que exista substituição para a escritura em meu viver. A comunicação escrita se parece a algo como ter água na torneira e pão no armário da cozinha. Então, ou cumpro a tarefa ou morro um pouco a cada dia, se calo o meu interior pulsante. Pode ser sempre tão fácil pensar-me uma morte vagarosa. Bastaria abandonar o ato de escrever, isso que me sufocaria a tal ponto e seria uma morte bastante imperceptível ao mundo externo.
Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.
Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.